A qualidade do ar e o esforço
para trabalhar
Poluição tem efeitos diretos detectáveis na produtividade de pessoas
saudáveis.
Com o inverno, o ar da cidade de
São Paulo fica mais poluído. A feia fumaça tinge o horizonte e apaga as
estrelas.
Sabemos que a poluição afeta a
incidência de doenças respiratórias e a saúde das pessoas de modo geral. Será
que a produtividade no trabalho de pessoas saudáveis também é
afetada?
Claro, pessoas doentes produzem
menos, e doenças são custosas em vários sentidos. Mas será que a poluição tem
efeitos diretos perceptíveis sobre quanto nos esforçamos e quanto produzimos?
Em economia,
é tipicamente difícil identificar o que causa o quê. Poluição pode afetar a
produtividade, mas mudanças na economia claramente afetam a qualidade de ar
—por exemplo, por afetar emissões de poluentes de fábricas e automóveis.
Em princípio, seria possível verificar
como mudanças na poluição em curtos espaços de tempo causadas por fatores meteorológicos —portanto não
causadas por mudanças na economia— afetam a produtividade.
Um problema é que em
geral, não temos medidas ou estimativas de produtividade no trabalho para cada
dia.
Os pesquisadores Haoming
Liu e Alberto Salvo, da National University of Singapore, têm encontrado formas
de passar por esses obstáculos e responder a essas questões.
Em um de seus trabalhos,
coautorado com Jingfeng Lu, eles usam dados de partidas de tênis do Aberto da Pequim da WTA. Cada jogo vale muito
—o valor mediano de prêmios por vitória é 15 mil dólares, sem contar os efeitos
no prestígio e no patrocínio.
Pequim é uma cidade muito
poluída, mas com bastante variação nos níveis de poluição. Assim, podemos
comparar partidas que ocorrem, por sorte ou azar, em dias mais ou menos
poluídos.
Além disso, a frequência dos dados nesse caso não é um problema
—sabemos o que acontece nos jogos a cada dia.
O problema é que a poluição
afeta as tenistas dos dois lados da quadra.
Como medir o efeito da poluição?
Num jogo de tênis desse torneio,
há dois resultados possíveis: vitória por 2 sets a 0 e vitória por 2 sets a 1.
Cada set leva um pouco menos de uma hora.
Os autores argumentam, usando
um modelo matemático, que se poluição afeta a
disposição de exercer esforço para buscar a vitória, deveríamos observar mais
jogos com placar de 2 a 0.
A ideia é a seguinte: se eu
perdi o primeiro set, ganhar o jogo requereria vencer os outros dois. Isso
requereria muito esforço por bastante tempo.
Seja porque esse esforço me
deixaria acabado para a partida do dia seguinte, ou porque é muito desagradável
me esforçar tanto em condições adversas, eu escolheria me esforçar menos.
Por outro lado, se eu ganhei o
primeiro set, o esforço para vencer o segundo é particularmente valioso em
condições adversas, pois me poupa de um terceiro set especialmente desgastante.
Os pesquisadores mostram que, de
fato, em dias mais poluídos, há menos jogos com 3 sets. Quem ganha o primeiro
tem uma chance maior que o normal de ganhar o segundo.
Em outro trabalho, Haoming Liu,
Alberto Salvo e Jiaxiu He estudam a produtividade de trabalhadores na indústria
têxtil na China.
Nesses casos, há dados diários de desempenho porque os
trabalhadores são pagos por quanto produzem a cada dia.
Eles mostram que semanas de
poluição mais intensa têm um efeito significativo, ainda que pequeno, na
produtividade de pessoas saudáveis. Um dia ou uma semana de maior poluição não
parecem ter efeito.
A conclusão é que a poluição tem
efeitos diretos na produtividade de pessoas saudáveis mesmo no curto prazo.
Os
efeitos encontrados não são muito grandes, mas são um fator a mais na conta de
custos e benefícios de se controlar a poluição do ar.
BERNARDO GUIMARÃES - doutor em economia por Yale, foi professor da London
School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP