Os economistas defendem a hipótese do mercado eficiente
e argumentam que os traders (operadores de mercado) não
são capazes de vencê-lo. Mais recentemente, os economistas comportamentais
proclamaram que um viés cognitivo faz dos humanos péssimos tomadores de risco.
No entanto, novas evidências
descobertas em estudos de neurociência podem sair, afinal, em defesa dos
operadores de mercado. Uma pesquisa conduzida por John Coates - um ex-operador
de derivativos que se transformou em neurocientista - alega que os humanos,
quem diria, podem ser bons tomadores de risco. Coates diz ter encontrado evidencia
sugerindo que a preparação física de uma pessoa fornece uma medida precisa
sobre risco-retorno, que pode não estar sujeita aos vieses de comportamento
mencionados na economia comportamental.
Em determinadas condições de estímulo fisiológico, os traders que possuem sensibilidade aos sinais dados
por seus corpos, são capazes de maximizar risco e retorno. Enquanto traders cronicamente estressados, operando num
mercado em condições extremas, podem ter prejudicada sua capacidade de julgar
risco.
Essa dinâmica de stress contribui fortemente para as bolhas e quebras das
bolsas de valores, segundo Coates. A ideia básica é que quando os traders conseguem explorar a preparação
física na tomada de risco – gerenciando sua intuição – eles conseguem ganhar de
algoritmos embutidos nos sistemas automatizados de negociação.
Coates trabalhou por mais de uma década em Wall Street operando mesas de
derivativos do Goldman Sachs e do Deutsche Bank, antes de abraçar a
neurociência e a fisiologia aplicada.
Então, ele começou a fazer experimentos no seu antigo ambiente de trabalho. Ao
longo dos últimos 10 anos ele conduziu estudos na vida real, em mesas de
operação.
“Conectamos os traders com sensores da cabeça aos pés, 24
horas por dia, durante uma semana de cada vez e correlacionamos a alta
frequência de dados fisiológicos com as perdas e ganhos de suas contas e com os
dados de value-at-risk (nº que representa a pior perda
esperada de uma carteira/produto de investimentos num determinado dia).
Obtivemos resultados que saltam aos olhos indicando que o estado fisiológico
deles é provavelmente o maior determinante dos retornos”, falou Coates.
Em um dos experimentos Coates descobriu ao longo de duas semanas uma correlação
surpreendente entre os níveis de cortisol (um hormônio liberado pelo corpo em
resposta ao stress) e a volatilidade no preço de títulos da dívida pública
alemã (Bunds).
Os humanos não processam informações de mercado desapaixonadamente, como faz um
computador, argumenta Coates, nós reagimos a elas fisicamente e nossa
preparação física é uma medida precisa de oportunidades e ameaças.
“Humanos são robôs de última geração e não computadores de segunda classe. O
cérebro humano é um sistema incrivelmente poderoso que controla movimentos
extremamente complexos. Se alimenta de informações para produzir movimento”,
explica Coates.
Nesse sentido, um trader pode ser
comparado a um animal em alerta, agindo em resposta a determinado ambiente. A
resposta ao stress, que não é nada mais do que a preparação metabólica para o
movimento, é, portanto, um componente essencial da ação.
Coates prossegue com o argumento, amparado nos resultados científicos que
publicou, de que os traders tomam
as melhores decisões envolvendo riscos, em níveis ótimos de stress.
Entretanto, a maior descoberta de suas pesquisas é que o apetite de risco
dos traders muda com seus corpos. Quando os níveis de
stress estão elevados, por exemplo, após o estouro de uma bolha no mercado,
os traders se tornam mais avessos ao risco. Em
contrapartida, o contrário ocorre quando os mercados estão subindo e os níveis
de testosterona dos jovens machos estão altos, levando a um maior apetite ao
risco. Isso pode explicar porque comportamentos impulsivos ou
excessivamente defensivos emergem.
As pesquisas de Coates chamam a atenção para três aspectos chave: primeiro, as
preferências de riscos mudam, contrariando uma premissa que sustenta toda a
teoria econômica e financeira. Segundo, elas mudam de forma pró-cíclica,
significando que sob certas condições os humanos regularmente fazem escolhas
contra produtivas. Terceiro, as mudanças nas preferencias de risco são causadas
por mudanças no nosso corpo.
Coates comenta: “A maioria dos modelos econômicos e financeiros,
clássicos ou comportamentais, é baseada na premissa de que as preferências de
risco não se alteram. Essa premissa era necessária para construção de modelos
baseados numa arquitetura de escolha racional, que cai por terra se você
admitir que as preferencias de risco mudam.Até agora essa premissa fundamental
nunca foi testada em grande escala. O que descobrimos empiricamente nesses
estudos é que as preferencias de risco de fato se alteram. Elas se alteram
dramaticamente, de forma muito rápida e podem desestabilizar seriamente os
retornos. Mudanças pró-cíclicas nas preferencias de risco podem transformar um
mercado em alta numa bolha e um mercado em baixa numa quebra. “Eu acho um
escândalo que essa premissa nunca tenha sido apropriadamente testada”.
Reação Hostil
Os economistas, diz Coates, não aceitaram seus estudos de forma pacífica.
“Encontramos muita resistência para publicar nossos estudos em jornais de
economia e finanças, apesar dos estudos terem embasamento científico. A Ciência
tem que ser anárquica e disruptiva e não deveria importar quem você é ou qual
paradigma está testando”. A reação da comunidade médica foi muito melhor”,
acrescenta ele, que publicou seu trabalho em jornais científicos altamente
renomados como o Royal Society do Reino Unido e o National Academy of Sciences dos EUA.
Essa relutância dos economistas em
aceitar as pesquisas de Coates não é surpreendente se consideramos as críticas
que ele faz aos fundamentos da Ciência Econômica. Coates, porém, não apenas
critica a incapacidade dos economistas teóricos em testar uma hipótese tão
fundamental. Ao voltar sua atenção à psicologia e ao corpo, ele vai mais fundo
questionando a obsessão dos economistas pelo pensamento consciente e se
apoiando num princípio da filosofia ocidental que remonta a Platão: a separação
do corpo e mente.
Coates não está advogando uma
espécie de determinismo biológico nem dizendo que a racionalidade não conta.
Ele só está argumentando que, acaso a mudança nas preferencias de risco tivesse
sido levada em conta quando se analisou a origem da bolha imobiliária e a crise
de crédito nos EUA, a explicação teria sido bem diferente. De fato, é difícil
argumentar contra o fato das preferencias de risco terem mudado depois da crise
financeira.
Aplicação Prática
Coates diz que o resultado de suas pesquisas gerou grande
interesse dos gestores de ativos. As empresas de investimentos estão correndo
para entender as implicações disso para seus modelos de negócio e transformando
esse novo conhecimento em aplicações práticas.
Ele explica: “… no último ano as firmas de gestão de ativos mostraram-se
realmente interessadas porque seus modelos de negócio estão sob ameaça.
Recebemos diferentes questionamentos, dependendo de qual departamento nos
contata. Diretores de Assistência Médica, RH e Departamentos de Gestão de Risco,
nos perguntam sobre como melhorar seus processos baseados nos nossos estudos”.
No entanto, as mesas de gestão de carteira é que mostram particular entusiasmo,
comenta Coates. “Eles perguntam como podem fazer para ter melhores gestores de
investimentos. Vamos ensiná-los como usar tecnologia vestível, que monitora
respostas fisiológicas, quais sistemas deveriam estar monitorando, como se
correlacionam com performance e como devem se engajar
intervindo nos padrões de sono, nutrição e condicionamento físico. Essas
intervenções ajudarão os traders a se
prepararem para ter uma performance melhor.
"Coates diz que essa filosofia
também se aplica a investimentos de longo prazo. Se essa abordagem se
disseminar mais, a gestão ativa poderá reivindicar a volta de seu status
original. “Um ambiente como o atual com uma volatilidade tão baixa, talvez seja
o mais hostil possível para atuação de gestores discricionários. Mas a
volatilidade vai voltar e quando isso acontecer, os humanos serão capazes de
mostrar suas habilidades em tratar risco-retorno. Humanos bem treinados podem
se sair extremamente bem comparados aos algoritmos”, diz ele.
Para terminar, tendo por base os
estudos de Coates, eu queria dizer que os consultores de investimentos da
Mercer são muito preocupados com o condicionamento físico e a maioria é
“sarada”, está em perfeita forma física e com a intuição afiada para a tomada
de decisão sobre investimentos. Entre em contato com eles sempre que precisar
de aconselhamento sobre os investimentos do fundo de pensão da sua empresa.
Eder Silva - Principal Wealth – Expansion Leader – Mercer Brasil