Adolescentes
assistem a filme em atividade recreativa do Projeto Quixote
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Crescer dói em
qualquer idade. Dói para a criança em sua passagem para a segunda e derradeira
parte da infância, e dói quando esta termina. Dói quando ela está prestes a
entrar na adolescência, e crescer dói durante a adolescência toda, do começo ao
fim. Dói entrar na maturidade, dói aprender a ser um pouco mais adulto a cada
dia para não responsabilizar o passado pelas agruras do presente; dói entrar na
meia idade e dói envelhecer.
Hoje, vamos
pensar a respeito das dores que, em geral, ocorrem na adolescência e como elas
podem se expressar. Para isso, vou contar duas histórias baseadas em histórias
reais, mas que modifiquei para preservar a identidade dos que viveram essas
dores tão intensamente.
Marina era, na
época, uma garota tímida com seus 13 anos: achava que seu corpo deixava muito a
desejar e, por isso, o escondia de todas as maneiras.
Na escola, com
as colegas, ria e fazia comentários espirituosos sobre si mesma fazendo todas
acharem graça de seu jeito. Dava-se bem com os professores e com as provas,
apesar de pouco estudar. Só não se dava bem com os meninos, pois achava que
eles não queriam sua companhia. O sentimento era de ser invisível para eles.
Em casa,
preferia ficar sozinha em seu quarto a maior parte do tempo. Só via os pais nos
horários das refeições e pouco conversava com eles. Sentia-se rejeitada,
principalmente pelo pai. Não que fosse na realidade, mas esse era seu
sentimento. Um dia, uma amiga contou que frequentava um ambiente na internet
que mostrava fotos de garotas com cortes nos braços e pernas feitos com lâmina
de barbear. Ela fez para experimentar. Sentiu um alívio danado e, daí em diante,
passou a fazer regularmente, sempre que se sentia estranha. Funcionava.
João Pedro, aos
14 anos, gostava de bancar o valentão: vira e mexe entrava em luta corporal com
colegas ou desconhecidos e sempre se machucava. Já fora ao hospital para levar
pontos por cortes sofridos nos lábios em uma dessas brigas. Dizia que essa era
sua maneira de ficar "de boa", de não "surtar". Achava que
a vida era uma droga, não via sentido em ir para a escola, festas etc. Para
alguns adolescentes, a dor do crescimento e o sofrimento emocional e psíquico
que ocorrem nessa fase são quase insuportáveis. Deslocar essa dor impalpável
para a dor física alivia suas angústias. O problema é que a solução é
temporária –ambos sabiam disso. Por isso precisavam repetir, repetir, repetir.
Muitas famílias
não dão a devida atenção a essas situações. O pai de outra garota, que também
praticava automutilação, dizia que era modismo porque a garota era bonita,
popular, tinha de tudo.
É bom saber que,
na adolescência, os jovens perdem quase tudo o que lhes dava segurança: o
conhecimento de si e do mundo, os pais, a intimidade com o corpo e a maneira de
relacionar-se com os pares.
Famílias e
escolas poderiam estabelecer diálogos vivos e instigantes a respeito da vida
com os jovens. Em vez de falar de escola, profissões, vestibular etc., tratar
de arte, filosofia, cinema e literatura é muito mais profícuo para ajudá-los a
ver e entender melhor o mundo e desenvolver o autoconhecimento.
Alguns
adolescentes precisam de ajuda –às vezes profissional– para simbolizar a dor
que sentem e que não sabem expressar.
Rosely Sayão - Psicóloga e consultora em educação, fala sobre
as principais dificuldades vividas pela família e pela escola no ato de educar
e dialoga sobre o dia a dia dessa relação.
Fonte: coluna jornal FSP