Com a corda no pescoço



O cenário era bem adequado: o estande da Inconfidentes Cervejarias Conjuradas, na última Expobeer, re­alizada há pouco mais de um mês, em Belo Horizonte.

O figurino dos participantes não poderia ser mais simbólico: todos com uma corda no pescoço, tal qual Tiradentes, célebre herói brasileiro que se revoltou con­tra a ganância da Coroa Portuguesa.

Essa foi a forma bem-humorada que os cervejeiros artesanais e donos de microcervejarias, reunidos no evento, encontraram para externar sua insatisfação contra os altos im­postos que ameaçam a sobrevivên­cia do setor. Se elas fecharem, quem gosta de uma boa cerveja poderá ser condenado ao consumo das bebidas comuns à base de milho e arroz fa­bricadas pela indústria mainstream, ou às importadas, que também fica­rão cada vez mais caras.

Os impactos da legislação tri­butária que está sendo discutida no Congresso Nacional serão trágicos  para cervejarias como a Backer, Bamberg, Colorado, Dado Bier, Falke, Wäls e outras boas marcas, algumas das responsáveis pela re­volução que colocou nosso país em destaque no mapa mundial da qualidade cervejeira.

São, ao todo, cerca de 200 pequenos fabricantes, que respondem por pouco mais de 1% do mercado nacional, mas que já ganharam inúmeras medalhas em respeitados concursos cervejeiros ao redor do mundo.

Mesmo sofrendo com o poder econômico desproporcional e a con­corrência predatória no setor, os pe­quenos cervejeiros não abrem mão de utilizar insumos de qualidade nos seus produtos, o que aumenta mui­to o custo de fabricação. O litro de cerveja industrial vai de R$ 0,30 a R$ 0,40, e as artesanais de R$ 2,00 a R$ 3,00, por causa das matérias-primas.

No ponto de venda, o preço da cerveja artesanal é, em média, de cinco a dez vezes mais alto que as industriais, sendo que, em outros países, essa diferença é em torno de 40%.

A isso se somam alíquotas de impostos de mais de 60%, enquanto gigantes industriais como Ambev, Brasil Kirin (ex-Schin), Heineken e Petrópolis pagam a metade disso.

Marcelo Carneiro, dono da Co­lorado e presidente da Associação Brasileira das Microcervejarias, que lidera a luta dos pequenos produto­res junto ao Congresso Nacional e ao Executivo, explica que “o setor não quer privilégios, mas justiça tribu­tária e as condições necessárias para que os pequenos fabricantes não desapareçam”.

Para ele, basta que os cervejeiros artesanais possam ser enquadrados no regime tributário simplificado (Simples) e que as alí­quotas de imposto sejam definidas progressivamente, em função do vo­lume produzido, como acontece nos Estados Unidos.

No Brasil, atualmente, a defini­ção das alíquotas é feita pela Receita Federal, que classifica as cervejarias em grupos de acordo com o preço do produto vendido ao consumidor final. São estabelecidos valores de referência para cada rótulo e quem paga o imposto de toda a cadeia é o cervejeiro, o mais penalizado. Esse mecanismo, chamado “substituição tributária”, parte do princípio de que é mais fácil fiscalizar centenas de fa­bricantes do que milhares de comer­ciantes.

Em outra frente de batalha, os cervejeiros, juntamente com os pro­dutores de vinho, espumantes, lico­res e aguardente, no início de maio, tiveram rejeitada pela Câmara dos Deputados proposta para sua inclu­são no regime tributário do Simples.

Apesar de 201 deputados terem vo­tado a favor, o pleito, que daria um grande alívio financeiro para esses setores, foi negado, pois eram neces­sários 237 votos.

Um dos temores dos congres­sistas é que o incentivo a esse tipo de indústria provoque aumento do consumo de bebidas alcoólicas em nosso país. No entanto, a experiên­cia de países como Inglaterra e Bél­gica, mostra que a cerveja foi usada ao longo da história como forma de diminuir o excesso de consumo de álcool.

O que vai de encontro ao lema dos cervejeiros artesanais bra­sileiros, o “beba menos, beba me­lhor”.

Por outro lado, um bom exem­plo recente do reconhecimento da importância da cerveja de qualida­de vem da Bélgica, que solicitou a inclusão das bebidas produzidas no país na lista do Patrimônio Imaterial da Unesco. A iniciativa partiu da Fe­deração de Produtores daquele país, que quer o reconhecimento da arte da produção da cerveja como parte da cultura do país.

Por enquanto, esse ainda não é o caso do setor cervejeiro brasileiro, que luta, antes de mais nada, pela própria sobrevivência.

Wilson Renato Pereira - Jornalista, psicólogo e psicanalista, é assistido da Forluz

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