Chegou o jornal para celular


A universidade de Harvard mantém um grupo de estudos sobre os caminhos para o jornalismo na era digital. O projeto, chamado NiemanLab, costuma reunir opiniões de especialistas sobre as tendências para o ano que está começando. O site com as previsões para 2015 conta com cerca de cem artigos, coisa para ir apreciando aos poucos.

Comecei a ler nesta semana e encontrei algumas visões muito interessantes. Aqui, falo de uma que me chamou a atenção: a aposta de grandes marcas do jornalismo em aplicativos para celular que oferecem uma experiência completa de informação. Isto é, uma edição diária com um conjunto limitado de matérias e a promessa de que, se a pessoa leu aquilo, está bem informada. Uma espécie de jornal para celular que você lê em poucos minutos. Ora, mas o encanto da internet não está justamente no oposto disso? Na ideia de uma lista interminável de conteúdos para que cada um decida onde clicar e quando parar? Essas novas iniciativas questionam tal crença.

Quem abriu a fila foi o The New York Times, com seu NYT Now, serviço que leva ao celular um resumo rápido das informações mais importantes do dia. A semanal The Economist também entrou nessa ao lançar, em novembro, um aplicativo de atualização diária, o Economist Espresso. E até uma empresa puramente digital como o Yahoo resolveu oferecer uma experiência completa de informação no aplicativo Yahoo News Digest. Quando grupos tão fortes decidem trilhar um mesmo caminho, vale a pena prestar atenção nele.

Segundo os analistas, três razões principais estariam na origem desse novo fenômeno. A primeira, óbvia, é o protagonismo avassalador que o celular ganhou na vida das pessoas – elas andam, dirigem, comem, conversam, vão ao banheiro e dormem com os olhos grudados no aparelho. Naturalmente, a busca por notícias migrou também para lá.

Outro motivo, também não muito surpreendente, é a possibilidade de cobrar pelo conteúdo, ao contrário do que acontece na internet de um modo geral. Com o grosso do dinheiro da publicidade digital indo parar cada vez mais nas mãos de Google e Facebook, e menos nos portais de conteúdo, essa cobrança passa a se tornar questão de sobrevivência para os veículos jornalísticos.

Mas o fator mais interessante para o eventual sucesso desses serviços estaria ligado a razões psicológicas. Segundo alguns analistas, as pessoas estariam cansadas de ter tanta informação disponível e nunca sentir que concluíram a tarefa de se informar adequadamente. Viveriam numa angústia constante de achar que nunca vão chegar ao fim da corrida para se manter atualizadas.

Nesse cenário, terminar de ler o resumo oferecido por uma marca respeitada do jornalismo representaria uma valiosa dose de alívio a mentes aflitas. Ou, como coloca Nir Eyal, estudioso da relação entre psicologia, tecnologia e negócios citado num dos artigos: “as pessoas têm uma sensação de recompensa ao completar uma tarefa, e isso as encoraja a repetir a experiência futuramente”. Essa seria a chave para formar o hábito de leitura e manter, no digital, o papel do jornal de ser “a oração matinal do homem moderno”, na célebre definição de Hegel, que já dura dois séculos.

Não sei se acredito nessa tendência, mas, diante da necessidade de encontrar meios de manter vivo o bom jornalismo, ela tem a minha torcida.

Demetrius Paparounis -  jornalista, consultor em comunicação e diretor da TAG Content

Fonte: Meio&Mensagem
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