Quando Detroit faliu, em 2013,
os investidores ficaram chocados ao descobrir que a cidade havia prometido
aposentadorias que acarretariam um gasto de bilhões de dólares a mais do que se
estimava, criando assim um gargalo financeiro que acabou gerando enormes
prejuízos inesperados para os detentores dos títulos da dívida de Detroit.
Agora, pesquisadores do Citigroup dizem que as condições estão
dadas para que conflitos semelhantes surjam em diversos países desenvolvidos,
cujos governos prometeram muito mais do que provavelmente poderão pagar a
atuais e futuros pensionistas, sem revelar essa disparidade a investidores que
adquiriram títulos públicos e que agora podem estar com seu capital ameaçado.
Vinte países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) prometeram um total de US$ 78 trilhões (R$ 282,5 trilhões) aos
seus aposentados, grande parte sem a cobertura financeira correspondente,
segundo relatório do Citigroup. Isso é quase o dobro dos US$ 44 trilhões
somados pelas dívidas nacionais desses 20 países, e as obrigações
previdenciárias “não aparecem nos balanços governamentais”, segundo o
Citigroup.
“A dívida pública global pode ser o triplo do que as pessoas
acham que é”, alertaram os pesquisadores depois de reunirem o máximo de informações
que conseguiram a respeito de vários planos previdenciários, fazendo ajustes
quando necessário para permitir uma comparação equilibrada com as dívidas
públicas emitidas.
Ao colocar no papel as obrigações previdenciárias não declaradas
de cada país, junto com suas dívidas soberanas, foi possível observar que
alguns governos quase certamente prometeram mais do que poderão cumprir.
“Se você tivesse uma dívida de US$ 44 mil, e o banco ligasse e
lhe dissesse: ‘Na verdade, você deve US$ 134 mil’, você iria cair da cadeira”,
disse Charles Millard, diretor de relações previdenciárias do Citigroup. “É bem
assim.”
Ele disse que nem todos os governos sobrecarregados por suas
promessas deverão testemunhar choques repentinos entre credores e pensionistas,
como aconteceu com Detroit. Mas muitos desses países continuarão enfrentando
dificuldades.
Uma das recomendações do relatório é que os governos comecem a
divulgar os valores prometidos aos pensionistas, “para que todos possam
vê-los”. No entanto, as autoridades em muitos casos relutam em fazê-lo, porque
acreditam que isso irá prejudicar suas notas de crédito, elevando os custos dos
empréstimos.
Os pesquisadores do Citigroup citam fatores demográficos
básicos. A maioria dos países desenvolvidos teve “baby booms” após a Segunda
Guerra Mundial, e as suas populações agora estão envelhecendo e desfrutando de
melhoras significativas na saúde e longevidade.
Quando os “boomers” entraram para a força de trabalho,
forneceram uma grande oferta de mão de obra para sustentar uma população de
pensionistas que na época era muito menor. Essa demografia favorável transmitiu
a sensação de que os sistemas previdenciários poderiam funcionar para sempre
com um financiamento mínimo — ou, em muitos casos, sem financiamento algum.
O relatório do Citigroup diz que a conta não fecha mais. “As
futuras tendências de população e expectativa de vida exercerão pressão sobre
os sistemas previdenciários dos setores público e privado”, afirma. “Se não for
resolvido rapidamente, acreditamos que isso poderá sobrecarregar os balanços
públicos e privados, funcionando como um forte entrave ao crescimento
econômico.”
Mary
Williams Walsh – repórter
do jornal New York Times