Quem
investe olhando pelo retrovisor resgata quando a rentabilidade decepciona
A indústria de fundos de investimento sofreu resgate
líquido de R$ 25,8 bilhões no mês de junho. Os fundos de renda fixa
responderam por R$ 15,9 bilhões desse resgate em massa, reação imediata de
investidores ressabiados com a rentabilidade negativa em maio e pífia em junho,
inferior à da poupança. Cotistas de fundos multimercado e de ações resgataram a
diferença. Dois fatores podem explicar esse movimento: 1) decisão (equivocada)
de investir com base em rentabilidade passada; e 2) desconhecimento do produto,
de sua política de investimento e do impacto das oscilações na taxa de juros de
longo prazo no valor das cotas.
1. Investidor analisa a qualidade
da decisão pelo resultado obtido por um investimento no passado, sem considerar
os riscos presentes e futuros. Por que está errado: ganho passado não significa
ganho futuro. O investidor pode tomar como referência um desempenho fora da
curva da aplicação JOHANNES EISELE/AFP/AFP
Principais erros dos investidores
Estudo
do Itaú Asset Management aponta equívocos comuns de quem vai investir
Além
de prejudicar o investidor que resgata a aplicação temendo ampliar as perdas, a
onda de retiradas complica a vida dos gestores dos fundos. Quando alocam parte
do patrimônio em ativos de taxa prefixada ou atrelados a índices de inflação,
por exemplo, os gestores têm expectativa de queda na taxa de juros de longo
prazo e valorização dos ativos, para proporcionar aos investidores a rentabilidade
esperada.
A expectativa de redução dos juros pode estar correta,
mas raramente ocorre imediatamente após a compra. Fatores inesperados podem
atrasar a trajetória de queda nos juros. É preciso paciência para colher os
frutos da estratégia, sendo necessário manter a posição em ativos de taxa
prefixada que se valorizam e recuperam eventuais perdas quando e se a
expectativa de queda se confirma.
Ocorre que, perante uma onda de pedidos de resgate dessa
proporção, os gestores são obrigados a vender as posições do fundo, gerando
caixa suficiente para pagar os resgates dos cotistas. Ao fazer isso,
comprometem a estratégia, em maior ou menor escala, impondo aos cotistas que
ficam a incerteza de ganhos no momento em que a esperada queda dos juros
ocorrer.
A decisão de aderir a fundo mais complexo baseado apenas
na boa rentabilidade de meses anteriores não é saudável nem para o investidor
nem para a indústria. O fluxo de captação líquida (aplicações superiores ao
resgates) observado em janeiro sugere a possibilidade de que o procedimento de
suitability (adequação) talvez não tenha sido conduzido corretamente pelos
agentes comerciais e, também, pelos próprios investidores.
Em janeiro, os fundos de renda fixa tiveram uma captação
líquida de R$ 13,4 bilhões. Investidores conservadores saíram de aplicações de
taxa pós-fixada, como poupança, CDBs e fundos DI, em busca de melhor retorno,
sem o entendimento do novo produto escolhido. Tudo indica que a decisão de
investir foi baseada na crença de que a boa rentabilidade do passado se
repetiria nos próximos meses. Não é assim que funciona.
A rentabilidade dessas carteiras depende muito da
política de investimento de cada uma, da estratégia implementada pelos
gestores, do prazo médio dos ativos que compõem cada carteira, da concentração
maior ou menor em ativos de taxa prefixada —seja no mercado à vista, seja por
meio de contratos de derivativos— e do perfil de cotistas de cada fundo.
Fundos com cotistas qualificados, de perfil de risco
moderado ou agressivo, tendem a sofrer menos pedidos de resgate porque, em
tese, os cotistas têm maior tolerância a perdas potenciais.
Refiro-me à perda como potencial porque ela só se
concretiza quando o cotista resgata suas cotas, como fizeram milhares de
investidores no mês de junho. Torço para que você não esteja entre eles e tome
decisões de investimento olhando para o futuro, e não para o passado.
Marcia Dessen - planejadora financeira CFP (“Certified Financial
Planner”), autora de “Finanças Pessoais: O Que Fazer com Meu Dinheiro”.
Fonte: coluna jornal FSP