Aos quatro anos de idade,
Isadora Falcão ainda não sabe ler e escrever, mas isso não a impede de
manipular com destreza o novíssimo iPad Air que ganhou do pai, Flávio, no
último Dia das Crianças. Exclusivo da menina, o aparelho é usado por ela para
tirar fotos, assistir a desenhos no YouTube e brincar em aplicativos. E a
pequena carioca não é uma exceção: cada vez mais pais vêm buscando nas
tabuletas digitais um presente ideal para os seus filhos menores
O movimento, inclusive, já
foi percebido pelas fabricantes de eletrônicos, que esperam fazer sucesso neste
Natal com modelos voltados para os pequenos – alguns até licenciados com
personagens infantis. Mas se, por um lado, o contato precoce com a tecnologia
pode ser considerado positivo; por outro, exige atenção e limites para não
prejudicar o desenvolvimento dos pequenos.
O fenômeno já chegou até
mesmo à família real britânica. Em visita aos EUA nesta semana, o príncipe
William teria revelado a um executivo do ramo da tecnologia que seu filho,
George, de apenas um ano de idade, adora mexer em seu tablet. Aparentemente, os
joguinhos digitais são uma das maiores diversões do bebê real.
Para Flávio Falcão, a decisão
de presentear a filha com um iPad lhe pareceu natural, visto a facilidade de
uso que a menina sempre apresentou com o dispositivo utilizado por ele.
– Uso um tablet e ela sempre
mexeu muito bem nele. Como tinha medo dela quebrar o aparelho, achei melhor
comprar um só para ela. Hoje o tablet acaba sendo um facilitador para
entretê-la – explica Falcão, que é representante comercial. – Também acredito
que é algo que acaba complementando a sua educação, já que ela também faz uso
de programas com conteúdo didático.
Mercado
para os mais jovens
Deitada em sua cama, em meio
aos seus bichos de pelúcia, a pequena Isadora de fato demonstra uma habilidade
com o iPad que, à primeira vista, impressiona para a sua idade: já capaz de
reconhecer os ícones dos apps por conta própria, ela consegue se alternar entre
eles com desenvoltura, abrindo exatamente aqueles que lhes são pedidos e
mudando para outros sem maiores dificuldades.
Ainda que não existam dados
oficiais sobre a venda de tablets para crianças no Brasil, o analista de
pesquisas Pedro Hagge, da consultoria IDC, não tem dúvida de que a crescente
demanda infantil por esses aparelhos tem contribuído para as vultosas vendas
dos eletrônicos no país.
– Nosso último levantamento
mostra que a venda de tablets no Brasil atingiu 2,3 milhões de aparelhos no
terceiro trimestre desse ano, um aumento de 18% em relação ao mesmo período do
ano passado – afirma Hagge. – E, sem dúvida, parte desse volume deve-se à
demanda crescente de aparelhos para crianças. Não à toa o mercado está sendo
invadido pelos modelos infantis, que devem figurar em diversas listas de
presentes de final de ano.
De fato, é difícil ignorar a
multiplicação dos tablets voltados para crianças nas prateleiras das lojas.
Coloridos, revestidos por materiais especiais e baseados em personagens
populares do universo infantil, esses aparelhos têm sido a grande aposta de
diversas fabricantes de eletrônicos para datas como o Natal e o Dia das
Crianças.
Uma das pioneiras no
segmento, a brasileira TecToy, por exemplo, anunciou nesta semana o lançamento
de quatro novos modelos para os pequenos, baseados nos super-heróis Vingadores,
na popular animação Frozen, nas princesas da Disney e no icônico camundongo
Mickey.
– Lançamos nosso primeiro
tablet infantil há dois anos. No ano passado, trabalhamos com a linha da
Galinha Pintadinha, que tem feito muito sucesso. Agora, para o Natal, estamos
lançando esses quatro novos aparelhos – afirma o diretor-executivo da Tectoy, Sérgio
Bastos. – Nossa preocupação é que nossos produtos sejam tablets infantis, e não
brinquedos. Que sejam produtos de qualidade tecnológica.
Especialistas
preocupados
Companhias como DL, Samsung e
Positivo Informática também vêm lançando nos últimos anos seus modelos de
tablets infantis. Apesar de algumas características particulares, todos parecem
se adequar tanto às exigências de segurança dos pais, como à expectativa de
diversão dos filhos.
– O que os pais procuram
nesses produtos são: um tablet mais robusto, com proteção física contra queda;
proteção de conteúdo; poder controlar o tempo de uso para evitar excessos; e,
por último, um conteúdo adequado à criança: jogos e apps voltados para
alfabetização e entretenimento – afirma Maurício Roorda, vice-presidente de
marketing e produtos da Positivo Informática, que trabalha com o modelo
Positivo Kids.
O contato cada vez mais
precoce das crianças com a tecnologia, no entanto, preocupa especialistas, que
recomendam atenção aos pais na hora de impôr limites no uso dos dispositivos. É
o que afirma a psicóloga Sylvia Van Enck, do Grupo de Dependências Tecnológicas
do Hospital das Clínicas de São Paulo.
– Temos visto que, até por
ter uma tela maior, o tablet é um aparelho que os pais têm cedido aos filhos
desde muito cedo, muitas vezes o usando-o como se fosse uma babá eletrônica. É
preciso tomar cuidado com esse uso, até para não haver excessos por parte da
criança – afirma Sylvia. – O limite é fundamental. Não se trata de isolar a
criança da tecnologia, mas muito da criatividade e da sociabilidade dela só
pode ser desenvolvida a partir de outras atividades, longe das telas.
Pai de Peter Barros, de oito
anos e dono de um iPad, o tradutor Rodrigo diz que começou a sentir necessidade
de ficar mais atento ao uso que o filho faz da tecnologia.
– Como sou entusiasta de
tecnologia, ele sempre teve contato com ela desde cedo. No entanto, há alguns
meses comecei a notar que ele tem ficado mais ansioso, com a atenção mais
dispersa, sempre com o tablet na mão. Diante desses efeitos, conversei com ele
e temos moderado o uso do aparelho – afirma Rodrigo O problema não é o digital
em si, mas o excesso.
Thiago Jansen – repórter - editorias tecnologia / sociedade na
Infoglobo
Fonte: jornal Globo