Muitos pais reproduzem práticas
antigas como castigos físicos
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"Quero dar a meu filho tudo o que não
tive". Essa frase é dita por muitos pais. Muitos deles referem-se a bens
materiais, regalias, conforto e outros benefícios. Já outros, em número menor,
buscam estar mais presentes na vida do filho, ensinar valores e princípios que,
no entender deles, faltaram na própria infância. Todos querem oferecer aos
filhos uma vida melhor do que a que tiveram.
Entretanto, essa lógica parece não se aplicar
quando os filhos desobedecem, fazem o que os pais já avisaram para não fazer,
vão mal na escola, abusam dos horários estipulados, não cumprem as pequenas
obrigações que lhes são impostas, desrespeitam pais e outros adultos da família
etc.
Quando algo desse tipo ocorre, a primeira ideia que
ocorre aos pais é o que eles já experimentaram quando foram crianças: o
castigo. E, em geral, o castigo surge como punição, ou seja, algo que provoca
sofrimento à criança ou ao jovem. Os castigos que ouço pais contarem que
aplicam não variam muito: vão das palmadas e safanões ao ato de retirar do
filho algo de que ele gosta muito.
Falemos dos castigos físicos. Não há uma única vez
em que, ao conversar com pais e explicar os motivos que temos para não aplicar
castigos físicos, eu não ouça algo do tipo: "Eu apanhei na infância e esse
fato não me impediu de crescer bem". Aí eu me pergunto: onde fica a lógica
da oferta de uma vida melhor aos filhos nessa hora?
É inegável: castigo físico não combina com vida
boa. Por quê? Porque provoca sofrimento físico, moral e emocional em crianças e
adolescentes.
Bater em uma criança ensina o quê a ela? Que a
violência física é um modo aceitável de relacionamento interpessoal, que o
autocontrole não é algo importante, que a autoridade pode ser imposta dessa
maneira etc. Esses não são bons ensinamentos para quem pretende colaborar tanto
com a vida pessoal do filho quanto com a possibilidade de ele melhorar o mundo
no futuro, certo?
Retirar temporariamente da vida do filho coisas que
ele faz com gosto também não combina com vida boa: provoca raiva, mágoa e
sofrimento, por exemplo, mas ensinar, não ensina nada.
Muitos pais insistem na ideia de aplicar o castigo
como ato educativo. Aliás, parece ser sempre a primeira estratégia a surgir
quando há encrenca com os filhos.
Que fique claro: não sou –nenhum profissional é–
contrária ao castigo, desde que ele tenha conexão com o comportamento do filho,
que não seja exagerado, que respeite a etapa de vida da criança e,
principalmente, que não desrespeite a criança ou o jovem. Mas, em geral, esses
princípios nem sempre são considerados quando alguns pais aplicam os castigos
em seus filhos.
O excesso de regras aos mais novos leva à desobediência,
e a ausência de tutela adulta leva a transgressões. Considerando isso, quero
deixar a você, caro leitor, um trecho de Fernando Savater que está no livro
"O Valor de Educar".
"(...) Não são as crianças que se rebelam
contra a autoridade educacional, são os adultos que as induzem a se rebelar,
precedendo-as nessa rebelião que os desvencilha da tarefa de lhes oferecer
apoio sólido, cordial mas firme, paciente e complexo, que as ajudará a crescer
adequadamente no sentido da liberdade adulta."
Rosely Sayão - Psicóloga e consultora em educação, fala
sobre as principais dificuldades vividas pela família e pela escola no ato de
educar.