Emma Hope Allwood é editora do site
da revista Dazed, uma das mais influentes sobre moda, música, filmes, fotografia
e cultura contemporânea de modo geral. Há pouco mais de uma semana ela escreveu
um artigo-desabafo em que tenta capturar a ansiedade dos millennials, a
primeira geração que cresceu conectada à internet (o nome do artigo é “O Lado
Negro das Mídias Sociais”).
No texto, reclama que as mídias
sociais se tornaram um “mar de ilusões” e uma armadilha que ao mesmo tempo
define e sufoca os millennials.
Por exemplo, Allwood conta que, ao
conhecer uma pessoa nova, de repente viu-se preocupada com a forma como ela seria
vista se alguém tirasse uma foto dos dois juntos e publicasse no Instagram.
Esse tipo de preocupação mostra
como a ideia de “personal brand” (marca pessoal) e vida pessoal se fundiu,
criando uma armadilha praticamente inescapável para os millennials.
Estar online significa um esforço
permanente de criar uma marca pessoal: você é o que você posta. Fotos de
comida, do cachorro, dos amigos, dos encontros, tudo funciona ao mesmo tempo
como construção de imagem pessoal e prisão paralisante, trazendo ansiedade e
frustração.
Na China, a mesma geração ganhou o
apelido de “geração morango”: têm uma ótima aparência, mas são facilmente
esmagados por qualquer pressão.
Como alternativa à visão de
Allwood, há uma ótima pesquisa realizada pela Box1824, uma agência e consultoria
brasileira de tendências, que fez um trabalho de campo em sete estados dos EUA
com jovens de 18 a 24 anos.
A Box chama a geração nascida
depois dos millennials —a partir de 1998— de GenExit (geração saída).
Justamente por buscar saídas para essa armadilha.
Essa geração tem uma relação
diferente com as mídias sociais. Abandonam perfis públicos, preferindo contas
privadas. Preferem postagens efêmeras, que desaparecem depois de visualizadas,
a manter um registro perpétuo das suas atividades.
Nas palavras da Box: “Não se trata
apenas de abandonar as redes sociais, mas também uma geração que desconfia das
próprias estruturas sociais tradicionais”.
É uma geração mais realista, que
sabe que a possibilidade de ascensão social, de ter um emprego ou estabilidade
social, é pequena.
Dessa insegurança vem um apreço
pelo anonimato, pela construção de identidades fluidas, da possibilidade de
começar de novo a qualquer momento.
Nesse sentido, são mais resistentes
e aptos à mudança do que os millennials. Esse diagnóstico é corroborado pela
pesquisadora inglesa Noreena Hartz, que entrevistou 2.000 jovens de 14 a 21
anos no seu livro “Geração K” (K de vem de Katniss Everdeen, a heroína durona
dos filmes “Jogos Vorazes”).
Hartz constatou que é uma geração
que bebe menos, trabalha mais, usa menos drogas, faz menos sexo e tem
expectativas menores, compartilhando um estado de desilusão com o mundo,
inclusive com a internet e as redes sociais.
É claro que não há nenhum consenso
sobre como definir essa nova geração. Tantos esforços para entendê-la denotam
em si mesmo uma ansiedade das gerações mais velhas sobre o que esperar dos
jovens que crescem hiperconectados e com valores distintos dos nossos.
Ronaldo Lemos - advogado, diretor do Instituto
de Tecnologia e Sociedade do Rio e representante do MIT Media Lab.
Fonte: coluna jornal FSP