No
dia 24 de janeiro, o Brasil comemora o Dia Nacional do Aposentado. Neste ano de
2017, os trabalhadores parecem não ter motivos para comemorar.
Por
um lado, temos 12 milhões de desempregados, consequência da crise econômica, e
esta, por sua vez, sem condições de reagir diante da crise política,
institucional e moral instalada no topo da “Casa Grande” de que nos fala
Gilberto Freyre (Casa Grande & Senzala).
Por
outro lado, estamos prestes a ver a Câmara dos Deputados votar a PEC 287, que
trata da reforma previdenciária. O argumento principal é o acelerado aumento da
longevidade dos brasileiros que alcançará, em 25 anos, o que na Europa demorou
150 anos.
Afinal,
quando a previdência social foi unificada em 1967, no surgimento do então
Instituto Nacional da Previdência Social (o “INPS” até hoje citado pelos mais
longevos), o Brasil contava com seis empregados (pagando contribuições) para
cada aposentado (recebendo benefícios). Hoje são menos de dois para um e, na
situação de crise, se aproxima da paridade: um aposentado para cada trabalhador.
As
razões?
Uma
delas é que os aposentados, que antes viviam nessa condição em média 10, depois
15 e até 20 anos, agora vivem, ainda em média, 30 ou mais anos. Ótimo que vivam
mais!
Decorre
daí que precisamos de mais dinheiro para custear esse aumento da longevidade.
Todos
os profissionais ligados à previdência entendem necessária uma reforma nos
benefícios, nas condições de concessão e nas fórmulas de cálculo da renda
mensal, que podem ser vitalícias ou temporárias. Posto isto, defende-se que uma
reforma seja necessária. Mas, será “esta” a reforma de que precisamos?
Uma
reforma previdenciária, para ser séria, deve abordar e publicar todos os dados
que influem nos seus resultados.
Publicar
os valores de aposentadorias pagos pelo INSS aos servidores públicos federais,
por poder: executivo, legislativo e judiciário.
É
extremamente simples dividir os valores de benefícios em partes. Por exemplo,
dividir cada grupo de beneficiários em dez partes (a exemplo do que fazem as
empresas nas políticas salariais). Simples assim, a população teria ao seu
dispor, entre tantas outras estatísticas: quantos são, e quanto ganham
mensalmente, os dez por cento no topo da pirâmide? E na base da mesma pirâmide?
Qual a razão entre os que ocupam o topo e os que ficam na base?
Igual
transparência deveria alcançar os benefícios dos militares. Por constitucional,
não se discute aqui seus direitos e deveres, inclusive com tratamento
previdenciário diferenciado a este grupo de brasileiros. Igualmente não se
discute o direito dos descendentes de militares mortos na Guerra do Paraguai, à
pensão “perpétua”, vez que passa de mãe para filha há 150 anos.
Lembremos
Margaret Thatcher: “não existe dinheiro público, existe apenas dinheiro dos
pagadores de impostos”.
E
quem paga merece, no mínimo, conhecer a destinação dos recursos.
Seria
adequado o governo mostrar, e o povo exigir, o cumprimento do Art. 10 da
Constituição Federal. Nele está expressa a necessidade de assegurar a
participação de trabalhadores e empregadores nas discussões e deliberações em
questões de interesse profissional e previdenciário. É preciso esclarecer:
foram bem conduzidos os debates?
Mais
grave ainda, no confronto da PEC 287/2016 com a Carta Magna, é a desobediência
aos preceitos do equilíbrio atuarial, claramente determinado nos caputs dos
artigos n° 40, que trata da previdência dos servidores públicos (RPPS), e n°
201, previdência destinada principalmente a empregados das empresas privadas
(RGPS).
Em
ambos os artigos o mesmo texto constitucional: “(...) observados critérios
que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial (...)”. Registre-se que a
PEC 287/2016 não propõe alteração dos caputs dos artigos citados.
Para saber se tais estudos foram realizados – e não
divulgados – um grupo do qual participo, liderado pelo Advogado Fernando
Calazans e composto ainda pelo advogado Roberto de Carvalho, requereu cópia ao
Ministro da Fazenda e ao Presidente da Câmara dos Deputados. Em resposta, o Deputado
Rodrigo Maia informa que “(...) eventuais estudos atuariais não juntados
pelo Poder Executivo quando da apresentação da proposição deverão ser
solicitados à Presidência da República”.
A
questão se reduz a divulgação dos estudos atuariais que determinam equilíbrio
financeiro e atuarial. Caso não existam, que sejam feitos agora, por
determinação constitucional. Atuários não faltam (ratifique-se que estudo
atuarial é prerrogativa do profissional atuário).
E,
caso existam, o Executivo Nacional tem a obrigação de torna-los públicos – e o
Legislativo exigir tal publicidade – em nome do debate e da transparência
democráticas. A omissão das autoridades denota afronta à Constituição Federal,
especialmente ao disposto no Art. 10. Isso por um governo que tem no seu líder
máximo um professor de direito constitucional.
Mais
ainda a estranhar: a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJD)
aprovou a admissibilidade da PEC. Em claro confronto com a Constituição
Federal, a PEC é admitida pela comissão guardiã do seu cumprimento.
As
instituições representativas podem até estarem mobilizando-se contra a forma e
o modelo da reforma. Se o fazem, é por iniciativas individuais.
Conclamamos
todas as entidades representativas de profissionais e de empregadores, tais
como sindicatos e associações, além de toda a sociedade, organizada ou não,
para se juntarem numa ação global de apoio ao cumprimento da Constituição.
Entre
tantas outras instituições, ficam convidadas o Instituto Brasileiro de Atuária
- IBA, a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, o Conselho Federal de
Contabilidade – CFC, o Instituto Brasileiro de Auditores Contábeis – IBRACON, a
Associação Brasileira dos Fundos de Pensão – ABRAPP, o Sindicato dos Fundos de
Pensão – SINDAPP, o Instituto de Certificação da Seguridade Social - ICSS e a
Associação dos Contabilistas dos Fundos de Pensão – ANCEPP.
Dia
24 de janeiro - dia do aposentado. Daqui a uma quinzena a Câmara dos Deputados
terá retomado o trabalho.
Uma
das primeiras pautas, no interesse do governo, é a PEC 287. Faz-se necessária a
elevação da voz dos homens de bem, para impedir mais uma ação orquestrada por
poucos contra os interesses daqueles que estão segregados na “senzala” (nova
bênção, Gilberto Freyre).
Pode-se
escolher entre lutar agora ou reclamar depois.
Uma
alternativa é acreditar que se reverta, a favor do povo, a expressão do
Deputado Rodrigo Maia, em contexto contrário, no exercício da presidência da
Câmara: "não somos obrigados a aprovar tudo que chega nesse
plenário!(1)".
É hora de elevar o tom de voz.
(1) Casa Grande & Senzala, de Gilberto Freyre, livro que
retrata o pensamento brasileiro
Ivan Sant’Ana Ernandes - Atuário
MIBA 506 - ivan@atestconsultoria.com.br
Colaborou: Eliane Miraglia:
elianemiraglia.blogspot.com.br