Educação em tempo integral: estratégia para
enfrentar a crise de aprendizagem
Expansão do modelo
contribuirá para o desenvolvimento cognitivo e socioemocional das crianças.
Entre os diversos impactos causados pela pandemia de
Covid-19, um dos que mais afetaram o Brasil e a região da América Latina e
Caribe foi o que atingiu a educação.
Os resultados do PIRLS 2021 (Estudo Internacional de
Progresso em Leitura) indicam retrocessos nas habilidades fundamentais de
leitura entre estudantes do 4º ano.
A maioria dos países que participaram apresentou um
aumento no número de crianças com proficiência em leitura abaixo do mínimo
comparado a 2016.
Na América Latina e no Caribe, a situação é particularmente
alarmante, já que as escolas ficaram fechadas por cerca de cinco meses em
média, um dos períodos mais longos comparado a outras regiões do mundo.
Dados do Pisa 2022 (Programa
Internacional de Avaliação de Estudantes) mostram que essa interrupção
prolongada teve um impacto desproporcional nos estudantes de 15 anos, que viram
seu aprendizado em matemática retroceder o equivalente a sete meses. O ensino à
distância não conseguiu atenuar essa perda educacional.
Uma estratégia para enfrentar essa verdadeira crise
de aprendizagem é a expansão da carga horária em sala de aula, seja por meio de
jornadas ampliadas, seja por escolas em tempo integral.
Estudos mostram que
além de aumentar o período escolar essas estratégias promovem uma revisão do
currículo, oferecem desenvolvimento profissional para professores e gestores e
introduzem outras transformações significativas nas rotinas das escolas.
Exemplos internacionais mostram esses benefícios.
Programas desenvolvidos no México, no Uruguai e no Peru, por exemplo,
resultaram em ganhos significativos de aprendizagem, com melhora nas notas de
matemática e leitura, redução da distorção idade-série, oferta de mais recursos físicos
(salas de aula, livros e materiais pedagógicos), suporte pedagógico e maior
especialização dos professores, entre outros impactos.
No Brasil, experiências nos estados de São Paulo e
Pernambuco também trouxeram resultados positivos no desempenho acadêmico dos
alunos.
Para além dos significativos resultados sobre a
aprendizagem, há evidências de que a escola em tempo integral contribui também
para o desenvolvimento socioemocional dos alunos e para a redução da gravidez e
criminalidade na adolescência.
E os benefícios ultrapassam os muros das
escolas, com um impacto positivo na inserção de mães e avós no mercado de
trabalho.
No entanto, se já existe um consenso de que a
escola em tempo integral é benéfica para o desempenho de alunos e professores,
a pluralidade no desenho dos programas atuais não permite estabelecer um modelo
único de sucesso.
Há diferenças no número de horas acadêmicas adicionais,
oferta de disciplinas eletivas e de atividades extracurriculares ou de reforço,
por exemplo.
E isso não é um problema. Afinal, é preciso adaptar os programas
ao contexto e às necessidades de cada lugar.
É essa pluralidade que vai enriquecer os debates
do Seminário Internacional sobre
Educação em Tempo Integral, que acontece em Brasília nos dias 9, 10 e 11 de
abril.
Promovido pelo Banco Mundial em conjunto com o Ministério da Educação e
o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o seminário contará com
participação de autoridades de Argentina, Colômbia, Equador, México, Peru,
Uruguai e Vietnã e estará aberto para participação de agentes públicos da área
de educação de todo o país, por meio de transmissão online.
A expansão da educação em tempo integral
contribuirá para o desenvolvimento cognitivo e socioemocional das crianças e
jovens mais vulneráveis, que, comprovadamente, se beneficiam mais e tornam o
investimento mais eficiente.
Entretanto, é necessário garantir a qualidade da
implementação dos programas, como a revisão do currículo escolar e o
planejamento das políticas de formação e alocação de professores.
Também é preciso considerar o alto retorno desse
investimento, que gera benefícios sociais para fora da sala de aula, atingindo
as famílias e o mercado de trabalho.
Os efeitos multifacetados mostram que a educação em
tempo integral cuidadosamente planejada e executada pode ser uma ferramenta
poderosa não somente para a recuperação da aprendizagem mas para uma verdadeira
transformação social.
SHIRIEEN MAHDI - economista principal do Banco
Mundial para o Brasil e doutora em economia pela Universidade de Manchester
(Reino Unido).