ESTAMOS À MINGUA, MAS CHEIOS DE CLOROQUINA


Estamos à míngua, mas cheios de cloroquina

O Brasil deve crescer magnífico 0,3% esse ano, com investimentos estrangeiros 20% menores.

Qual o país que este governo vai deixar? Infelizmente, algo próximo do caos. Centenas de milhares de brasileiros mortos, recessão, inflação, desemprego, fome e desmatamento. 

Fora um isolamento geopolítico que já nos custou muito e vai nos custar mais ainda.

A pandemia não explica o desastre econômico que foi este governo. 

A melhor forma de ver isso é através do relatório Focus do Banco Central, que agrega expectativas do mercado sobre o desempenho da economia brasileira.

No dia em que o presidente assumiu o governo, as expectativas de longo prazo não poderiam ser mais claras: o PIB iria crescer pelo menos 2,5% ao ano, a inflação ficaria dentro da meta, o governo iria zerar o déficit primário, e o país iria chegar a receber quase US$ 90 bilhões de investimento estrangeiro direto ao final do governo.

Mas o que diz o relatório mais recente, publicado na segunda (14)? 

O Brasil deve crescer magnífico 0,3% neste ano, 1,5% no ano que vem,e talvez vá bater 2% em 2025. Os investimentos estrangeiros? Serão 20% menores. Inflação? 

Basicamente, o presidente não somente nos encheu de cloroquina e deixou os brasileiros à míngua mas destruiu o futuro do país.

E aí que mora um dos principais dilemas para o próximo presidente. Como tirar o Brasil do buraco, já que o próximo mandatário vai receber um país destroçado? 

A resposta que tenho para isso é contra intuitiva: por mais que pareça estranho, não há qualquer necessidade de um grande projeto de nação, nesse momento.

Um governo que desfaça as principais asneiras desse governo, combata o desmatamento, retome um Bolsa Família pujante, invista na educação básica, e se preocupe em melhorar a sociedade aos poucos, sem grandes políticas estapafúrdias, vai garantir um crescimento sustentado por anos.

Estamos há dez anos com demanda e oferta reprimidas.

 Existem milhões de projetos empresariais na gaveta, desde os mais simplórios até os mais sofisticados, de bilhões, que precisam somente de um ambiente institucional previsível para sair do papel. 

O trabalho do governo seria somente não atrapalhar.

Não é para ter bolsa-empresário. Não é para retirar impostos de produtos da linha branca, não é para programas bilionários. 

Um governo que normalize relações com nossos principais parceiros comerciais, procure eficiências na gestão da máquina pública, torne ilegal o porte de armas, acelere a vacinação, reforce o Ibama e tome outras ações que custam pouco, mas contam muito, já está de bom tamanho.

Saímos do populismo do governo Dilma para a extrema-direita. Nosso último governo normal, sem megalomanias ou negacionismo, terminou em 2006. 

Hoje, nossas opções eleitorais são populistas de esquerda ou direita, ou o extermínio social da extrema direita se reelegendo.

Ciro e Moro são a nova cara do populismo barato, das soluções simples para problemas complexos, dos projetos de nação megalomaníacos, das promessas vazias e da incapacidade de governar um país continental com o mínimo de segurança institucional. 

E esses são os menos ruins entre os líderes das pesquisas.

É necessário entender que temos problemas gigantescos e profundos. 

E que nenhum presidente, não importa quem venha a ser, vai conseguir em um governo acertar tudo que é necessário no país. 

Vamos focar o que importa, que é entregar dinheiro na mão de quem precisa. E acertar o que for possível, na margem. Sem surpresas. E sem cloroquina.

RODRIGO ZEIDAN - Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

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