Fomos atrás de caminhos para que você consiga encontrar a sua rota em
direção à felicidade e à satisfação pessoal.
O indiano Osho, um cultuado místico contemporâneos, que afirmou:
"A vida nem tem sentido nem é sem sentido. A questão é
irrelevante. A vida é simplesmente uma oportunidade, uma abertura.
Depende do que você faz dela. Depende de que sentido, que cor, que canção, que
poesia, que dança você dá à vida".
O
sentido da vida é que a vida acaba. Foi a lembrança que me
ocorreu numa tarde de inverno, quando, caminhando, olhei para o céu e vi um
azul tão azul, mas tão azul, que a única coisa que parecia fazer sentido era
ficar ali, à toa, sentindo aquele solzinho.
Mas
justo naquela quarta-feira azulzíssima eu tinha uma missão: escrever sobre o
sentido da vida. Bem que poderia começar e terminar com a primeira frase.
Precisa mais?
Se a vida acaba, nada melhor a fazer do que curtir o céu, o sol, a
ausência de nuvens.
Por um
momento, desejei ser Enriqueta, personagem do cartunista argentino Liniers. Nos
quadrinhos, a garotinha cheia de humor e personalidade se dedica às coisas
simples da vida, sempre acompanhada de Fellini, seu gato de estimação.
Deitar
na grama e contar estrelas, ler debaixo de uma árvore e passar horas no
balanço, enquanto Fellini persegue borboletas, são algumas das ocupações
favoritas de Enriqueta, capaz de observar uma folha rodopiando ao vento e
perguntar a ela: "Onde você aprendeu a dançar?".
O pai dessas criaturas delicadas é o argentino Ricardo Siri Liniers.
Conhecido
pela série Macanudo (bacana, na gíria castelhana), que traz Enriqueta e outros
pesonagens, como pinguins e duendes de longas toucas, Liniers, aos 40 anos, é
um mestre do gênero cômico que concentra, em quadrinhos, humor, crítica e
questionamento existencial. "Prefiro as pessoas que se perguntam sobre o
sentido da vida do que as que propõem a resposta", diz ele, ao
telefone, de um quarto de hotel em Mendoza, na Argentina, onde passava férias.
"Estamos todos nesta mesma bola, girando no Universo. A graça está no
mistério. Se soubéssemos as respostas, a vida seria tediosa",
acredita Liniers.
O sentido de sua própria existência, ele desenhou aos poucos. "Sempre me
pareceu muito difícil que conseguisse viver de `historietas¿.
Mas
não havia um plano B. Era uma questão passional", conta.
Com
tiras diárias no jornal La Nación, Liniers se tornou cult e ganhou o mundo:
seus quadrinhos são publicados na França, Itália, Espanha, República Tcheca,
Peru, México, Canadá. E, claro, no Brasil, onde tem uma coleção de fãs. Como
chegou longe assim é algo "misterioso como o mar". A inspiração,
muitas vezes, vem das filhas de 3 e 5 anos. "Elas me fazem reviver as
dúvidas existenciais", diz.
Ou da
natureza, como em uma viagem à Antártida, "um planeta gigantesco,
assustador", onde se sentiu "chiquito". "É preciso se
sentir pequeno para ter a dimensão real dos problemas. A vida é um
minuto", reflete. Admite que já se sentiu sem rumo diante da perda de um
amigo. Se tivesse de indicar o sentido da vida em uma estrada, o que
escreveria na placa? "Ay que ser buena gente", em bom espanhol.
"Mas não porque ser bom traga alguma recompensa. Ser bom é a
recompensa", sublinha Liniers.
Primeira à direita: desfrute da paisagem
Sigo em frente com a metáfora da estrada. De brincadeira, recorro ao Google
Maps.
Pronto:
o Sentido da Vida fica na avenida dr. Antonio de Barros, 90, Centro,
Atalaia, Paraná. Trata-se de uma escola, a 555 quilômetros de São Paulo.
Como
em uma caça ao tesouro, continuo sem noção de como chegar ao x do mapa.
Peço
pistas aos passantes: a amiga, a faxineira, o motorista que me leva a uma
entrevista.
Enquanto
ele me leva ao meu destino, faço a pergunta e ele responde surpreso: "O
sentido da vida?...". Sua razão de viver são "as crianças",
como se refere aos filhos, um rapaz na faculdade e uma menina no colegial.
"Mas deve ter algo mais, né?", diz. Desço do carro culpada por botar
tamanha minhoca na cabeça daquele homem.
As respostas, a essa altura, soam tão díspares como "salvar o
planeta" ou "preparar o purê de batatas perfeito".
Numa
noite, conversando com Anita, minha filha de 9 anos, insisto na pergunta.
"Nossa, mamãe, que assunto dramático!", exclama ela, sem saber o que
significa a palavra sentido. Traduzo: "Por que a gente está aqui
nessa vida?". "Ah, para viver a vida, né?", diz ela,
puxando as cobertas.
No dia
seguinte, recebo o link para um estudo que investiga o sentido da vida,
publicado na revista britânica Journal of Humanistic Psychology.
Dirigida
por Richard Kinnier, da Universidade do Arizona (eua), a pesquisa partiu da
análise de frases e escritos de 200 pensadores - do escritor Oscar Wilde ao
imperador Napoleão. Conforme o estudo, para uma minoria de pessimistas como
Freud, o criador da psicanálise, e o escritor Franz Kafka, a vida não
tem sentido.
Para
outro grupo, formado por gente como Napoleão e o físico britânico Stephen
Hawking, a vida é um mistério.
Poucos
e bons, como o cantor Bob Dylan, acreditavam que a existência não passava de
"uma piada". Já os idealistas diziam que o que vale é "amar,
ajudar os demais". Caso do indiano Mahatma Gandhi, que afirmou:
"Encontro minha felicidade me colocando a serviço de todas as vidas".
Por
fim, o resultado: "A vida é para ser desfrutada". Ao menos
era essa a crença de 17% das personalidades, algumas tão opostas como o
ex-presidente norte-americano Thomas Jefferson e a cantora Janis Joplin, que
morreu aos 27 anos e cantava "aproveite enquanto puder". Ou seja,
depois de analisar os escritos de 200 pensadores, a conclusão do estudo
acadêmico foi a mesma de minha filha de 9 anos (!).
Curva suave à esquerda: não pense, sinta
O enigma que atormenta a humanidade guarda em si uma segunda questão: se a
viagem importa mais do que o destino, como fazê-la valer a pena? As respostas
estão quase sempre ligadas a crenças religiosas ou filosóficas. Na Antiguidade,
a felicidade era a meta, em diversas correntes de pensamento.
Para
Platão, a alma só ficaria feliz se equilibrasse razão, coragem e instinto.
Aristóteles,
por sua vez, não julgava a felicidade como uma condição estática. Ele pregava
que ela só poderia ser encontrada na contemplação da vida. Na Idade Média,
quando o Cristianismo dominou a Europa, a religião transferiu o sentido
existencial do individual para o coletivo.
A vida terrena
entrou em segundo plano, diante da incrível possibilidade
de vida eterna. Nesse ponto, o assunto rende tanto que não caberia
aqui.
No século 19, foi a vez do existencialismo. Nesta vertente filosófica, o
dinamarquês Kierkegaard pôs nos ombros do homem a responsabilidade por seu
destino.
Na
visão dos existencialistas, cada ser humano tem o livre-arbítrio e deve dar à própria
existência um sentido.
Com
auge nos anos 50, a filosofia seduziu pensadores como Sartre e líderes
espirituais como o indiano Osho, um cultuado místico contemporâneos, que
afirmou: "A vida nem tem sentido nem é sem sentido. A questão é
irrelevante. A vida é simplesmente uma oportunidade, uma abertura.
Depende do que você faz dela. Depende de que sentido, que cor, que canção, que
poesia, que dança você dá à vida".
O autodesenvolvimento é um atalho precioso nessa busca. Conta-se que, no portal
do Oráculo de Delfos, na Grécia antiga, havia dois escritos: "Nada em
excesso" e "Conhece-te a ti mesmo".
Equilibrar
os anseios da alma com as cobranças do mundo moderno é o desafio. "Temos
um mundo interno, subjetivo, marcado pelo desejo. Mas há o mundo externo, com
suas demandas. Se a vida ficar à mercê de apenas um deles, será
prejudicada, ou pelo narcisismo ou pela submissão aos outros", pondera o
psicanalista Roberto Girola.
Ele
compara o sentido da vida a um alinhamento desses mundos, em torno de
um eixo. "É o eixo onde organizamos nossa ética e estética, ou seja, os
valores e a maneira de ver a vida. Esse alinhamento confere uma dimensão
sagrada à existência".
Há quem acredite que "largar tudo" e morar nas montanhas é a trilha
ideal para chegar lá. Para outros, a vida urbana, a rotina
profissional, a dedicação a uma causa humanitária, podem fazer tanto sentido
quanto. Até porque o sentido da vida também é mutante.
Para o
estudante, é passar no vestibular. Para o formando, encontrar trabalho.
O
segredo está em identificar o que dá significado à sua vida.
A
bióloga Fernanda Yokoyama de Carvalho, 35, se encaixa no primeiro grupo. Mãe de
quatro filhos, ela e o marido, Ricardo, iniciaram a vida juntos num
vilarejo sem luz elétrica, em Lençóis Maranhenses (ma).
Seis
anos depois, sentiram falta de estrutura e seguiram para São Paulo.
Os
banhos de lagoa deram lugar a dias diante do computador. "Ricardo chegava
em casa, as crianças já estavam dormindo. Fui entristecendo", lembra
Fernanda. Grávida do caçula, a bióloga, que sempre gostou de cozinhar, decidiu
apostar na gastronomia natural. Assim surgiu a Cozinha da Flor, uma empresa de
congelados orgânicos, instalada em um sítio em Santo Antônio do Pinhal (SP).
"Foi como plugar a vida de volta na tomada", diz ela. Para
quem ensaia uma mudança similar, Fernanda recomenda: "Não pense, sinta.
Procure resgatar seu sonho mais antigo, mesmo que pareça utópico. Esse sonho é
sagrado".
A saída é por dentro: a porta é o silêncio
O resgate do sonho de ser astronauta, emblemático entre as crianças, é o ponto
de partida do livro Sonhar é a Magia da Vida (ed. Ônix). Na ficção,
um advogado abandona sua carreira e vai atrás do sonho de infância. O autor, o
advogado Daniel Kaltenbach, ao contrário do personagem, não "largou
tudo". Aos 41, é vice-presidente de um grupo financeiro. "A maioria
das pessoas não vive, deixa-se viver. Aquelas que têm prazer no que fazem são
as que cumpriram seus sonhos", acredita. "Quando desenterramos esses
sonhos, o Universo conspira a favor. Caso contrário, é como andar na
contramão", diz.
"Todos os caminhos levam a lugar nenhum, mas alguns caminhos têm
coração", sugere o índio Dom Juan, no best-seller dos anos 70 A Erva do
Diabo, de Carlos Castaneda. "Mas como saber se o caminho tem um
coração?", questiona o aprendiz. "Qualquer pessoa sabe disto.
O
problema é que ninguém faz a pergunta. Um caminho sem coração nunca é
agradável. Tem-se de trabalhar muito para segui-lo.
Por
outro lado, um caminho com coração é fácil", responde Dom Juan. "Na
cultura indígena, o que dá sentido a vida é o espírito", emenda
o ambientalista Kaká Werá, índio de origem tapuia, idealizador do Instituto
Arapoty, que difunde os valores indígenas. "A vida é esse
espírito manifestado em diversas formas. Em algumas tribos, ela é como um sopro
divino que se corporifica. O desafio é vivê-la de acordo com a harmonia que nos
inspira este mistério", diz.
A
natureza, em que tudo se conecta, revela o sentido da vida. "A
natureza nos ensina a lei da interdependência que existe em cada coisa vivente.
Ensina que a diversidade gera mais abundância. Isso é lição de amor e de
unidade, na prática", diz. E deixa a dica: "A saída é por dentro. A
porta é o silêncio".
Ponto final: bem-vindo ao ponto de partida
Aos 43 anos, a escritora americana Cheryl Strayed é sinônimo de best-seller.
Ela é autora de Livre -A jornada de uma mulher em busca do recomeço (ed.
Objetiva), em que narra sua saga de 1.700 quilômetros por uma árdua trilha, e
que vai ganhar as telas de cinema em breve, com roteiro de Nick Hornby.
Seu
segundo livro lançado no Brasil, Pequenas Delicadezas, reúne o melhor de sua
coluna Cara Doçura, em um site de literatura, onde ela atua como conselheira
para desorientados de todos os tipos.
O
maior volume de cartas recebidas tem a ver com o amor romântico. "Queremos
ser amados e aceitos.
Cada
carta me lembra quão fortes e resilientes somos capazes de ser, e ao mesmo
tempo tão frágeis", acredita Cheryl. O sentido da vida, finaliza, é o
amor. "Estou aqui para amar. O amor é a força mais poderosa que existe na
terra - o amor romântico, o amor familiar, o amor de amigos e de filhos. Se
formos bem no amor, estamos bem em todo o resto", diz a autora.
Recebo as respostas de Cheryl por e-mail, em mais uma quarta-feira azul.
Olho
para trás e percebo que, sem a menor ideia do que dizer sobre "o sentido
davida", o texto se fez na busca.
Não há
um sentido só. Não existe ponto final. É no caminho que encontramos a escuridão
e também a luz.
Nada
melhor, então, do que dar uma volta e conferir mais uma das máximas de Liniers,
em uma tirinha de Enriqueta e Fellini: se o planeta está dando voltas no
espaço, todos os dias são uma viagem.
Liniers - um artista argentino, que tem trabalhos publicados
em boa parte do mundo. Essa é sua estreia em Vida Simples.
Rosane Queiroz - também está estreando por aqui. É dela,
ainda, o texto da subseção Transformação, no Compartilhe.
Fonte:
http://vidasimples.abril.com.br/temas/qual-sentido-vida-784463.shtml