Quando universidades destroem
estudantes
Abuso de poder no ambiente universitário é algo recorrente.
Ir para a universidade pode significar correr
maiores riscos de ter crises de ansiedade e profundos quadros depressivos.
A preocupação com dinheiro e
desempenho acadêmico é somente um dos desafios enfrentados diariamente por
milhares de estudantes.
Em diversos casos, o próprio ambiente universitário se
torna um dos maiores algozes para o futuro de jovens promissores.
O sistema acadêmico tem uma
estrutura hierárquica rígida. Na base, tem-se os estudantes e pesquisadores no
início da carreira.
Sentados no topo ficam os professores com mais anos de
rodagem e os pesquisadores com mais publicações. Muitos deles, homens brancos
de origens bem privilegiadas.
Bons professores e orientadores costumam ajudar os estudantes e
jovens pesquisadores a avançarem no desenvolvimento de seus conhecimentos.
Eles
contribuem para introduzi-los nos círculos acadêmicos e ultrapassar os
estrangulamentos da hierarquia universitária. Infelizmente, em vários
departamentos, eles não são a maioria.
Casos de abuso de poder no meio acadêmico são corriqueiros.
Concursos para amigos, má liderança, intimidação, racismo, sexismo e até
assédio sexual não são incomuns em um ambiente que deveria ser referência.
Muitos reproduzem os comportamentos abusivos que aprenderam
quando estudantes.
É um ciclo vicioso que acaba com mentes talentosas e impacta
negativamente o progresso científico.
Os danos são duradouros tanto para os
jovens quanto para as instituições.
Vários
acadêmicos podem ser gênios na geração de novo conhecimento, mas são péssimos
líderes. Excelência científica não é igual à capacidade de gerir e ensinar
eficazmente outras pessoas.
Não raramente, também falta a muitos um pouco de
sensibilidade para tratar outros seres humanos.
Além disso, em certos casos, há pouca
cooperação e muita competição. Isso contribui para as longas jornadas de
trabalho e para uma tendência de não tirar férias.
A conjunção entre incerteza
e um ambiente universitário problemático leva a um estresse contínuo, que pode
gerar um efeito avassalador sobre a concentração e aprendizagem.
Por sua vez, o estresse crônico entorpece as emoções e faz com
que muitos parem de funcionar corretamente.
As marcas da aflição podem deixar
sequelas por toda a vida.
Os efeitos colaterais da ausência de uma cultura de
bem-estar dentro de vários departamentos universitários são expressivos. Tal
ambiente pode ser hostil até para os filhos da elite, embora seja mais
acentuado para as minorias.
Grande parte não compreende a dimensão da competição desleal a
qual são submetidos e não tem consciência das microagressões que sofrem
sistematicamente.
Assim, acabam acreditando que os resultados negativos são
frutos de sua competência.
Alguns desistem da carreira acadêmica ou de tentar ir além em
suas pesquisas. O país como um todo perde com a destruição de capital humano em
um lugar que deveria ampliá-lo.
MICHAEL FRANÇA - ciclista, doutor em teoria econômica pela Universidade de
São Paulo; foi pesquisador visitante na Universidade Columbia e é pesquisador
do Insper.