Temos
que ser muito cuidadosos ao falar sobre a crise (ou a não existência dela). Por
exemplo, na semana passada, um assunto que gerou bastante polêmica na mídia e
nas redes sociais foi a declaração, por parte de um conhecido empresário
brasileiro, de que “a crise no Brasil é política e não econômica”.
O que
ele quis dizer, entre outras coisas, é que oportunidades estão começando a
surgir e que, a despeito do caos que estamos vivenciando, a situação atual não
é o “fim do mundo”. Inclusive eu explorei a questão das oportunidades no artigo
“Cash is King”.
O
raciocínio dele está correto, porém a forma como o argumento foi apresentado
foi infeliz e o timing não poderia ser pior. Considerando a
grande quantidade de pessoas que está perdendo seus empregos e tendo que fechar
seus negócios por conta da “crise não-econômica” , não é surpresa que ele tenha
sido duramente criticado e atacado (procure nos grandes portais de notícias e
dê uma conferida nas áreas de comentários dos leitores).
Considerando as dificuldades financeiras e as angústias que
grande parte da população brasileira está enfrentando no momento, a declaração
do empresário foi, no mínimo, insensível…
Mas, se deixarmos um pouco de lado essa questão “emocional” e
procurarmos analisar a declaração com mais objetividade, talvez nosso distinto
empresário não esteja, de fato, tão errado.
Nós não
estamos em crise
Esse período de crescimento que o Brasil vivenciou, a partir do
início do Século XXI, foi uma espécie de “surto eufórico econômico” de curta
duração (do ponto de vista do desenvolvimento econômico, um período de dez a
quinze anos é um “piscar de olhos”). As pessoas tiveram acesso ao crédito fácil
(porém jamais barato) e tiveram uma falsa sensação de segurança motivada pelo
“pleno emprego”. Consumiram, se endividaram e desfrutaram os prazeres do consumo.
Quem entrou no mercado de trabalho neste período deve acreditar
que o Brasil sempre foi essa “festa do caqui”, onde as empresas contratam,
pagam bem e se preocupam obsessivamente com coisas como “apagão da mão de obra”
e “retenção de talentos”. Foi muito fácil arrumar emprego nesse período e
muitas iniciativas empreendedoras tiveram sucesso, graças ao consumo aquecido.
Porém, quem é um pouco mais velho e vivenciou a economia (e o
mercado de trabalho) nos anos 80 e 90 sabe que a história não é bem
assim… O Brasil é (e sempre foi) um país extremamente difícil para se
fazer negócios e onde o desemprego sempre foi uma das maiores fontes de medo e
insegurança da população.
Quem era “vivo” nessa época deve se lembrar do que a gente já
enfrentou: Hiperinflação, moratória da dívida externa, confisco da poupança…
Perto do que já passamos, a situação atual é “fichinha”. E, de alguma forma,
sobrevivemos a isso.
Então, o ponto é o seguinte: nós não estamos em crise. Estamos
apenas voltando a ser aquilo que sempre fomos: Um país complicado, com enorme
desigualdade social, com péssimos indicadores sócio-econômico-educacionais,
hostil aos negócios, violento e onde o desemprego está sempre presente.
Como dizia o finado Tom Jobim, “o Brasil não é para
principiantes”.
Para nós, brasileiros, não existe crise – isso que chamamos de
“crise” já virou uma situação permanente. O que existe é um estado crônico de
bagunça, corrupção, fragilidade e mediocridade econômica. Tivemos um pequeno
alívio de alguns anos, mas já estamos voltando ao nosso “normal”.
André Massaro -
escritor, palestrante, consultor financeiro.
Fonte: http://exame.abril.com.br/