Talentos perdidos


Talentos perdidos

Efeitos da pandemia vão além da saúde e atingem o futuro dos alunos brasileiros.

Estudo do Banco Mundial lançado em fevereiro aponta que governos precisam implementar políticas públicas para mitigar os efeitos negativos da pandemia na população mais jovem.

Isso porque a crise sanitária afetou o Índice de Capital Humano (ICH), que estima a produtividade futura de uma criança, considerando o que ela alcançaria com boa educação e assistência médica.

Em entrevista publicada pela Folha neste mês, o economista-chefe para Desenvolvimento Humano do órgão, Norbert Schady, disse que "choques como a pandemia podem desviar indivíduos de seu curso, reduzindo os níveis de acumulação de capital humano".

Ou seja, com o fechamento de escolas e a precarização da aprendizagem, aumentam os riscos de alunos dos ensinos fundamental e médio terem menores níveis de escolaridade e renda quando adultos.

Quanto mais jovem a criança, maior o impacto. 

No Brasil, a perda calculada de aprendizado de estudantes do 5º ano foi equivalente ao triplo ou mais da verificada entre os dos 9º e 12º anos —na comparação com grupos anteriores nessas mesmas faixas que não foram expostos à pandemia.

Ademais, o problema é mais grave em países e nos estratos sociais mais pobres. 

Em Bangladesh, constatou-se que as perdas no desenvolvimento cognitivo, linguístico e motor foram muito maiores em crianças cujas mães não tinham o ensino primário completo.

Outro estudo do Banco Mundial, específico sobre o Brasil, mostra que nosso ICH caiu de 0,6 em 2019 para 0,54 em 2021 —mesmo índice de 2009. Com isso, em vez de o brasileiro nascido em 2019 alcançar 60% do seu potencial aos 18 anos, ele alcançará 54%.

O Brasil foi um dos países que amargaram maior déficit de ensino presencial. Entre março de 2020 e março de 2022, uma criança em idade escolar perdeu na média global 37 semanas desse tipo de ensino. 

Na Europa e Ásia central, foram 14 semanas; aqui, 60.

O processo de aquisição de capital humano é cumulativo: o que ocorre na infância gera impactos na fase adulta e nas futuras gerações.

Quanto menor o ICH, menos conhecimento, inovação, produtividade e renda. 

É preciso que o Brasil saia desse ciclo vicioso com planos de recuperação e aceleração do aprendizado nos níveis federal, estadual e municipal. Não se pode continuar a embotar talentos em seu nascedouro.

Editorial 10/08/23 – jornal Folha de São Paulo

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