Por que é tão
difícil conectar as escolas?
Quem esperava que o 5G fosse a bala de prata vai continuar a ver o
lobisomem vivo.
Se existe uma política pública que deveria ser consenso no
Brasil, mas não é, é a questão de conectar todas
as escolas públicas do país com internet de alta velocidade.
As escolas deveriam ter sempre a melhor conexão possível.
Só que
na realidade essa conexão continua precária, com baixa velocidade e, na maior
parte dos casos, o acesso chegando apenas a professores e administradores, mas
não aos alunos.
O leilão do 5G foi exemplo de como essa questão é tratada de
forma desleixada entre nós. Tentou-se a todo custo excluir a exigência de
conectar escolas do leilão.
Por exemplo, a obrigação de conectar 31
mil quilômetros de estradas entrou fácil no leilão.
Ganha um doce quem
conseguir justificar por que conectar as estradas do país é mais prioritário do
que conectar as escolas.
No fim, a obrigação de levar conexão às escolas acabou entrando
em razão de uma intervenção do Tribunal de
Contas da União e por pressão da
frente parlamentar de educação no Congresso. No entanto, essa obrigação foi
atrelada à venda das faixas menos cobiçadas do leilão, que são as frequências
de 26 GHz.
Essas frequências, para serem usadas em escala, ainda precisam de
muita infraestrutura, pesquisa e desenvolvimento.
Tanto é que os mais pessimistas enxergam que o leilão dessas
faixas simplesmente fracassou. Vários lotes nem sequer tiveram lances.
O valor
de arrecadação esperado era de R$ 7,6 bilhões, e nem a metade foi alcançada.
Em
outras palavras, quem esperava que o 5G fosse a "bala de prata" para
conectar as escolas brasileiras vai continuar a ver o lobisomem vivo. Já as
estradas...
O fato é que, para resolver esse problema de uma vez por todas,
é preciso adotar um conjunto de medidas.
Por exemplo, um esforço de organizar
os gastos com conectividade entre União, estados e municípios. Hoje, o país,
sem planejamento, gasta muito e gasta mal.
Muitas vezes há sobreposição de
investimentos dos três entes federativos em uma mesma área e falta total de
recursos em outras.
Dividir claramente quais as competências e atribuições de
cada ente geraria eficiência enorme e impacto imediato. Quem planeja gasta
Outro ponto é lidar com gargalos históricos que dificultam a
conectividade no país.
Por exemplo, a questão do ICMS, que está atualmente em pauta no Supremo.
Há
diversos estados no Brasil que cobram ICMS de 29% ou mais sobre o valor da
conexão à internet, mais do que o ICMS aplicado sobre cigarro, bebida alcoólica
ou armas.
O STF vai decidir em breve se deve ser respeitado o teto de
cobrança definido pelo Confaz, que é de 17%.
Se a decisão for nesse sentido,
haverá redução de até 40% do ICMS sobre conexão à internet em vários estados, o
que é positivo.
Por fim, o esforço para conectar as escolas deve ser sempre
multissetorial.
Para dar certo, precisa envolver não só o setor público mas
também o setor privado, a comunidade científica e a sociedade civil.
Na maior parte dos casos em que o Brasil atuou em questões de
tecnologia a partir de uma estratégia multissetorial, essa atuação deu certo.
Vale lembrar: é impossível construir a educação do futuro se a premissa disso
—conectividade— não existe.
RONALDO LEMOS - Advogado,
diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.