Brasil precisa criar
supermercados com foco social, como na Suécia
Rede Matmissionen vende alimentos por um terço do preço de mercado.
Nas últimas semanas, tem havido crescente interesse
pela movimentação no segmento de atacarejos (misto de atacado e varejo), com
investimentos, abertura de lojas e expansão de redes estaduais e regionais para outros
estados.
Realmente, é um cenário que interessa à classe média, que ainda pode
fazer suas compras de mercado, mesmo que optando por produtos mais baratos, sem
privilegiar marcas.
Considerando, porém, que as
classes D e E concentram mais da metade dos brasileiros, seria urgente criar
por aqui algo como os supermercados com foco social, como o Matmissionen, da Suécia.
É interessante que uma rede como
a Matmissionen, voltada a pessoas com risco de pobreza (que ganham menos de 60%
da renda média nacional), tenha surgido na rica Suécia, não no Brasil, em que
mais de 30 milhões de pessoas passavam fome até o início deste ano (não
encontrei números atualizados após o relançamento do Bolsa Família).
Essa rede consegue cobrar bem
menos (um terço do preço de mercado) porque recebe doações de empresas de
alimentos. São produtos perfeitamente comestíveis, mas prestes a ser
descartados por algum motivo.
Há também iniciativas como o
projeto The Real Junk Food, no Reino Unido (lanchonetes, lojas e
armazéns), que recebe alimentos ainda bons que seriam jogados fora e os oferece
às populações vulneráveis, que pagam o valor que determinarem.
Ou seja, o que
puderem e quiserem pagar.
Estima-se que 30% dos alimentos
sejam desperdiçados no Brasil, da produção ao consumo.
Haveria, portanto,
grandes possibilidades de criação de supermercados e lanchonetes sociais, que
evitariam o descarte de alimentos ainda apropriados ao consumo, mesmo que sem a
aparência e a estética costumeiramente exigidas pelos consumidores com mais
renda.
Entrou em vigor em Portugal, no
mês passado, medida que isenta de IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado) 46
alimentos considerados essenciais, como pão, batata, massas, arroz, leite,
iogurtes, algumas frutas, legumes e vegetais.
Também seria boa providência
adotar as recomendações da Oxfam (confederação internacional de
organizações e parceiros que atua em mais de 90 países, em
busca de soluções para pobreza, desigualdade e injustiça): produzir a comida
sem sofrimento humano, pobreza, discriminação de gênero, péssimas condições de
trabalho e salários de fome.
Pode ser que essas sugestões
pareçam ingênuas em um mercado tão concorrido. Mas comida é um bem essencial,
hoje, agora e sempre.
Mas os preços dos alimentos são sujeitos a elevação por
diversos fatores, como as vendas de commodities para dezenas de países,
guerras, pandemias e outras situações semelhantes. Para os mais pobres, comer
bem é um desafio difícil de ser superado.
MARIA INÊS DOCI - advogada especializada na área da defesa do consumidor.