Muito se discute como o Brasil chegou à mais profunda recessão
de sua História e o que teremos de fazer para sairmos dela. Já tratei das razões econômicas e políticas da crise. Desta vez, quero falar de uma razão estrutural
e suas implicações: o atual vácuo de lideranças no país.
Independentemente
da gravidade dos erros de política econômica do governo Dilma desde seu
primeiro mandato e da amplitude do escândalo de corrupção que vem emergindo com
a Operação Lava-Jato, a crise econômica jamais teria tomado as proporções que
tomou, não fosse a total incapacidade de liderança da Presidente Dilma. Sua
personalidade excessivamente conflitiva e centralizadora resultou em uma equipe
de governo de baixa qualidade e em péssimas relações com o Congresso. Além
disso, a falta de uma visão, uma proposta e uma agenda de reformas para
melhorar o país que ocupasse as discussões no Congresso, levou o Congresso a
definir sua própria pauta, antagônica aos interesses do governo.
Ainda assim, mesmo a
incapacidade de liderança da atual Presidente é apenas uma parte da explicação
da gravidade e profundidade da crise. O vácuo de liderança no Brasil é
generalizado. Ainda na política, a chegada de Dilma à Presidência já foi um
subproduto deste vácuo de lideranças. Após José Dirceu e Antônio Palocci terem
sido queimados por denúncias de corrupção, não restou ao PT e a Lula outra
opção. A ausência de lideranças fortes na oposição, por sua vez, permitiu sua
eleição e reeleição, apesar da falta de carisma de Dilma e do desempenho
econômico pífio de seu primeiro mandato.
Mais recentemente, à medida que
as denúncias de corrupção se avolumam e aprofundam, os principais líderes da
oposição - em alguns casos apesar de dezenas de milhões de votos na última
eleição - se acovardam. Na melhor das hipóteses, o acovardamento é consequência
de cálculos político-eleitorais pessoais, independentemente das consequências
negativas que a inação e paralisia trouxeram à vida de todos os brasileiros. Na
pior hipótese, o acovardamento é consequência de medo e causado por rabos
presos.
Se o
quadro é grave no Executivo, no Legislativo ele não é melhor. Metade de nossos
congressistas está sendo investigada por crimes eleitorais, corrupção,
homicídio e outros crimes. Não surpreende a atual aversão generalizada a
políticos. O que surpreende é que - talvez com a exceção de Joaquim
Barbosa e Sergio Moro - não haja surgido outras lideranças ocupando o vácuo
deixado pelos políticos. Infelizmente, a falta de lideranças atinge toda a
sociedade brasileira. Assim como na política, no mundo empresarial houve uma
transição geracional em que líderes fortes e carismáticos ficaram para
trás sem o surgimento de novas figuras da mesma envergadura. No caso das
lideranças empresariais, houve um agravante.
Desde que o PT assumiu o poder,
há mais de 13 anos, o governo estendeu seus tentáculos sobre toda a economia,
desvirtuando a relação público-privado e a própria competição entre as
empresas. Para o sucesso das empresas, relações privilegiadas com o governo
tornaram-se mais importantes do que eficiência, inovação ou bons produtos,
serviços e atendimento. Ícones empresariais que surgiram neste ambiente
provaram ter pés de barro. Talvez ainda mais grave, através de pseudopolíticas
de desenvolvimento que distribuíam supostas benesses para algumas regiões e
setores - como impostos temporariamente reduzidos ou crédito subsidiado do
BNDES - e a ameaça de retirar tais benesses, o governo impediu a formação de
uma liderança empresarial unida e combativa.
A política não aceita vácuo. Na História brasileira, vácuos de
liderança e consequentes desacelerações econômicas agudas sempre resultaram em
transições políticas e econômicas significativas. No início da década de 30,
eles levaram à emergência de Getúlio Vargas e do Estado Novo; em meados dos
anos 40, à 4ª República; em meados da década de 60, ao Golpe Militar; em meados
dos anos 80, à redemocratização e no início da década de 90, ao impeachment de
Collor. É improvável que desta vez seja diferente. Teremos mudanças
significativas. Recentemente, plantamos sementes de onde podeflorescer um país melhor, mas isto acontecer ou não dependerá de
nossa capacidade de regar e cuidar destas sementes. Cabe a nós exigir e
construir a transição para um país melhor.
Esta questão me parece tão importante, que
estou lançando um livro, Depois da Tempestade, para tratá-la com a atenção que
merece.
Mais do
que nomes de potenciais salvadores da Pátria, que - de uma forma ou de outra,
mais cedo ou mais tarde - acabam aparecendo nestas situações, deveríamos
discutir as qualidades que nossos líderes deveriam ter.
Não
precisamos fomentar boas lideranças só a nível federal, mas também em cada
Estado, Município e empresa. Como garantir que nossa empresa não entre em crise
quando um líder forte se vai, como aconteceu com o país? Como formar líderes
com as qualidades que julgamos importantes? Como nos tonarmos estes líderes em
nossas próprias áreas de atuação? Eu jamais conseguiria esgotar estas questões
neste artigo. Há quatro anos dedico-me a estudá-las e, mais recentemente, venho
desenvolvendo alguns cursos para tratá-las com a profundidade que merecem e
tentar colaborar para a formação de bons líderes empresariais.
Mais do
que nada, cabe a cada um de nós responder quais deveriam ser as qualidades
fundamentais de nossos líderes. Para começar a discussão, eis três que, em
minha opinião, não podem faltar:
1. -
Valores éticos fortes – a
gravidade da atual crise de algumas grandes empresas, líderes políticos e
líderes empresariais fala por si só. Nas palavras de Warren Buffett, "são
necessários 20 anos para construir uma reputação e cinco minutos para
destruí-la".
2. -
Paixão e propósito fortes –
líderes que deixam marcas em empresas, comunidades, países ou em todo o mundo
sempre têm propósitos fortes e uma paixão inabalável para transformar seus
propósitos em realidade. Não construiremos um país ou empresas que melhorem a
vida das pessoas sem pessoas que acreditem que estas são causas pelas quais
vale a pena lutar.
3. -
Visão de longo prazo – Sem
um objetivo claro de onde queremos chegar, ficamos à mercê dos ventos e tomamos
decisões que, sem nos darmos conta, nos levam em direção ao precipício. Em
2014, o único objetivo de Dilma era vencer as eleições, mesmo gerando
desequilíbrios nas contas externas, nas contas públicas e na inflação que
acabaram sendo os gatilhos da crise atual e destruindo seu partido e qualquer
legado de seu primeiro mandato. Valeu a pena? Como melhorar a educação, a
infraestrutura, o ambiente de negócios ou garantir a sustentabilidade da
Previdência olhando só para o próximo ano, ao invés de para a próxima geração?
E para
você, quais qualidades os líderes do país e da sua empresa não podem deixar de
ter?
Ricardo Amorim -
apresentador do ManhattanConnection da Globonews,
presidente da Ricam Consultoria.