Precisamos de mais calma ao interpretar nossos filhos


Ninguém falou que ter filhos seria fácil, e, na atualidade, as dificuldades crescem dia a dia. Os pais estão submetidos a tantas pressões, demandas e valores sociais, que a lida com os filhos tem se tornado, para muitos, tarefa das mais angustiantes.

O estilo desvairado de vida que adotamos rouba muito de nosso tempo e faz com que mães e pais tenham cada vez menos paciência com crianças e adolescentes. E quem tem filhos sabe que paciência é uma das qualidades mais exigidas no convívio com os mais novos.

Muitos adolescentes e crianças têm ganhado pequenas batalhas que travam com os pais, boa parte delas a contragosto destes, por um único motivo: falta de paciência. "Quantas vezes terei de repetir a mesma coisa a meu filho?" Essa é uma pergunta de pais que ouço com muita frequência. Sempre dou a mesma resposta: por mais ou menos 18 ou 20 anos.

À falta de paciência para aguardar o desenrolar do desenvolvimento dos filhos, que não costuma ocorrer de modo linear, alia-se uma característica de nosso tempo, chamada de medicalização da vida, para complicar mais o trabalho dos pais.

Medicalizar a vida significa transformar questões que não são médicas em doenças ou suspeitas da presença delas. Darei alguns exemplos.

A mãe de uma garota prestes a completar cinco anos observou pequenos machucados na filha. Foi conversar com a professora da menina e ouviu que os arranhões e marcas de batidas tinham sido resultado de brincadeiras e interação da criança com a natureza. Vamos lembrar que, nessa idade, a criança ainda não tem total controle sobre seu corpo. Mas essa mãe não ficou satisfeita com a resposta e procurou um psiquiatra, por acreditar que a filha estava tentando praticar automutilação!

Os pais de um adolescente, que prefere ficar em casa lendo ao invés de sair, que não é muito procurado pelos colegas, que acha uma bobagem participar de redes sociais –sim, eles existem!– e que é tímido, passaram a achar que o filho tem características autistas.

Um último exemplo ilustrativo dessa questão: uma adolescente de 15 anos teve o primeiro namoro, que durou quase um ano, rompido. O ex-namorado disse a ela que queria curtir mais a vida e que o compromisso com ela o impedia. Uma semana de muito choro da garota e isolamento no quarto foi o suficiente para a mãe acreditar que a filha estava "profundamente" deprimida e que poderia tentar o suicídio. Perder um amor é sofrido, doloroso, mas faz parte da vida.

Precisamos ir com mais calma na interpretação dos comportamentos de nossos filhos. Muitas vezes, um cachimbo é apenas um cachimbo, como me lembrou uma amiga.

Para isso os pais precisam, primeiramente, ter paciência para observar melhor o filho durante um bom período. Devem, também, entender o contexto daquele momento da vida dele para identificar motivos para seu comportamento atual.

E sempre ajuda lembrar que todos nós temos nossas particularidades, nossas características pessoais frente à vida. Os mais novos ainda estão desenvolvendo isso, adaptando-se às reações que apresentam frente aos problemas que enfrentam. E para que possam se sentir apoiados pelos pais, estes precisam ser capazes de lhes transmitir segurança e afeto. Nada mais...

Rosely Sayão - Psicóloga e consultora em educação, fala sobre as principais dificuldades vividas pela família e pela escola no ato de educar.

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