App de rádio explode na pandemia


App de rádio explode na pandemia

Cada pontinho no globo terrestre da tela representa uma rádio daquele lugar.

Um aplicativo que até há pouco tempo era usado só por aficionados explodiu em audiência na pandemia. 

Trata-se do Radio Garden, app que permite ouvir estações de rádio de todas as partes do mundo gratuitamente.

Uma das suas características mais legais é que sua interface é um detalhado globo terrestre. 

À medida que você vai girando, vão aparecendo milhares de pontinhos verdes pela tela. Cada um deles é uma estação de rádio localizada naquele lugar. Basta ir até ela que sua programação ao vivo começa a tocar imediatamente.

A experiência é fascinante. Dá para ouvir a Aywa FM, do Sudão, que está com uma programação especial de cantos para o atual período de Ramadã. 

Tem também a Radio City Metal, de Mumbai, na Índia, que só toca metal pesadíssimo o dia todo, algo inconcebível nas ondas de rádio brasileiras. 

Dá para ouvir a Rádio Calheta, da Ilha da Madeira, especializada no que há de melhor do pop romântico português. Ou ainda a Rádio Guandong, na China, que alterna música ocidental com clássicos cantoneses.

Esse giro pelo mundo traz sentimentos antigos. 

Lembra quando, muito tempo antes da internet, era possível sintonizar o rádio nas frequências de ondas curtas (OC) durante a noite e, com um pouco de sorte, captar rádios internacionais transmitindo em várias línguas, como o BBC World Service.

Com pessoas no mundo todo isoladas em casa pela pandemia, não é surpresa que tanta gente tenha sido acometida por “sentimentos oceânicos” e compelida a baixar o Radio Garden. 

Nos últimos 60 dias, o site e o aplicativo tiveram 15 milhões de usuários, um aumento de 750% no número de pessoas que normalmente visitam o portal.

Também reveladora é a história de como o Radio Garden foi criado. 

Ele surgiu como um projeto de pesquisa sem fins lucrativos em 2016, financiado pelo Instituto da Visão e do Som em Amsterdã, instituição pública da Holanda. 

A ideia era pesquisar como o rádio é capaz de promover encontros transnacionais. O que faz todo sentido. 

Basta perguntar para qualquer morador de Belém do Pará, por exemplo, que ela irá relatar como a proximidade com as rádios do Caribe influenciou a música local, do carimbó ao tecnobrega.

Em 2018, o Radio Garden migrou de projeto de pesquisa para se tornar uma pequena empresa startup. Curiosamente, no início havia apenas 7.000 rádios disponíveis. 

Hoje, são mais de 30 mil e há uma fila de estações globais se inscrevendo para ter o seu sinal incluído no projeto.

Mais do que isso, o crescimento do Radio Garden sinaliza também uma fadiga com algoritmos. 

Os sites de streaming de música têm um papel importante, mas, depois de um tempo, os algoritmos acabam levando a algum tipo de câmara de eco. Você fica preso no seu próprio gosto musical, e músicas do mesmo tipo que você já escuta se tornam padrão. 

Nesse sentido, o rádio representa um retorno à curadoria musical feita por humanos. Nisso o Radio Garden é imbatível.

É fascinante descobrir a diversidade incrível que existe no planeta, traduzida em música. E também as similaridades e os pontos em comum, que frequentemente acabamos por ignorar. Bon voyage!

Ronaldo Lemos - advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.

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