Como e com quem chegamos aqui?


Como e com quem chegamos aqui?

 O mapa cerebral do espaço ao nosso redor é cortesia da atividade sustentada do hipocampo

Uma das coisas mais fundamentais que sabemos sobre o mundo é onde nos encontramos agora: na cama onde adormecemos na noite anterior, na poltrona favorita da sala em casa, no canto do balcão para o café de todas as manhãs a caminho do trabalho.

Prova de quão básica é essa informação é que um dos sinais mais inequívocos de problema no cérebro —seja por isquemia, concussão ou início de demência— é desorientação: a perda momentânea do alfinete em nosso mapa interno que indica "você está aqui".

O mapa cerebral do espaço ao nosso redor é cortesia da atividade sustentada do hipocampo, no córtex cerebral. A cada momento, sua localização no mundo é indicada por quais "neurônios de lugar" estão ativos. 

Esses são neurônios que somente se manifestam quando você se encontra em um determinado ponto do mundo --ou quando você pensa naquele lugar e o visualiza--; portanto, a atividade de cada neurônio de lugar representa um local diferente ao seu redor.

Se não aparecemos instantaneamente em novos lugares, mas, sim, chegamos lá, é porque ao longo do trajeto sequências de neurônios de lugar se tornaram ativos uns após os outros, construindo um trajeto mental que entra para a memória e pode ser mentalmente revisitado mais tarde.

Há algumas décadas que a "função GPS" de localização e navegação espacial do hipocampo é conhecida, e valeu a três neurocientistas o Nobel de 2014. Mas o estudo do hipocampo por um número cada vez maior de pesquisadores com interesses diversos vem expandindo nossos conceitos sobre o que essa parte do cérebro faz.

Neurônios diferentes no hipocampo também representam pessoas diferentes, conforme vamos conhecendo gente nova: a mídia adorou a descoberta em 2005 do "neurônio da Jennifer Aniston" no hipocampo de um paciente fã da série "Friends". 

Os mesmos neurônios também representam a associação de quem-está-onde, memória, aliás, muito útil para quem serve mesas em restaurantes. 

Um belo trabalho na revista Nature capitaneado por Azahara Oliva, na Universidade Columbia, nos EUA, agora mostra que sequências desses neurônios que representam quem-está-onde são reativadas durante o sono, o que catapulta o hipocampo a um novo status também no aprendizado social.

E provavelmente não para por aí. O hipocampo é um circuito reentrante, como um carrossel, que nos permite juntar ideias, quaisquer elas sejam, em "conceitos" ou conhecimento. 

Conforme visitamos o mundo, aprendemos criando conceitos à medida que novos elementos sobem juntos ou se associam a outros já no carrossel do hipocampo.

Suzana Herculano-Houzel - bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA).

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