Estimulação de nervo consegue gerar sensação de prazer.
Sabe
aquela história de que o papel dos nervos do estômago durante uma refeição é só
informar ao cérebro sobre a chegada de comida, e saciar a fome? Acabou de ser
enterrada por um neurocientista brasileiro.
O pesquisador foi
personagem desta coluna recentemente com um trabalho lindo, danado de difícil
de fazer, sobre uma região do cérebro que, quando estimulada por laser, faz camundongos atacarem brinquedos
de corda. Coisa de ficção científica, financiada pelo governo dos EUA, que
mostrou que há na amígdala (do cérebro) uma parte que dispara ataques violentos
letais, fundamentais a quem precisa caçar para sobreviver.
Pessoas comendo em restaurante –
Ivan
de Araujo está de volta com outro trabalho igualmente complicado e
elegantérrimo, desta vez atacando a conexão intestino-cérebro, aquela que tem
dado o que falar desde que virou moda estudar o microbioma: as bactérias
“boas” que habitam nossas entranhas.
Que
as bichinhas mudam nosso metabolismo e afetam até
nosso estado de espírito, isso já é ponto pacífico. A questão que permanece é
esta: como?
Usando
corantes ou vírus modificados, injetados ora no estômago, ora no gânglio nodoso
do nervo vago, ora em partes diferentes do cérebro de camundongos com precisão
submilimétrica para tornar as células infectadas sensíveis a um laser azul, a
equipe de Araujo pôde controlar quais células ativavam sob encomenda, e
traçar suas conexões entre corpo e cérebro.
Os
pedaços, encaixados como quebra-cabeças bem montado, revelaram o
todo. O nervo vago monitora estômago e intestino e, pelo núcleo do
trato solitário (o nome até lembra poesia), faz a substância negra liberar
dopamina diretamente no estriado.
Se
os nomes das estruturas não soam familiares, o resultado certamente é
conhecido: prazer. Que saciedade, que nada. A estimulação do estômago dá é
prazer, mesmo, direto no cérebro.
Formado
em filosofia e matemática pela Universidade de Brasilia, pós-graduado na
Escócia com passagem pela Universidade Duke, nos EUA, Ivan de Araujo há tempos
já fazia bonito nos EUA, na Universidade Yale, onde começou a estudar os
circuitos entre cérebro e corpo. Fez tão bonito que outras universidades
quiseram a honra de abrigar sua pesquisa, e agora sua nova casa é a Escola de
Medicina Monte Sinai, em Nova Iorque, onde ele é Professor Titular.
Porque é assim que acontece nos
países que levam pesquisa a sério: cientistas são disputados com ofertas
competitivas, como jogadores de futebol por clubes de desportos, e seus colegas
vibram com eles quando seu trabalho é reconhecido.
Suzana Herculano-Houzel - bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt
(EUA).
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