Sempre que se inicia um novo
ano temos a expectativa de que as coisas serão diferentes. Em mercado
financeiro algumas vezes as coisas são realmente diferentes. Já vi estudos
sobre os chamados “efeito outubro” e “efeito janeiro”. O “efeito janeiro” é definido
pela Wikipedia da seguinte forma:
“The
January effect is a seasonal anomaly in the financial market where securities prices
increase in the month of January more than in any other month. This creates an
opportunity for investors to buy stocks for lower prices before January and
sell them after their value increases…”
Só que em 2014 esse efeito
foi o contrário do que esperávamos… infelizmente. Será mesmo que o novo ano se
iniciou? Bom, o calendário diz que sim mas o gosto ainda é de 2013, talvez até
um pouco mais amargo.
O Índice BOVESPA fecha o mês
de janeiro com uma queda de 7,5%, a taxa SELIC sobe para 10,5% (com expectativa
de novas altas) e as NTN-Bs, grandes aliadas dos Fundos de Pensão no passado,
chegam a ser negociadas com taxas acima de 7,10%aa, ou seja o valor das NTN-Bs
com vencimento longo (acima de 2030) caiu mais de 6% em janeiro. Lembro-me bem
do tempo em que renda fixa era fixa, hoje o “preço” da renda fixa varia como
bolsa… tempos modernos!
Com um janeiro assim não
podemos esperar nada mais nada menos do que mais um mês de rentabilidade ruim
tanto para a carteira de renda fixa quanto para a de renda vaiável dos Fundos
de Pensão Brasileiros. 2014 não se inicia bem. Mas, o que esperar de para o
resto do ano?
Para responder a essa
pergunta temos que investigar o que está acontecendo e se há mesmo um
fundamento forte para uma reação tão negativa em um mês que tipicamente é
otimista. Bem, infelizmente temos muita coisa indigesta no prato do Brasil.
Vamos ver os fundamento que eu julgo serem os mais importantes:
1- Gastos do governo: Os
gastos do governo estão se elevando e o superávit primário encolhendo desde
meados de 2010. Em 2013 ele fecha em torno de 2% do PIB, muito abaixo da meta
de 3,2%. Como 2014 é ano de festa (carnaval, copa e eleição) a expectativa é
que o superávit primário do Governo seja menor ainda. Má notícia para o mercado
como um todo e principalmente ruim para a renda fixa pois aumenta o risco país
e força alta nas taxas de juros (vale notar que a arrecadação do governo vai
muito bem obrigado! Principalmente após a retirada dos estímulos). O mercado
espera da Dilma maior austeridade fiscal. Entretanto estamos no ano da copa e
de eleição, teremos austeridade? Eu não espero resultados bons nesse ano. Se
não tivermos do governo um real e forte compromisso com a austeridade fiscal, o
Brasil será aclamado líder absoluto do grupo “dos cinco frágeis”.
2- Produção industrial. Desde
2010 a indústria brasileira não cresce. O recente aumento na taxa de cambio
também não ajudou muito. Por outro lado o consumo e as importações crescem
fortemente. Péssima notícia para bolsa Brasileira pois a indústria não consegue
faturar o que segura o preço de suas ações. Além disso o país fica mais
vulnerável pois o consumo depende muito do setor externo.
3- Salário e Desemprego: Os
salario reais no Brasil continuam crescendo e o desemprego continua diminuindo.
Socialmente essa é uma ótima notícia, sem dúvida, mas economicamente esse fato
coloca mais peso no custo das indústrias brasileiras e na inflação. Assim para
os mercados a noticia é ruim, a inflação sobe, a taxa de juros sobe, os custos
da indústria brasileira sobem, cai o lucro e cai o preço das ações.
4- Inflação: a inflação em
2014 deve ser maior do que em 2013, indicado pelos fatores acima expostos e
muitos outros que não mencionei. A pesquisa FOCUS de 24/01/2014 aponta um IPCA
de 6,02% para 2014.
5- Economia mundial: para
completar o quadro o mercado mundial não ajuda muito. Da Europa não esperamos
nada. A China parece que não crescerá tanto assim e os EUA dão sinais confusos.
Parece certo que lá fora ninguém apresentará forte crescimento em 2014 e,
consequentemente, a demanda por produtos básicos, principais exportações
brasileiras, será fraca em 2014.
O mercado está pessimista e
janeiro refletiu todo esse pessimismo. Mas há motivo para tanto pessimismo?
Quem vem acompanhando as notícias desde o natal tem sim motivo para estar
pessimista.
Acho que o Jornal Valor
Econômico de 04/02/2014 é um bom exemplo do humor em geral. Nele vemos o pior
desempenho da história da balança comercial brasileira. Vemos também os motivos
para o fraco desempenho da nossa indústria, que apesar da queda do real, não
reagiu muito. Nossa indústria parece até um doente convalescendo de uma doença
grave com respostas fracas e lentas. Segundo analistas os crentes custos
“comeram” praticamente todo o ganho proporcionado pelo câmbio. O custo da mão
de obra é a vilã.
O Jornal traz matérias sobre
a inflação que mostra que o seu centro está firme e forte. O mercado não está
confiante na capacidade do governo em lidar com esse desafio.
Alguns poucos gestores, a
maioria de fora, estão achando que os preços no Brasil estão bons. Entretanto a
maioria fala das oportunidades e da segurança do México, Taiwan, Coreia do Sul
e Malásia, países emergentes que demonstram ter mais controle sobre suas
economias, portanto bem melhor posicionados que os demais (e o Brasil) para
receber investimento externo. Ou seja, apesar termos defensores, o discurso
deles não é tão forte assim. É mais comum ver o Brasil ladeado pela Turquia do
que pela Coreia do Sul.
No lado político as coisas
não estão boas também, as mudanças ministeriais não indicam uma vontade de
mudança na postura (tolerante) do governo. Muito pelo contrário, os gastos com
custeio só sobem e os gastos com o investimento desaparecem.
A única notícia aparentemente
boa no jornal foi o aumento de venda e queda no índice de vacância dos shopping
centers. O crescimento de dois dígitos nas vendas em shopping contradiz o fraco
PIB em 2013. Essa contradição expõe outro fator preocupante, o distanciamento
da produção industrial com o consumo.
Acho que única notícia
realmente boa que li nesse dia foi que o endividamento da família brasileira
cresceu devido, principalmente, a financiamento imobiliário, que é muito baixo
no Brasil comparado com outros países. Como Consultor Financeiro esse é o único
tipo de endividamento de uma família que não me preocupa. Construção civil tem
um grande efeito multiplicador na economia, o que é bom.
Enfim, estamos recebendo uma
série de notícias negativas desde meados (para não dizer início) do ano
passado. Acho que janeiro apenas reagiu a um agravamento de alguns fatores que
já tínhamos percebido antes.
O que esperar então? O
mercado financeiro é muito comparado com o mar. Ele tem ondas (movimentos de
curto prazo) e marés (movimentos de mais longo prazo). Sem dúvida a maré não é
boa mas podemos esperar que fevereiro seja melhor (até porque pior do que
janeiro é difícil!). Alguma correção deve acontecer e fevereiro pode fechar no
positivo. Eu aposto nisso? Difícil dizer agora que o mês está apenas no seu
segundo dia útil.
E para o resto no ano o que
esperar? Bem, a maré é de baixa. Como expus brevemente, o problema é tanto
conjuntural quando estrutural. Para reverter esse quadro necessitamos de duas
grandes forças trabalhando em conjunto. Uma vem do governo e do povo brasileiro
e a outra independe do governo. São elas:
1- Muita vontade e
determinação do governo para realmente tomar medidas de curto médio e longo
prazo que conduzirão o Brasil ao crescimento sustentado no longo prazo (ligadas
aos 4 pontos acima listados). Vale comentar que na minha opinião o principal desafio
é o comprometimento com o cumprimento orçamento e uma grande reforma que
diminua o custeio do governo e possibilite o aumento dos investimentos.
Portanto o governo tem que dar um claro sinal de austeridade e reduzir o
custeio (sei que é difícil) gerando superávit primário;
2- Muita sorte para que o
mundo cresça e favoreça o Brasil no curto prazo comprando caro os produtos que
temos para vender. Aqui o importante é não deixar o real voltar a se valorizar,
o que acabaria com a convalescente indústria brasileira.
Essas duas forças podem
reverter rapidamente a situação atual e melhorar o humor do investidor (tanto
interno quanto externo).
Como investidor o que devemos
fazer? Isso depende muito de quanto você acredita nas duas forças acima
mencionadas. Eu não acredito muito nelas portanto estou mais do lado
conservador do que do otimista.
Entretanto podemos aproveitar
as oportunidades e comprar devagar. Para aqueles que conseguem viver com o
risco essa situação permite recompor a carteira e comprar ativos baratos (como
as NTN-Bs e várias ações). Mas devemos nos lembrar que tudo indica que esses
ativos podem ficar ainda mais baratos. Portanto compras devem se iniciar muito
lentamente.
Para aqueles que não toleram
o risco o CDI continua sendo a única opção. Vamos torcer, afinal estamos em ano
de Copa!
Lauro Araújo –
administrador de empresas, é diretor da LAS Consultoria – segmentos financeiro
e atuarial para fundos de pensão; já trabalhou nas consultorias Luz Engenharia
e Mercer e em gestoras de recursos como JP Morgan e Lloyd’s Asset Management