Quanto mais amigos eu 'faço', mais me distancio das pessoas que
são realmente importantes
Hoje comecei um teste. Decidi experimentar ficar sem o Facebook
no meu celular. Se der certo, vou estender o experimento ao iPad e, quem sabe,
também ao computador.
Impetuosa, botei o dedo sobre o ícone do aplicativo e esperei
ele começar a tremelicar, como é a regra no iPhone. Ele tremelicou. Respirei
fundo e apertei o pequeno xis, que simboliza o apagar. Veio o alerta: se apagar
o aplicativo, todos os dados serão apagados também.
Que ameaça! Sei bem que não basta apagar o aplicativo para todos
os dados pessoais sumirem do Facebook. Isto requer outro tipo de iniciativa.
Então por que mentem? O Facebook vai dizer que é coisa da Apple. A Apple pode
responder que trabalha com "padrões de mercado". E a gente que
reclame nas redes sociais!
Suponho que esse tipo de ameaça seja apenas um dos maus hábitos
da indústria de aplicativos (ou "'éps", da abreviatura em inglês
"apps", como os mais pedantes se referem a "software" hoje
em dia). Nessa indústria, o número de "usuários" valoriza um negócio,
ainda que os "usuários" sejam "inativos", o que a empresa
só vai informar se não tiver como ocultar. Isto me lembra Rubens Ricupero,
aquele ministro da Fazenda que, sem saber que o sinal já estava aberto para
antenas parabólicas, disse à TV Globo: "O que é bom a gente fatura; o que
é ruim, esconde-se!"
O fato é que sumi com o aplicativo do Facebook. Senti uma
sensação boa. Aproveitei o entusiasmo e apaguei também os aplicativos do LinkedIn,
do Lulu (que instalei para testar e achei simplesmente péssimo) e até do Viber
(algo entre o Skype e o WhatsApp). Combinei comigo mesma que vou observar o que
acontecerá com as minhas mãos da próxima vez que ficar à toa com o telefone na
mão. Será que vou tremer? Será que entrarei na App Store e baixarei tudo de
novo? Ou vou me esquecer aos poucos dessa mania de ficar fazendo a ronda na
internet, checando as atualizações das redes e esperando reações a cada coisa
que publico, nem sei bem por quê?
Sério mesmo: o Facebook é a maior perda de tempo que conheci na
vida. Quanto mais amigos eu "faço", mais me distancio das pessoas que
são realmente importantes para mim. A fatalidade é que sempre perco informações
de quem me importa no meio da balbúrdia da multidão a que estou conectada.
Quando fiz essa observação outro dia, o engenheiro Luís Villani
comentou que eu havia descoberto o "segredo de Tostines". Evocava a
memória de uma velha propaganda de televisão, que explorou o seguinte mote: o
biscoito vende mais porque é fresquinho ou é fresquinho porque vende mais? O
Facebook é relevante porque estamos conectados a pessoas relevantes ou o
Facebook é medíocre porque nossos "amigos" são medíocres? Ou uma rede
social teria a capacidade de deixar as pessoas medíocres?
Será que nós, brasileiros, parecemos tão "sociáveis"
porque achamos rude não aceitar "pedidos de amizade"? Será que
supervalorizamos nossa imagem "popular", por isso colecionamos
conexões como se fossem figurinhas de um álbum da Copa? Vamos fazer o quê?
Começar de novo? E por que não?
Marion Streckerk - jornalista, fotógrafa e uma das pioneiras da internet no
Brasil, integrou o grupo de fundou o UOL e dirigiu sua equipe de conteúdo por
quase 15 anos, até fevereiro de 2011.
Fonte: caderno tec do jornal Folha de São Paulo