Passados mais de cem anos da publicação da teoria da relatividade geral, de Albert Einstein, suas previsões mais loucas
continuam a ser confirmadas experimentalmente. Depois de buracos negros, lentes
gravitacionais e tantas outras, detectamos, em 2015, ondas gravitacionais. O êxito da mecânica quântica não é menor. Embora ela
tenha como pressuposto um universo ainda mais bizarro que o da relatividade, no
qual um gato pode estar vivo e morto ao mesmo tempo, todas as suas previsões se
mostraram assustadoramente precisas.
O sucesso das duas teorias é tamanho que os físicos
têm motivos de sobra para estar orgulhosos. O único problema é que a
relatividade geral e a mecânica quântica são em tese incompatíveis. O grande
desafio da física teórica nas últimas décadas tem sido o de buscar uma
conciliação.
Tentativas incluem a teoria das cordas, teoria M,
teoria de tudo, gravidade quântica em loop, cada uma das quais pode aparecer
com diferentes nuances. Em alguns casos, elas são tão abstratas que não
conseguimos nem mesmo imaginar um roteiro pelo qual elas poderiam ser falseadas
empiricamente.
Faço essa longa introdução para elogiar "A
Realidade Não É o Que Parece", o belo livro de Carlo Rovelli,
que consegue explicar a relatividade e a mecânica quântica de forma didática e
até certo ponto lírica, recorrendo a filósofos e poetas, e ainda oferecer a sua
"solução". Rovelli é um defensor da gravidade quântica (as disputas
entre as diferentes escolas tendem a ser ferozes).
O preço a pagar não é pequeno. Na visão de Rovelli,
as duas teorias tornam-se compatíveis se sacrificarmos a noção de tempo, de
infinitude e imaginarmos um espaço granular que deixa de ser um contínuo no
qual as coisas "acontecem" para aproximar-se de uma interação entre
campos quânticos. O próprio Universo se torna oscilante, e o Big Bang dá lugar
ao Big Bounce (grande rebote).
Hélio Schwartsman - bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora
Contexto) em 2016.
Fonte:
coluna jornal FSP