Incerteza profissional faz jovens sofrerem a 'crise
dos 25' ao chegar na vida adulta.
Comparações
provocadas pelas redes sociais e instabilidade econômica agravam o problema.
Na adolescência, Alef Dener já projetava como a
vida seria quando completasse 25 anos. Imaginava que teria casa própria, carro na garagem e carteira
assinada.
Agora que a idade chegou, ele se vê morando de aluguel, sem carro na
garagem e trabalhando como PJ (pessoa jurídica).
Em meio
à quebra de expectativas, cobranças e incertezas se acumulam.
"Nunca teve um momento da minha vida em que eu
estive tão ansioso como agora. Por mais que saiba que
estou fazendo o máximo, tenho essa cobrança interna de querer algo a mais,
mesmo sem saber o que exatamente", diz ele.
Os 25 anos trouxeram ainda
uma carga extra de ansiedade.
"Por eu viver em uma república e todo mundo
ter essa faixa etária, percebo que não sou só eu que estou mal."
O aumento da cobrança nesta idade ganhou o nome de "crise
dos 25", momento no qual jovens relatam aumento da ansiedade e das
incertezas na vida pessoal e profissional.
Segundo uma pesquisa do LinkedIn, 75% das pessoas de 25 a 33
anos já passaram por essa crise. Divulgada em 2017, o estudo ouviu 6.014
pessoas da Índia, Austrália, Reino Unido e Estados Unidos.
Para 61%, encontrar um trabalho ou uma carreira pela qual sejam
apaixonados era a principal causa da ansiedade.
Aqueles que estavam incertos
sobre os próximos passos na vida pessoal e profissional eram 59%.
Alef diz que se viu mais ansioso em relação ao futuro após ter
se formado, em 2020. "A gente se pega em um labirinto sem saber como sair
dali", diz ele, que cursou jornalismo, mas trabalha como publicitário.
"A gente sai da faculdade de certa forma desamparado.
Você se forma e
pergunta: ‘Tá, mas e agora? O que eu vou fazer?’"
Autora do livro "Crise dos 25", Alexandra
Robbins diz que a saída da faculdade costuma assustar porque os estudantes se
veem sem roteiro para viver. "A vida real não é como a faculdade, o que
pode ser assustador até para os estudantes mais bem-sucedidos, porque ir bem na
faculdade não necessariamente leva alguém a ir bem na vida."
Robbins explica que a chamada crise dos
25 é uma reação à transição da juventude para a vida adulta, fenômeno que pode
provocar uma série de efeitos.
"Eles podem ir desde a falta de confiança, que
gera depressão, a algo tão sutil quanto olhar para a vida adulta e perguntar:
‘Isso é tudo o que existe? "", diz ela, referindo-se ao sentimento de
frustração que pode acontecer ao chegar nessa fase.
REDES SOCIAIS AGRAVARAM O PROBLEMA
O livro de Robbins foi publicado em 2001, um
indício de que a crise não é nova. No entanto, diz ela, o que mudou foi a
intensidade do fenômeno. O motivo? As comparações provocadas pelas redes
sociais.
"A crise dos 25 em última instância se resume
a se comparar com o outro" explica a escritora. "Como posts em redes
sociais passam por filtros e são glamourizados, eles podem piorar a percepção
das pessoas sobre suas vidas pessoais, profissionais e financeiras.
Com as
redes sociais, tornou-se ainda mais difícil para jovens de vinte e poucos anos
sentirem que estão à altura."
Quando entra no Linkedin, Nilséa Fernandes, 25, se
sente em uma corrida na qual considera estar ficando para trás.
Desempregada
desde março, a jovem passou a usar a rede para se candidatar a vagas, mas a
plataforma acabou virando terreno fértil para comparações.
"Nesse processo, eu acabo vendo como a vida
das pessoas está andando, e a minha não.
Eu tenho o hábito de me comparar e
acabo me sentido inferior", diz a jornalista, acrescentando que a pressão
aumentou depois de seu aniversário.
A jovem conta que, para as mulheres, há uma pressão
adicional para casar e ter filhos, algo que ela mesma já sente.
"Enquanto procuro emprego, todas as pessoas
com quem eu converso falam: ‘E aí? E o casamento.’ Eu estou preocupada com a
minha vida profissional e financeira. Mas, enquanto mulher, o que me perguntam
é sobre casa e família."
ECONOMIA PREOCUPA JOVENS
Segundo pesquisa da empresa de consultoria Deloitte,
54% dos jovens da geração Z do Brasil (nascidos entre 1995 e 2003) se sentem
estressados e ansiosos o tempo todo ou na maior parte das vezes.
O índice é
maior que a média global (46%).
Os principais motivos de preocupação são as
perspectivas de trabalho e o futuro financeiro a longo prazo. O estudo foi
feito no ano passado e ouviu 800 pessoas.
Para o fotógrafo Hiago de Farias, 25, a situação
econômica do Brasil de fato preocupa. No final de fevereiro, ele precisou
voltar a morar com os pais depois de viver mais de um ano sozinho.
O motivo foi
o aumento dos preços. "Voltar agora é estranho. Dá uma sensação de
frustração. Mas ainda sou grato por poder ter onde ficar."
Ele também se sente frustrado ao ver o cenário econômico do país após um momento de crescimento econômico.
"A gente cresceu num mundo que parecia mais próspero e, agora, lida com um
cenário que esmaga a gente em uma situação de tensão."
Professora do Instituto de Psicologia da USP (Universidade de
São Paulo), a psicóloga Leila Salomão Tardivo explica que gerações mais jovens
estão expostas a um número maior de elementos estressores, o que explica a
disparada da ansiedade e do estresse nesse grupo.
"O aumento da pressão, essa comparação tão intensa que as
pessoas fazem, o estímulo à competição e ao corpo jovem são situações que
muitas vezes não trazem realização", diz
De acordo com a psicóloga, a pandemia agravou a angústia dessa
faixa etária em razão do aumento do desemprego e da miséria. "Para esses
jovens de 25 anos, a pandemia é uma carga de estresse a mais."
Para aliviar a ansiedade, a pesquisadora sugere que esses jovens
se aproximem de pessoas e grupos que gerem sentimentos positivos, e que
favoreçam o crescimento pessoal. "Mas se a situação estiver muito intensa,
as pessoas precisam buscar ajuda médica e psicológica", recomenda Tardivo.
Matheus Rocha – jornalista da FSP