O pus do TikTok


Google, Facebook, WhatsApp, Instagram são o rosto e o furúnculo desta sociedade.

 

Eu adoro ficar vendo o TikTok. É uma meditação escatológica. Uma espécie de No Think Tank. É também um lugar muito criativo em linguagem. As pessoas ali são videomakers e lançam formatos criativos, efeitos especiais, montagens inusitadas: uma plataforma aberta com mais de 700 milhões de usuários e crescendo loucamente desde a pandemia, como tudo que é digital.

Não dá para alguém que trabalhe com comunicação, bens de consumo, vendas, ignorar aquilo. Principalmente para atingir um público jovem, de 30 anos para baixo.

Por isso marcas tão distintas como Prada e P&G estão investindo muito na plataforma, e a um custo menor que nas outras redes.

TikTok é como novela, música sertaneja, livro do Ken Follett: não é cool falar que você gosta, mas é um fato. Você não pode ignorar uma empresa que Walmart e Microsoft queriam comprar e que provoca tanta tensão entre os governos dos Estados Unidos e da China.

Mas, ao mesmo tempo que o TikTok é tudo isso, ele também é o politicamente incorreto, a grosseria, a afronta, o mau gosto, a ostentação patética num mundo que passa fome. O mundo vive um politicamente correto às raias da paranoia, e nos grupos de WhatsApp e no TikTok ele não é nada disso: ele é o oposto.

Uma coisa comum no TikTok são pessoas espremendo pus. Repito: espremendo pus, pipocando tumores, tirando cravos e espinhas...

Se está lá em série, é porque tem audiência, é porque as pessoas gostam de ver e de espremer. Isso é pauta para o Contardo Calligaris. Eu não tenho repertório para dizer o que é isso na cabeça das pessoas.

Mas posso dizer que é uma plataforma de comunicação de alto impacto e penetração, com seus prós e contras.

Ligados em redes (viciados em redes) impulsionadas pela pandemia, nunca vivemos tão sós. Trancados no quarto, na mente, aumentado as taxas de suicídio. Muitas pessoas são lovers de odiar e haters de si mesma.

O que é o pus? O pus é a desigualdade, o liberalismo sem limite, o socialismo desencantado e sem utopia.

O pus é o consumo compulsivo, um punhado de caras terem mais dinheiro que o resto da humanidade. O pus é o “burnout”. Ele é o efeito colateral da tecnologia tão bem mostrado no “Dilema das Redes”, na Netflix.

Este é um tempo de pus. Mas é também primavera, estação de coisas lindas no ciclo da vida. Google, Facebook, WhatsApp, Instagram nos possibilitaram coisas lindas e merecem, cada um deles, o Prêmio Nobel pelo bem que fazem. Mas merecem também limites para conter o mal que fazem.

Eles são o rosto dessa sociedade e a espinha, o furúnculo desta sociedade. Por isso jornalismo, arte, política de alto nível, educação, filosofia, pensadores nunca foram tão necessários para contrapor conteúdo de qualidade nessa gangorra. Não dá para viver só por Zoom e pelo Instagram.

Este é o mês da saúde mental, da prevenção do suicídio. O pus é a doença mental das redes, que transformam seguidores em perseguidores. Mas nelas está também o maravilhoso Tadashi Kadomoto, ajudando a cada manhã 25 mil pessoas a meditar juntas, mesmo separadas.

E nós, da elite deste país, não podemos ficar na redoma de nossas bolhas privilegiadas sem participar desse debate, nem deixar nossos filhos e netos nas mãos dos tiktoks. “Menino, sai dessa televisão”, gritava minha mãe.

Mais leitura. Mais música. Mais filme, teatro, esporte, utopia. Menos live e mais life.

Vamos espremer o pus deste mundo lindo e voltar ao seu projeto original antes que o vírus da mudança climática e da desigualdade mate todos nós.

No mês da prevenção do suicídio, vamos juntos lutar contra o suicídio deste planeta cheio de tiques e de toques.

Nizan Guanaes - empreendedor, criador da N Ideias​.

Fonte: coluna jornal FSP

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