Os reflexos da queda dos juros para os fundos de pensão


Em sua última reunião, de 11/01, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central efetuou uma redução de 0,75% na taxa básica de juros da economia brasileira, o maior que se viu em cinco anos. Corte desta proporção não ocorria desde abril de 2012, quando os juros caíram de 9,75% para 9% ao ano.

Com isto, o mercado recebe duas sinalizações muito importantes de uma só vez: a primeira delas é que está mantida a tendência de queda da taxa Selic, iniciada em 19/10/16 e reafirmada em 30/11/16, situações em que o Copom efetuou reduções de 0,25%. A segunda é que a intensidade dos cortes poderá ser maior que o esperado, a depender da recuperação da economia brasileira.

Para tal decisão, contribuiu o anúncio de que o IPCA, índice oficial de inflação, fechou 2016 a 6,29%, ficando abaixo do teto da meta determinada pelo Banco Central. É o menor nível desde 2013 e um contraponto significativo aos 10,67% medidos no ano anterior.

É fácil ver o quão representativa foi a decisão do Copom ao se observar o gráfico seguinte, que evidencia como a taxa básica de juros tem se comportado ao longo dos últimos anos:


Fonte: Banco Central do Brasil. Arte: G1

De imediato, muitos especialistas reviram suas expectativas para a taxa Selic ao final de 2017 e agora visualizam como alvo algo entre 9% e 9,5% a.a., o que representa uma queda significativa a partir do patamar atual, de 13% a.a. Se tais projeções se confirmarem, voltaremos em apenas um ano a um patamar que não se via desde 2013 em nossa economia.

Os efeitos da decisão do Copom também foram sentidos de forma praticamente imediata nas taxas negociadas pelo Tesouro, com queda mais acentuada nos títulos prefixados de curto prazo. No dia seguinte ao anúncio, a LTN 2019 caiu mais de 3% em termos relativos. E a NTN-B, título indexado ao IPCA e um dos preferidos do mercado, também oscilou: o papel com vencimento em 2019 saiu de 5,70% no dia do anúncio para 5,54% no dia seguinte.

Oscilação do passivo atuarial

Para calcular o valor presente do passivo atuarial de um plano de previdência, utiliza-se uma taxa de desconto conhecida como taxa atuarial. Quanto maior for essa taxa, menor será o valor presente do passivo.

A regulamentação vigente prevê que a taxa atuarial será obtida através de estudos técnicos específicos, revistos ao menos uma vez por ano, e deverá se situar[1] entre os corredores determinados pela Estrutura a Termo da Taxa de Juros Média – ETTJM, que considera a média dos últimos três anos dos títulos públicos federais indexados à inflação.

Com juros crescentes ano após ano, a ETTJM também vinha se deslocando para cima, favorecendo a utilização de taxas atuariais mais elevadas. Chegou-se a um ponto em 2016 onde certos planos poderiam utilizar quase 7% a.a. como taxa de desconto, se assim os estudos técnicos de convergência específicos permitissem:


Fonte: Mercer GAMA

Com a queda do rendimento dos títulos utilizados para formação da ETTJM, espera-se a médio prazo uma volta dos limites aos patamares de anos passados. Nota-se, contudo, que as médias de rendimento desses títulos em 2017 apenas surtirão efeito nos corredores de 2018 em diante, em função da forma de cálculo da ETTJM.

Ainda assim, a taxa atuarial empregada pelos fundos de pensão pode sofrer redução já em 2017, uma vez que os estudos técnicos consideram como insumo primordial a expectativa de rendimento do portfólio de investimentos de cada plano, previstos durante todo o fluxo. Caso as projeções apontem para retornos inferiores aos do ano passado, as taxas serão, certamente, menores.

Por duas óticas, portanto, pode-se esperar uma redução das taxas atuariais médias, com consequente aumento do passivo atuarial médio dos planos de previdência brasileiros.

Mesmo efeito deverá ser sentido nas avaliações atuariais realizadas para contabilização de compromissos em Balanço, para as empresas que reportam benefícios pós-emprego consoante ao padrão IFRS / IAS 19. Aqui, as taxas atuariais são determinadas considerando o rendimento de mercado de títulos de alta qualidade na data das demonstrações contábeis. Para os cálculos em processamento neste momento, usualmente baseados em 31/12/2016, o efeito da queda da taxa básica de juros não deverá ser sentido de forma tão intensa. Mas, caso as projeções de especialistas se confirmem, no próximo encerramento de exercício as taxas deverão estar menores e os passivos, maiores.

Retomada da busca por investimentos alternativos

Viu-se na Pesquisa de Investimentos divulgada pela Mercer no final de 2016, feita com mais de cem planos de benefício que detêm aproximadamente R$ 100 bi de investimentos, que a Renda Fixa continuaria a ser a alocação predominante para 2017, com média de 86,6% em planos CD/CV e 90,7% em planos BD. Para ilustrar o peso da Renda Fixa na carteira dos fundos de pensão ante outros segmentos, trazemos a seguir o gráfico que demonstra a alocação prevista:

Meta de alocação 2017 em planos CD/CV


Fonte: Mercer – Pesquisa de Investimentos 2016

A redução na taxa de juros básica da economia traz efeitos diretos e imediatos na rentabilidade dos títulos de renda fixa, especialmente os negociados pelo Tesouro, que são maioria no portfólio dos planos de previdência brasileiros.

Buscando manter o patamar de rentabilidade e volatilidade da carteira e prover o atingimento da meta atuarial, fundos de pensão deverão considerar outros segmentos para investir e reinvestir seus recursos.

Tal tendência já era apontada pela Pesquisa de Investimentos da Mercer, que elencou Renda Variável e Investimentos no Exterior como as duas categorias com maior perspectiva de elevação para 2017:


Fonte: Mercer – Pesquisa de Investimentos 2016

E o meu dinheiro?

Nada mais justo e necessário que o estimado leitor, participante ou não de um plano de previdência, medite acerca dos possíveis impactos que todas essas mudanças podem ter em suas economias. Vamos fazer algumas breves reflexões a este respeito:

·         Se o Copom estiver correto em sua leitura, a redução da taxa Selic será crucial para a retomada da atividade econômica em nosso país. Boa notícia para o mercado e para as empresas, algo que já vem se refletindo na performance dos principais índices de ações do país;

·         Aqueles que privilegiam a renda fixa poderão se sentir órfãos, ao menos por algum tempo, dos títulos públicos sendo negociados em taxas reais bastante elevadas como as que estávamos habituados. Ainda há, contudo, oferta de papeis em patamares interessantes quando se considera a ótica de longo prazo, em especial quando se compara tais níveis aos encontrados em outros países. Não podemos esquecer que os juros básicos por aqui ainda são dos maiores do mundo, apesar da redução havida;

·         Para os endividados, esta pode ser uma boa hora de renegociar os juros de financiamentos e empréstimos tomados recentemente, quando as taxas estavam maiores. E para os que planejam se endividar, a expectativa de novos cortes sugere que os próximos meses trarão taxas sequencialmente menores em relação às aplicadas atualmente;

De uma forma geral, para indivíduos e para fundos de pensão, é necessário agir com bastante cautela e fundamentação para evitar que sinais e indícios recentes sejam tomados como certezas e, com isto, constituam-se em ameaça ao desempenho dos investimentos. Neste momento de volatilidade, o mais recomendável é municiar-se de análises e informações consistentes, permanecendo atento à confirmação ou reversão de tais indícios nos próximos episódios de mercado.

[1] É possível utilizar taxas fora dos corredores, mediante solicitação e autorização especial da PREVIC.

Guilherme Brum Gazzoni - Administrador, Pós-Graduado em Finanças e com Especialização em Entrepreneurship pela Babson College – Boston / Massachussets. Atuou na MERCER GAMA por dez anos, onde foi Diretor Administrativo e Comercial, e atualmente é Consultor líder da equipe da Mercer no Rio de Janeiro.

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