Por que 'open bar' não deveria ser sinônimo de
diversão
- Nestes eventos, a ideia de celebração que depende do descontrole é
promovida
- Festas deveriam ser sobre encontros, música, afeto e leveza
Estava
voltando da ginástica a pé, sentindo aquela energia boa do pós-treino. De
repente leio numa placa: "Beba à vontade por x reais".
Foi o que
bastou para me despertar a lembrança das inúmeras festas
open bar que fui na adolescência e começo da vida adulta. Era normal, as festas
tinham de ter esse formato.
Todo mundo ficava livre para beber o quanto
quisesse, para valer o ingresso e a festa ser ainda mais "divertida".
Eu
vivia em busca de comemorações desse tipo. Teve uma época que o bar que eu gostava estava com uma
promoção de terça em dobro.
Qualquer bebida alcoólica consumida dava direito a
outra igual.
Lembro
que no começo, Ju e eu saíamos do trabalho e íamos de carro para o bar. Achamos
que podia ser perigoso e programamos ir de ônibus. Aí foi ladeira abaixo.
A
gente se acabava. No dia seguinte, era um tormento levantar para ir trabalhar.
O corpo todo dolorido, dor de cabeça intensa e enjôo, mas lá íamos nós fingir
que estava tudo bem.
Tenho um pingo de saudade desse tempo em que esperávamos o
fim do expediente para beber. Isso durou um tempo… até que a frequência foi
piorando drasticamente.
Me lembro como se fosse hoje de uma Copa do Mundo. Mais precisamente, do jogo
Japão x Brasil, quando eu, um colega de trabalho e minha melhor amiga na época
fomos a uma pizzaria.
A proposta do local era que eles serviriam chope e pizza
durante o jogo. Antes e depois, não. Resultado: nos acabamos naqueles 90
minutos.
Tinha coisa mais gostosa do que estar com os amigos, ficar
bebaça e ainda ter umas pizzas para beliscar?
Depois do jogo, e foi então que a
casa deve ter se arrependido, estávamos cantando em cima das cadeiras e pedindo
mais bebida.
Nem lembrávamos mais daregra. Sei que teve uma breve confusão e
fomos expulsos do local. Algo bem corriqueiro nos meus anos etílicos.
Para falar a verdade, depois de um tempo, eu fazia meu
próprio open bar. Começava a beber e já me tornava a pessoa mais rica da
cidade. Pedia drinks sem parar, sem nenhum constrangimento.
Mas acontece que depois de umas horas estava completamente
inconveniente e era expulsa. Minha vida ficou um tempo nesse looping: beber
muito e ser expulsa.
Daí que em inúmeras ocasiões eu ficava na sarjeta, sem
saber direito o que estava fazendo ali. Amigos iam me acudir, tentar me levar
para casa, nem sempre conseguiam. Uma vez combinei com uma amiga de ir a um
restaurante português muito caro.
Cheguei e a avisei que estaria lá. Disse que ia comer
alguma coisa enquanto a esperava. Quando ela apareceu, eu estava sentada na
frente do restaurante e os garçons a aconselharam a me ajudar a não beber.
O
marido dela ficou possesso de me ver naquela situação e brigou muito comigo.
Estava anestesiada, não peguei nenhuma bronca para mim.
Tudo isso fui repassando na cabeça depois de ler a placa no
bar.
E daí refleti que festas deveriam ser sobre encontros,
música, afeto e leveza. Mas, enquanto o open bar continuar sinônimo de diversão
garantida, a ideia de celebração que depende do descontrole continuará sendo
promovida.
E, se as pessoas precisam perder o controle para sentir que
participam, talvez não seja a festa que esteja errada, mas o modelo de alegria
que foi imposto a todos.
ALICE S. – blog Vida de Alcoólatra