O
paulistano tem uma relação de amor, temor e horror com a frota de motoboys que
percorre a cidade. Amor, mesmo que não reconhecido ou inconfesso, pelo alívio
que suas cargas trazem a um trânsito superlotado. Temor pelos riscos que os
autodenominados "cachorros loucos" trazem com sua condução
imprudente, ameaçando pedestres e retrovisores. Horror pela intensidade e pelo
volume dos acidentes de que muitos são vítimas, quando não morrem na contramão,
atrapalhando o tráfego.
Uma nova tecnologia deverá, nos próximos anos, automatizar os
ares das cidades, agilizando entregas e transformando a profissão de motoboy em
curiosidade remota, similar ao condutor de riquixá.
Veículos aéreos autônomos, ou drones, já existem há algum tempo,
e vêm ocupando a mídia com notícias de ataques remotos a populações de países
distantes. Mas, como a internet, o GPS e outras tecnologias militares que
migraram para a arena civil, esses aviõezinhos independentes estão cada vez
mais baratos, eficientes e populares. Já é possível encontrá-los em ação no
acompanhamento de rebanhos em fazendas, monitoração de reservas florestais e
auxílio em situações de risco. Até fotógrafos andam brincando com esses
aviõezinhos para conseguir ângulos incomuns.
Não tardará para que avanços na tecnologia transformem o céu em
arena de inovação. Os desafios ainda são grandes, tanto nos aparelhos quanto no
espaço em que trafegam, mas as ideias são promissoras.
Surpreendentemente, uma das empresas com iniciativas mais
concretas na área não é um dos gigantes em novidades tecnológicas, uma empresa
de robôs ou companhia aérea, mas a Amazon. No final do ano passado, a megaloja
digital anunciou planos para começar a usá-los em 2015 para acelerar suas
entregas.
A princípio a notícia soaria como golpe publicitário se UPS e
FedEx não tivessem pesquisas na mesma linha. Mas enquanto as empresas de
courier buscam o transporte de grandes volumes de pacotes entre seus armazéns,
a Amazon quer utilizá-los para entregar pacotes para o destinatário final.
O motivo é claro: no mundo inteiro as compras on-line vêm
crescendo em um volume não acompanhado pela capacidade na entrega. Descobrir
uma forma segura e ágil de entregar mercadorias se tornou uma vantagem
estratégica.
Da mesma forma que impressoras 3D podem substituir fábricas em
regiões distantes para poupar custos de logística, pequenos caminhões de
entrega podem hospedar meia dúzia de aviõezinhos e despachá-los,
automaticamente, do meio do trânsito, quando estiverem próximos de seus
destinos. Feita a entrega, eles retornariam para pegar o próximo pacote.
Mas isso por enquanto é só especulação. A empresa não é muito
transparente em suas práticas e essa forma de entrega requer a criação de
algoritmos complexos de otimização de rota, correção de erros e aviso em caso
de avaria ou furto.
De qualquer forma, a tecnologia é conhecida e o progresso é inevitável.
Drones comerciais vieram para ficar e deverão ser empregados nas mais diversas
áreas.
Isso, é claro, traz novas complicações. A principal delas é a de
segurança. Mas também há riscos de privacidade e de ocupação do espaço aéreo.
Sem contar com eventuais questões de poluição sonora e atmosférica que tornem
esse novo zumbido mais ameaçador do que a velha conhecida --e tão detestada--
buzininha das motos.
Luli Radfahrer -
professor-doutor de Comunicação Digital da ECA (Escola de Comunicações e Artes)
da USP, trabalha com internet desde 1994 e já foi diretor de algumas das
maiores agências de publicidade do país;
Fonte: jornal Folha de São Paulo