O
coro crescente do repúdio à desigualdade de renda pode soar como uma aula de
matemática estarrecedora, cheia de zeros e pontos decimais, porcentagens e
razões. Milhões e bilhões.
O 1% mais rico da população, que comanda 20% da renda de um
país. O 0,1% mais rico, cuja parcela da riqueza nacional é ainda mais
desproporcional.
Para pensar sobre a questão em termos simples e nítidos,
considere o "Homem de Ferro". Em 2012 o ator Robert Downey Jr.
recebeu US$ 50 milhões (R$ 110,5 milhões) para representar o super-herói em
"Os Vingadores".
Recentemente no "New York Times", o professor de
economia da universidade Harvard N. Gregory Mankiw escreveu: "O americano
comum teria que trabalhar mais ou menos mil anos para receber o mesmo
valor".
Como se as manhãs de segunda já não fossem suficientemente
desanimadoras. Mas, para quem está do lado certo da equação, as cifras não
param de melhorar.
O relatório mais recente da firma de gestão de bens Knight Frank
mostra que o número de pessoas com ativos de pelo menos US$ 30 milhões aumentou
em 5.000 em 2013, chegando a 167 mil no mundo. O número de bilionários subiu
80%, para 1.682.
A fartura não se limita aos suspeitos de sempre. "Estados
Unidos, Japão e Alemanha têm mais milionários, mas a riqueza cresce rapidamente
no Oriente Médio, América Latina, Austrália e África", informou o
"NYT".
"A previsão é que até 2023 a China tenha 322 bilionários,
mais que o Reino Unido, Rússia, França e Suíça somados."
E, à medida que a riqueza aumenta, os que a possuem demonstram
uma sede de gastar digna de Tony Stark, bilionário oculto dentro do Homem de
Ferro.
O "NYT" citou algumas das aquisições que mais chamaram
a atenção em 2013, como uma Ferrari Spider ano 1967 que custou US$ 27,5
milhões.
A Rolls-Royce teve um ano recorde que atribuiu em grande medida
aos mercados em desenvolvimento, e a Porsche prevê começar as vendas no Quênia.
Mankiw sugere que o repúdio a esse tipo de poder de ganho e de
compra é seletivo, determinado na maior parte pela visibilidade.
Em um lado do espectro estão os titãs corporativos -os
executivos-chefes e grandes financistas. Apesar de toda a conversa sobre
reestruturação de rendimentos após a crise, os ganhos deles continuam a
crescer.
Uma pesquisa realizada para o "NYT" mostrou que a
remuneração média dos executivos-chefes em 2013 foi de US$ 13,9 milhões, um
aumento de 9% em um ano. O líder foi Lawrence J. Ellison, da Oracle, que
recebeu US$ 78,4 milhões no ano passado.
"Críticos às vezes sugerem que essa remuneração alta
reflete o fracasso dos conselhos de direção das empresas em fazer seu
trabalho", escreveu Mankiw.
Mas ele propôs uma explicação diferente: que o valor de um bom
CEO, que comanda milhares de funcionários e bilhões de dólares dos acionistas,
"é altíssimo".
As pessoas de baixa renda tendem a compreender melhor os valores
altos recebidos por Robert Downey Jr., por exemplo. Ele argumentou que, do US$
1,5 bilhão que "Os Vingadores" arrecadou, apenas 3% foram usados para
pagar o ator.
"Se você pagasse US$ 8 pelo ingresso do cinema, US$ 0,25
seriam para pagar pela atuação de Downey. Quem assistiu ao filme talvez diga:
'A atuação dele foi fantástica. Não me incomodo de lhe pagar US$ 0,25 por
isso.'"
Afinal, o que é US$0,25 (R$ 0,55) no contexto de mil anos?
Alan Mattingly – jornalista editor do New York Times