Esqueça a geração Z: a geração que está emergindo é
a da paralisia
Enquanto
China vê crescimento da geração Tang Ping , termo que significa 'ficar
deitado', Brasil lida com geração Nem-Nem.
Há algo de errado. O mundo tornou-se um lugar inóspito para
jovens. Quem tem entre 15 e 35 não está em situação invejável, tanto do ponto
de vista econômico como social.
Falta de emprego, ausência de perspectivas de mobilidade social
e um vazio existencial crescente caractarizam um novo tipo de juventude.
Esqueça termos marqueteiros como "millennials" ou "geração
Z" que querem apenas vender algo ou dourar a pílula. A geração que está
emergindo é na verdade a geração paralisia.
O fenômeno é visível em várias partes. Por exemplo,
a China está enfrentando o
crescimento da geração chamada Tang Ping (躺平).
O termo significa "ficar
deitado" e se refere a um contingente de jovens cujo mote principal da
vida é não fazer nada. A ideia é recusar-se a trabalhar ou a estudar e simplesmente deixar
o tempo passar.
Um dos problemas é que essa postura tem sido
adotada por jovens de 18 a 30 anos.
Esse é justamente o momento em que a pessoa
constrói relacionamentos e cria bases profissionais que podem servir de apoio
para toda a vida.
O fenômeno agravou-se recentemente com o surgimento
da geração Bai Lan (摆烂).
O
termo significa "deixar apodrecer". E indica exatamente isso, não só
não fazer nada, mas também um desejo de que a condição de vida se degringole e
saia dos trilhos.
O fenômeno não é específico da China.
O Brasil
tem lidado há anos com o problema da geração Nem-Nem, que nem
estuda nem trabalha. No Brasil o
número de integrantes dessa geração é o dobro dos países desenvolvidos, de
acordo com dados da OCDE.
Em 2020 havia cerca de 36% de pessoas na faixa entre
18 e 24 anos sem emprego e sem qualquer atividade educacional. Na média da OCDE
esse percentual é de 15%.
Esse fenômeno leva a alienação, solidão,
desagregação social e perda de sentido.
Boa parte desse tempo livre pode ser
ocupado por mídias sociais, considerando que essa geração não tem trabalho,
emprego ou escola, mas tem sua capacidade de atenção intacta, podendo ser capturada por
conteúdos digitais.
Uma pesquisa feita nos Estados Unidos com pessoas
entre 23 e 38 anos revelou que 22% dos entrevistados afirmaram ter "zero
amigos"; 27% afirmaram não ter nenhum amigo próximo e 30% afirmaram viver
com um sentimento permanente de solidão.
Outra expressão também originária da China descreve
uma outra dimensão desse fenômeno: "geração morango". Um contingente
de jovens que busca se destacar ou ganhar a vida projetando sua imagem pessoal.
Mas tal como um morango, podem ser bons de ver mas são fáceis de serem esmagados.
Não possuem controle real nenhum.
Esse é o paradoxo.
Em um momento de
hiperconexão por meio de redes sociais, as pessoas estão mais do que nunca
desconectadas.
Quem interage com o feed de uma rede social na verdade interage
com fantasmas. Nada daquilo diz respeito diretamente a você.
É uma forma de
comunicação que serve mais para iludir e desagregar do que criar laços humanos
que sejam reais e duradouros.
RONALDO LEMOS -
advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.