Em 2015 a jornalista finlandesa
Jessikka Aro publicou uma série de matérias expondo o que ela chamou de
"fazendas de trolls" agindo na Finlândia. "Troll" é o nome
dado para perfis criados em redes sociais com um propósito específico: assediar
outros usuários e espalhar discursos de ódio.
De acordo com Aro, um grande número
de "trolls" que atuava em seu país era vinculado ao governo russo.
Esses perfis "patrulhavam" as redes sociais, assediando usuários e
agredindo sistematicamente qualquer manifestação divergente.
Infelizmente esse tipo de atuação não
ocorre só nos países nórdicos. Basta um passeio rápido pelas redes sociais no
Brasil para se deparar com o mesmo padrão, em ação em todos os campos
políticos.
Em geral são perfis com algumas
características em comum: são monotemáticos, adotam como foto uma imagem
genérica ou algum ícone genérico. Têm poucas atividades pessoais, muitas delas
falsas. Reproduzem publicações de outros perfis similares. Passam o dia
patrulhando a web e a mídia tradicional (jornais, TV, rádio etc.) em busca de
afirmações que contradizem a ideia que querem disseminar. Uma vez identificada
uma manifestação desse tipo, atacam imediatamente a ideia ou a pessoa que a
proferiu.
A maioria desses perfis espalha
mensagens pré-fabricadas. Com isso, esperam infectar pessoas nas adjacências,
fazendo-as repetir as mesmas palavras e usar o mesmo tom. Os objetivos dessa
estratégia são muitos: tornar discursos de ódio "normais", calar
divergências e tornar aceitável o inaceitável.
Esse tipo de ação está se tornando
tão comum que várias empresas começaram a desenvolver tecnologias antitrolls.
Muitas estão desenvolvendo ferramentas que usam inteligência artificial para
reconhecer os padrões do discurso dos "trolls". Tarefa que não é tão
difícil, dado que esse tipo de discurso é simplório e repetitivo.
Com essas ferramentas em mãos, cada
rede social, site, usuário ou comunidade poderá decidir o que fazer com esse
tipo de manifestação. Uma possibilidade será reduzir seu alcance. Em casos
relacionados a questões graves, como Estado Islâmico, será possível bani-lo na
raiz.
Essa tecnologia foi usada com sucesso
pelo popular jogo "League of Legends", que tem 67 milhões de
usuários. A empresa identificou que os chats estavam se tornando um covil de
ódio e assédio. Adotou então inteligência artificial para avisar aos jogadores
em tempo real quando escreviam um comentário abusivo. Com isso, 92% mudavam a
mensagem para algo mais construtivo.
Esse tipo de tecnologia estará em
breve disponível para qualquer empresa ou comunidade on-line. Isso trará
interessantes debates sobre liberdade de expressão.
Um emprego potencial será na área de
comentários dos jornais, em que discursos de ódio são frequentes. Até lá,
continuará valendo a máxima criada nos primórdios da internet para se lidar com
"trolls": nunca brigue com um porco, ambos ficarão sujos, mas o porco
gosta.
Ronaldo Lemos - advogado, diretor do Instituto de
Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITSrio.org). Mestre em direito por
Harvard. Pesquisador e representante do MIT Media Lab no Brasil.
Fonte: coluna jornal FSP