Maturidade: Seria a hora de Implementar Prevenção contra Fraudes nos Fundos de Pensão?


A chamada à reflexão decorre de que, à medida em que caminhamos para a maturidade de um sistema robusto como o dos fundos de pensão, a passagem por uma CPI poderia ser evitada, com a existência de um modelo consistente de prevenção de fraudes, pois quaisquer distorções nos parâmetros, como na taxa de juros (rentabilidade dos investimentos), ou na tábua de mortalidade, ou em quaisquer outros parâmetros considerados, em face de fraudes, também poderão comprometer a saúde do plano de benefícios.

Quando da análise da modelagem e implementação de um plano de previdência complementar, estipula-se o custeio por meio de contribuições e da rentabilidade do fundo acumulado para fazer frente a um fluxo de pagamentos no futuro que tem como objetivo dar cobertura à aposentadoria. De um lado, o participante e/ou patrocinador se comprometem a pagar uma quantia para fazer face àquilo que se deseja receber durante a aposentadoria. De outro lado, o fundo de pensão, por meio do plano de benefícios, se compromete a indenizar na ocorrência de um evento ou o pagamento programado da aposentadoria, mediante o recebimento daquela quantia de contribuições programadas.

Evidencia-se então, a necessidade de se estabelecer a equação de equilíbrio que viabilize essa operação de recebimento de um benefício. Para isso, quando desenvolvemos um plano de benefícios, levamos em consideração uma série de variáveis e procedimentos. Em síntese, o processo de estabelecer o custeio (contribuições) de um plano de benefícios previdenciários por uma entidade consiste na avaliação de hipóteses, nas características do plano e na capacidade de se prever os riscos futuros. A partir disto, justifica-se a necessidade da fixação de uma taxa de retorno dos investimentos (taxa de juros) e de hipóteses de ocorrência de eventos, como a sobrevivência, para um plano de benefícios.

No contexto técnico dos parágrafos anteriores, há um fato externo que pode causar grave distorção na evolução do plano de benefícios, gerando déficits e resultando, em consequência, na elevação de contribuições ou na redução dos benefícios. Refiro-me, além das divergências naturais das hipóteses, ao fato externo que é a possível ocorrência de fraudes ocorrência de fraudes, o que será objeto de análise e investigação pela antecitada CPI, e que pode proporcionar prejuízos relevantes aos participantes, assistidos e patrocinadores, economia nacional e, em última instância, à sociedade. A ocorrência de fraudes não é um problema que pode ocorrer apenas o Brasil; atinge todo o mundo e é razão de preocupações crescentes e constantes, em especial para os sistemas de fundos de pensão e securitários em geral.

Conforme pesquisa da Association of Certified Fraud Examiners – ACT, que  publicou o Report to the Nations on Occupational Fraud and Abuse 2014, contendo um estudo sobre as fraudes sofridas por empresas:

1.    Em média demora-se 18 meses entre o início e a descoberta da fraude;

2.    85% das empresas pesquisadas relatam ter sofrido apropriação indevida de ativos;

3.    37% dos casos estão relacionados à corrupção, cujas perdas médias representam US$ 200 mil;

4.    As denúncias continuam sendo o meio mais eficaz para detecção dos casos (40%, seguido de 16% pelo gestor, contra apenas 2% de monitoramento);

5.    58% das empresas não recuperam os valores subtraídos, e a recuperação total dos recursos desviados ocorre em apenas 14% dos casos.

No mundo, observamos um extenso sistema para combate a fraudes. Os Estados Unidos possuem uma legislação extremamente rigorosa com uma longa tradição de combate contínuo à fraude. Na comunidade europeia, criou-se um Comitê de Combate às Fraudes que opera em sintonia com as entidades e órgãos de estado e polícia. As iniciativas mais recentes, no âmbito geral, para aperfeiçoar a detecção e a prevenção da fraude estão associadas às iniciativas de nível interno das entidades. Criaram-se unidades especiais no âmbito das entidades para coordenar as atividades antifraude nas diferentes especificidades, como no âmbito dos investimentos, e como na concessão e manutenção de benefícios.

Assim, a prevenção de fraudes vem assumindo de forma progressiva um papel relevante nos conceitos de controle interno e da gestão de riscos, onde são implementados o monitoramento sistemático e da qualidade, este último realizado pela auditoria interna.

Há também previsão a tal tema na Solvência II, no sistema de governança e, neste, na gestão de riscos como parte dos controles internos, que está intimamente ligado à diminuição das incertezas que cercam o objetivo final dos fundos de pensão, qual seja o de agregar valor a todas as partes interessadas, sejam os participantes, assistidos, patrocinadores ou instituidores, gestores e empregados, governo ou sociedade civil.

Nesse sentido, segundo o COSO (Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission), a Gestão de Riscos é: “um processo efetuado pelo Conselho de Administração (ou Deliberativo), pela Diretoria e pelos demais gestores e colaboradores de uma empresa (ou EFPC), aplicável ao estabelecimento de objetivos estratégicos e desenhado para identificar potenciais eventos que possam afetar a organização, para administrar seus riscos dentro dos limites aceitáveis e para proporcionar segurança razoável para que os objetivos e metas sejam atingidos.

Tal definição implica conceber a gestão de riscos como um processo interno e continuo, aplicável a todas as atividades e unidades organizacionais e executado por todos, independentemente da posição cargo ou função.

É primordial prever que o auditor independente, e/ou a auditoria interna e/ ou diretor responsável devem comunicar ao órgão governamental responsável, a existência ou evidências de erros ou fraudes de qualquer valor executados por membros da diretoria da EFPC, e fraudes relevantes efetuadas pelos funcionários das EFPC.

Desta forma as EFPC devem implementar nos componentes de controles internos itens específicos de prevenção de fraudes, prevendo:

  •          Construção de um ambiente especifico validado pela auditoria interna para identificar fraudes;
  •          Ter uma adequada política de prevenção a fraudes;
  •          Implementação de atividades para prevenção a fraudes;
  •          Implantação de controles internos, metodologias e ferramentas que possibilitem a detecção dos indicadores de fraudes;
  •          Implementar a segurança na informação;
  •          Implementação de monitoramento periódico e sistemático com revisão obrigatória pela auditoria interna.

A implementação de prevenção de fraudes nos controles internos e gestão de riscos das EFPC apresentam uma estrutura de supervisão, que requer um aumento significativo nas análises para estabelecer a prevenção, detecção, investigação e repressão das fraudes. A área de auditoria interna, com a implantação da gestão de riscos nas EFPC, vem se tornando um dos órgãos de governança interna mais importantes, a partir da introdução dos conceitos da Solvência II, como também previsto para as funções atuariais em Solvência II e as funções Atuariais.

Considerando o levantamento a ser dado pela CPI dos fundos de pensão, entendo que para obtermos dados precisos que confirmem ou afastem a ocorrência de fraude nos casos investigados, teremos de aguardar ainda algum tempo, e é certo que medidas mais eficazes no âmbito institucional terão ainda de ser desenvolvidas. Trata-se de um desafio no sistema das entidades fechadas de previdência complementar. As fraudes, em especial as que estão sendo investigadas nas aplicações dos investimentos, as quais refletem numa redução da rentabilidade, ainda continuarão contaminando os resultados dos planos, por algum tempo, trazendo perdas para a sociedade, impedindo o acesso da população à proteção do seguro e prejudicando o desenvolvimento do sistema no Brasil e no mundo.

Cesar Luiz Danieli - Atuário, e Diretor de Previdência, Saúde e Seguros da GAMA Consultores Associados.

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