Ciência do sono tenta descobrir por que é mais
difícil dormir bem com a idade
Falta
de repouso traz risco de hipertensão, ataques cardíacos, diabetes e depressão
Já se sabe que ter uma boa noite de sono se torna
mais difícil à medida que envelhecemos, mas a razão biológica por trás disso
ainda é pouco conhecida.
Uma equipe de cientistas americanos identificou
como o circuito do cérebro envolvido na regulação do sono e da vigília se
degrada com o tempo em camundongos, o que, segundo eles, abre caminho para
melhores medicamentos para humanos.
"Mais da metade das pessoas com 65 anos, ou
mais, reclama da qualidade do sono", disse à AFP Luis de Lecea, professor
da Universidade de Stanford e coautor de um estudo sobre a descoberta publicado na revista Science. (24/02/22).
As pesquisas mostraram que a falta de sono está
relacionada com um risco aumentado de vários problemas de saúde: de hipertensão
a ataques cardíacos, passando por diabetes, depressão e acúmulo de placas
cerebrais ligadas à doença de Alzheimer.
A insônia é tratada, frequentemente, com uma classe de medicamentos conhecidos como hipnóticos, como o
zolpidem, mas eles não funcionam muito bem na população idosa.
Para o novo estudo, De Lecea e seus colegas
decidiram investigar as hipocretinas, substâncias químicas cerebrais
importantes que são geradas apenas por um pequeno grupo de neurônios no
hipotálamo. Esta região do cérebro está localizada entre os olhos e os orelhas.
Dos bilhões de neurônios no cérebro, apenas
cerca de 50 mil produzem hipocretinas.
Em 1998, De Lecea e outros cientistas descobriram que as hipocretinas transmitem
sinais que desempenham um papel vital para estabilizar a vigília.
Como muitas espécies experimentam um sono fragmentado à medida
que envelhecem, existe a hipótese de que isso seja causado pelo mesmo mecanismo
em todos os mamíferos. Pesquisas anteriores mostraram que a degradação das
hipocretinas causa narcolepsia em humanos, cães e camundongos.
A equipe selecionou ratos jovens, com idades entre três e cinco
meses, e velhos, com idades entre 18 e 22 meses, e usou luz transportada por
fibra para estimular neurônios específicos. Gravaram os resultados, usando
técnicas de imagem.
Descobriram que os camundongos mais velhos perderam
aproximadamente 38% das hipocretinas, em comparação com os mais jovens.
Observou-se ainda que as hipocretinas restantes nos ratos mais velhos eram mais
estimuláveis e mais facilmente detonáveis, tornando os animais mais propensos a
acordar.
Isso pode ser devido à deterioração, ao longo do tempo, dos
"canais de potássio", que são importantes interruptores biológicos
para as funções de muitos tipos de células.
"Os neurônios tendem a ser mais ativos e a disparar mais e,
se disparam mais, você acorda com mais frequência", explicou De Lecea.
Identificar a via específica responsável pela perda
de sono pode levar a melhores medicamentos, argumentam Laura Jacobson e Daniel
Hoyer, do Instituto Florey de Neurociência e Saúde Mental, da Austrália, em
um artigo de opinião relacionado.
Os tratamentos atuais, como hipnóticos, "podem
induzir a doenças cognitivas e a quedas", e drogas que atacam um canal
específico podem funcionar melhor, acrescentaram.
Estes medicamentos precisarão ser testados em
ensaios clínicos, mas um remédio existente conhecido como retigabina,
atualmente usado para tratar a epilepsia e que se dirige para uma via similar,
pode ser promissor, de acordo com De Lecea.
ISSAM AHMED – jornalista, editor
AFP (Agence France-Press)