O que une empresas e organizações tão diferentes como
Adobe, Deloitte, Equifax, Uber, Yahoo! e o aeroporto de Heathrow, em Londres?
Todas foram atingidas por algum tipo de ataque ou vazamento dedados capaz de expor informações pessoais ou confidenciais de um
grande número de pessoas.
Esses casos mostram uma situação cada vez mais evidente:
em um mundo cada vez mais conectado, não há mais empresa, ONG ou órgão
governamental que possa se dar ao luxo de não fazer nada sobre segurança da
informação. Dá até para dizer que está em vigor uma nova versão da Lei de
Murphy: se uma informação pode ser vazada —e nada é feito para evitar isso—,
aquela informação será vazada.
Em outras palavras, quando não há a adoção de medidas
básicas de segurança de dados, cedo ou tarde eles serão expostos. Campanhas
como a "Encrypt All Things" (criptografe todas as coisas) definem uma
lista de sete passos essenciais a serem seguidos por qualquer organização.
Entre eles: criptografar toda a informação, em trânsito ou armazenada.
Controlar de forma segura quem pode ou não acessar os dados. Se um vazamento
ocorrer, informar imediatamente o público e consertar a vulnerabilidade que lhe
deu causa.
Essas medidas são um começo. Além delas, é preciso
também definir por meio da lei quais são as regras do jogo no país com relação
à proteção de dados. O caso do Brasil é peculiar. Estamos atrasados 30 anos nessa
questão. Olhando o mapa global, o país faz parte do seleto grupo de países que
fazem pouco ou nada sobre o assunto.
Nesse quadro, países como Angola, Arábia Saudita, Egito,
Gana ou Nigéria possuem legislação de dados mais sofisticada do que a brasileira.
Regionalmente, Argentina, Chile, Colômbia, México, Peru e Uruguai, todos
possuem leis específicas sobre dados pessoais. O Brasil não.
Há três projetos em curso no Congresso Nacional para
tratar do tema. No entanto, o Congresso prefere, infelizmente, fazer avançar
pautas estapafúrdias como a CPI da Baleia Azul, a autorização de bloqueios de
sites ou formas de proibir que cidadãos falem mal de políticos na internet a
enfrentar pautas estruturantes como uma lei dados pessoais. Essa lei é
estruturante porque é sobre ela que se deve construir iniciativas como governo
eletrônico, cidades inteligentes ou internet das coisas. Avançar em qualquer
uma dessa agendas sem ter antes uma lei de proteção de dados beira a
irresponsabilidade.
Em uma nota positiva, várias cidades estão se
movimentando para criar leis de privacidade municipais. Na semana passada, uma
coalizão multipartidária de vereadores assinou em São Paulo um projeto de lei
para proteger dados no âmbito do município, seguindo a proposta do projeto "Sua
Cidade, Seus Dados". Um passarinho me contou que há mobilizações
acontecendo para que outros municípios sigam o mesmo caminho. Enquanto o
Congresso adormece, as cidades tomam a dianteira desse debate global.
Ronaldo
Lemos -
advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro
(ITSrio.org). Mestre, pesquisador e representante do MIT Media Lab no Brasil.
Fonte:
colina jornal FSP