As janelas gradeadas e a solidão da minha primeira
internação em uma clínica
Clínicas de
reabilitação são importantes e ajudam muito, mas é preciso cautela e orientação
médica ao escolher o lugar
Você quer entrar ou conversar aqui junto com seus
pais? Quero entrar. Sozinha. Não aguentava mais ver a cara de decepção dos
dois.
Dei um abraço, todos choramos e entrei na clínica. Fui direto para a
enfermaria. Tire toda a roupa, garota.
Ninguém foi muito simpático. A moça
perguntou meu peso: está muito abaixo do que você disse.
Saí de lá de camisola. Todos os meus pertences
foram guardados para uma revista posterior. Entrei no quarto que me foi
designado e comecei a chorar.
Me vi sozinha sem ninguém para me amparar. As
janelas eram gradeadas e o chuveiro tinha um sensor para detectar a presença de
algum fio ou cordinha.
Do quarto, escutei uma voz doce cantando uma música
da Marisa Monte. Aquilo me intrigou e fui para a grade tentar descobrir de onde
vinha e quem cantava.
Nesse instante a porta se abriu e um enfermeiro entrou
trazendo uma trouxa com minhas coisas. Tinha toda minha roupa. Meu sapato
estava sem cadarço. Por precaução, né? Eles não querem que ninguém se mate.
Ele veio me
chamar porque ia ter início uma sessão do grupo de apoio.
Vesti a roupa que dava, peguei meu sapato com
esparadrapo no lugar do cadarço e fui. O moço estava apressado, a atividade já
ia começar.
Quando entrei, descobri de onde vinha o canto: era
uma menina loira que vou chamar de Márcia.
Ela me viu chorando e veio
cantarolando em volta de mim: Por que você está chorando? O que está
acontecendo? Depois percebi que ela estava em mania bipolar e não tinha ideia
de onde estava e muito menos o que estava fazendo ali.
Aceitei seus carinhos e
continuei a chorar.
Ao contrário de Márcia, eu sabia exatamente onde
estava e o que tinha acontecido comigo.
Eu só pensava na minha família e nas
pessoas que procuraram evitar que eu chegasse onde cheguei, a fim de não ser preciso entrar naquela clínica.
Mas
tudo foi em vão, eu estava na ativa total. Nada me parava, então não tinha
jeito.
Clínicas são sempre um desafio. Desde os
funcionários até os donos. É preciso muita empatia com a situação e nem sempre
isso acontece.
Acredito que por isso há tanta resistência dos familiares em
deixar os doentes ness es lugares. Eu mesma presenciei situações chatas que não
deveriam acontecer.
Nessa primeira internação, eu ainda tinha uma
reserva de dinheiro e podia pagar. Depois de uma semana, achei que estavam
tentando me trancafiar mais um pouco para poder lucrar, afinal as diárias
custam muito caro.
Fiquei furiosa, uma emoção que evidentemente uma paciente em
recuperação não deveria experimentar.
Só consegui sair de lá graças a um médico que me
deu um remédio chamado popularmente de antietanol. Com ele, é
impossível beber.
Na verdade até dá, mas a pessoa passa muito mal e muita gente
vai parar no hospital. Isso porque o remédio não metaboliza o álcool.
Aquela clínica já fechou. Não sei o que aconteceu
com o dono nem com os funcionários, mas me deu um alívio saber que aquele lugar
não existe mais.
Clínicas são importantes e ajudam muito, mas tem que ter
cautela e pedir orientação médica para que sejam boas, que realmente ajudem.
No
meu caso, depois dessa, fui internada mais cinco vezes e todas elas foram boas.
Ainda bem. Nada pior do que estar em um estado de
tristeza profunda e ainda cair nas mãos de pessoas que não te ajudam.
ALICE
S. –
blog Vida de Alcoólatra