A recente desvalorização dos fundos de investimentos imobiliários (FIIs)
no início de 2020 levantou suspeitas de que estes tenham atingido seu máximo. A
valorização média de 10,6% em dezembro e de 36% em 2019 dos FIIs surpreendeu os
investidores. Justifico a seguir a valorização
e o que você deve esperar para esta classe de ativos neste ano.
Para quem acompanha esta coluna, a surpresa foi quanto à
velocidade da alta, mas não sua intensidade. Escrevi nos últimos dois anos alertando sobre como eles estavam subvalorizados.
No entanto, não foi só no Brasil que esta classe de ativos foi
agraciada.
IFIX x REITs
O gráfico abaixo mostra que a valorização dos REITs (Real Estate
Investment Trust) equivalentes aos FIIs nos EUA tiveram valorização similar no
ano passado.
Evolução dos Fundos imobiliários no
Brasil (IFIX B3) e nos EUA (REIT Bloomberg). Base 100 em 31/12/2018. Fonte:
Bloomberg
O mesmo motivo que pode fazer os REITs se valorizarem nos EUA
também deve promover a alta dos FIIs aqui no Brasil. Entretanto, antes de
apresentar esta razão, vamos analisar mais alguns números que justificam a alta
recente.
FIIs e Renda Fixa
A atração para os FIIs ocorreu pela forte queda na taxa básica
de juros e o fato de os dividendos mensais dos FIIs se assemelharem a títulos
de renda fixa referenciados a IPCA.
A similaridade deles se refletiu também na rentabilidade dos
últimos quatro anos. A figura abaixo mostra que o retorno do índice IMAB5+,
formado pelos títulos públicos federais referenciados ao IPCA com vencimento
superior a cinco anos, foi similar ao dos FIIs. O rendimento dos FIIs está representado
pela valorização do IFIX. Este é o índice de FIIs calculado pela B3. Ambos os
índices – FIIX e IMAB5+ – consideram o reinvestimento dos dividendos e juros
dos títulos que o formam. Assim, esta valorização já os contabiliza.
Valorização dos índices de fundos
imobiliários (IFIX) e de renda fixa referenciada à inflação com vencimento
superior a cinco anos (IMAB5+) em cada ano. Fonte: Bloomberg.
A valorização passada dos FIIs refletiu apenas o ajuste nos
preços como resultado da queda das taxas de juros, que também favoreceu os
títulos de renda fixa.
No longo prazo, os FIIs ainda estão atrás da valorização dos
títulos referenciados à inflação como pode ser visto no gráfico abaixo.
Evolução dos índices de fundos imobiliários
e de renda fixa referenciada à inflação. Base 100 em 03/01/2011. Fonte:
Bloomberg
No entanto, ao contrário dos títulos de renda fixa, cujo
montante de juros pago não pode subir, o aluguel dos FIIs pode variar. Por esse
motivo eles são classificados como renda variável e possuem maior potencial.
A provável alta do valor pago nos aluguéis é um dos motivos que
deve promover novas valorizações para os FIIs. Explico abaixo o motivo para
acreditar que os aluguéis devem subir, mas antes, vamos comparar o rendimento
recebido de se investir em imóvel diretamente ou por meio de FIIs.
Dividendos de FIIs x Aluguel de Imóveis
Segundo o portal FipeZap, a taxa média de aluguel dos imóveis
comerciais está em 5,35% ao ano. Isso representa uma taxa mensal de 0,45% (=
5,35% / 12). O gráfico abaixo mostra a evolução desta taxa junto com a de
imóveis residenciais e a taxa de juros real.
Evolução da taxa de aluguel de
imóveis comerciais e residenciais e da taxa de juros real. Fonte: https://fipezap.zapimoveis.com.br/
O IFIX também está hoje com uma taxa de dividendos média de
5,37% ao ano. Entretanto, este rendimento já é líquido de impostos e qualquer
taxa. O mesmo não ocorre com a taxa de aluguel de imóveis comerciais.
Para quem investe diretamente em uma sala comercial, a taxa
média apresentada no gráfico de 5,35% ao ano não é líquida. Ainda precisa ser
reduzido o imposto de renda e a taxa da imobiliária. Portanto, o rendimento
líquido deve cair para 3,41% ao ano. Esta taxa ainda não assume possíveis
vacâncias, custos na aquisição e despesas de manutenção do imóvel. Se
considerarmos todos estes custos, o ganho líquido atual é inferior a 3% ao ano
para quem compra o imóvel diretamente.
Logo, os FIIs ainda têm espaço relativo para se valorizar. Mas a
possibilidade de alta dos aluguéis deve ser a principal justificativa para
novas valorizações.
Ciclo de alta
O último relatório da maior gestora de renda fixa do mundo, a
Pimco, explica porque os preços dos imóveis devem se valorizar nos EUA.
O gráfico abaixo retirado do relatório disponível no site da
Pimco mostra que o excesso de imóveis construídos antes da crise de 2008 está
na mínima desde 2000. Já a proporção de pessoas com imóveis (homeownership
rate, na linha azul do gráfico) ainda não atingiu o patamar anterior de 2008.
Por este motivo, a gestora acredita em mais elevação de preço por lá.
Gráfico retirado do relatório da
gestora global de renda fixa Pimco. Em verde, excesso de imóveis construídos
antes da crise de 2008 está na mínima desde 2000. Em azul, a proporção de
pessoas com imóveis (homeownership rate). Fonte: Pimco (www.pimco.com.br).
No Brasil, os preços dos imóveis comerciais ainda não pararam de
cair, mas os preços dos aluguéis já. No último relatório do FipeZap (abaixo) o
preço dos imóveis apresentava queda de preço em doze meses de 2,55%. Mas os
aluguéis já apontavam alta de 0,37%, embora ainda abaixo da inflação.
Variação dos preços de venda e aluguel
de imóveis comerciais. Fonte: https://fipezap.zapimoveis.com.br/
Com uma maior demanda proveniente do crescimento econômico e
redução dos estoques de imóveis vazios depois da recessão dos últimos anos,
tanto o preço de venda como dos aluguéis deve subir.
Portanto, os fundos imobiliários ainda possuem potencial de alta
tanto relativamente a se comprar o imóvel diretamente quanto pela elevação dos
valores de aluguéis.
Michael Viriato -
professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.
Fonte: coluna jornal FSP