Dados coletados diretamente do veículo
podem substituir radares e fiscais na hora de aplicar multas ao motorista.
Se
você acha que só a indústria da informação (música, audiovisual, imprensa etc.)
será revolucionada pela tecnologia, engana-se. O mundo físico, dos bens de
consumo e de produção, segue na mesma rota. A bola da vez é a indústria
automobilística. O carro é o novo "gadget": conectado, cheio de
aplicativos, capaz de analisar dados e, por que não dizer, de vigiar motoristas
e os lugares por onde passam. Tal qual o "smart phone", surge agora o
"smart carro".
Um
exemplo disso é o aplicativo Drive Like a Girl (dirija como uma garota). A
empresa constatou que mulheres jovens dirigem de forma bem mais segura do que
os homens. Com isso, desenvolveu um curioso modelo: se você dirige "como
uma menina", ganha desconto no valor do seguro anual.
A
empresa instala uma "caixa-preta", que é conectada à internet, no
carro do usuário. Ela monitora todos os deslocamentos com precisão. Se o
motorista acelera ou freia suavemente, se respeita os limites de velocidade, se
não faz conversões proibidas e assim por diante, acumula descontos no seguro.
Além disso, se ocorrer um acidente, a "caixa-preta" liga
automaticamente para a emergência e pede o socorro.
Esse
sistema é hoje facultativo. O motorista instala se quiser. Mas, nos próximos
anos, vai se tornar padrão. E passa a ser de interesse não só do setor privado,
como é hoje, mas também do setor público.
Nada
impediria a criação de um desconto no IPVA anual para motoristas que dirigissem
com segurança ao longo do ano. Esse seria um incentivo econômico para a redução
da violência no trânsito: premiar a condução responsável.
Mas
há também o outro lado: a vigilância. Em vez de "prêmios", pode haver
monitoramento e aplicação automática de penalidades. Hoje muitos motoristas
ficam incomodados com os "pardais" que monitoram velocidade, mas em
breve as multas poderão ser aplicadas a partir do próprio registro do
deslocamento do veículo captado pela internet. Os radares e fiscais de trânsito
ficariam para trás, já que dá para saber com precisão a velocidade e a
trajetória e também se alguma lei de trânsito foi violada durante a condução do
veículo.
Essas
informações já são coletadas, processadas e analisadas. Boa parte dos
motoristas em São Paulo usa o Waze ou aplicativos similares. Ao fazer isso,
dados detalhados sobre o deslocamento do veículo são enviadas para o app.
Em
tese, a partir deles, já seria possível implementar diferentes convênios
premiais para quem dirige bem ou para punir quem guia mal. Mas ninguém cruzou
essa linha ainda, até porque há uma discussão relevante sobre a privacidade
desses dados.
Não
são só as indústrias que se transformam com a tecnologia. É o próprio Estado,
que vê sua capacidade de regular e de tributar alterada profundamente. Se isso
estará em sintonia ou não com o interesse público, já é outra conversa.
Ronaldo Lemos - advogado e diretor do Instituto
de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro ronaldo@itsrio.org
Fonte:
jornal FSP