Elementos
de julgamento social e memória de curto prazo, partes importantes do complexo
cognitivo, podem ter seu auge mais tarde do que foi pensado anteriormente.
Por trás de todos os elogios
forçados dirigidos aos mais velhos – esperto, astuto, sábio – está um
reconhecimento de um fato que os cientistas não conseguem qualificar com
facilidade: as faculdades mentais que melhoram com a idade.
O conhecimento é muito
importante, claro. As pessoas que estão além da meia-idade tendem a saber mais
do que os jovens, só pelo fato de terem vivido mais tempo, e se saem melhor em
testes de vocabulário, palavras cruzadas e outras aferições de inteligência
permanente.
Ainda assim, os jovens que
pedem conselhos aos mais velhos (a maioria desesperados) não o fazem apenas
para conseguir informações, terminar as palavras cruzadas ou usar o cartão de
crédito deles. Nem, normalmente, estão procurando ajuda para resolver um
problema que envolva memória de curto prazo ou para completar um quebra-cabeça.
Esse tipo de habilidade, chamada inteligência fluida, tem seu pico na faixa dos
20 anos.
Não, os cérebros mais velhos
oferecem algo a mais, de acordo com um novo artigo do periódico Psychology
Science. Elementos de julgamento social e memória de curto prazo, partes
importantes do complexo cognitivo, podem ter seu auge mais tarde do que foi
pensado anteriormente.
Os pós-doutorandos Joshua
Hartshorne, do MIT, e Laura Germine, de Harvard e do Hospital Geral de
Massachusetts, analisaram uma imensa coleção de resultados de testes cognitivos
feitos por pessoas de todas as idades. Os pesquisadores descobriram que uma
divisão do tipo de cognição em relação à idade – fluida nos mais jovens e
cristalizada nos mais velhos – escondia nuances importantes.
"Essa dicotomia em
relação aos picos dos mais jovens e dos mais velhos é muito rasteira. Há muitos
outros padrões acontecendo e precisamos levá-los em conta para entender de
verdade os efeitos da idade na cognição", avisa Hartshorne.
O novo artigo não é o
primeiro desafio para a literatura científica sobre o declínio relacionado à
idade e não será o último. Um ano atrás, pesquisadores alemães afirmaram que os
"déficits" cognitivos da idade eram causados principalmente devido ao
acúmulo de conhecimento – ou seja, o cérebro fica mais lento porque precisa
fazer a busca em uma maior biblioteca mental de fatos. Essa ideia causou debate
entre os cientistas.
Os especialistas afirmaram
que a nova análise levanta outra questão: existem elementos diferentes e
independentes da memória e da cognição que têm seu auge em períodos distintos
da vida?
"Acho que eles têm que
trabalhar mais para demonstrar que esse é o caso, mas esse é um artigo provocativo
e vai causar impacto nesse campo", avisa Denise Park, professora de
Comportamento e Ciências do Cérebro da Universidade do Texas, em Dallas.
A força da nova pesquisa está
parcialmente em seus números. O estudo avaliou resultados históricos do popular
teste de inteligência Wechsler e os comparou com resultados recentes de testes
cognitivos curtos feitos por dezenas de milhares de pessoas nos sites dos
autores, testmybrain.org e gamewithwords.org. O único problema desse tipo de
abordagem é que, como eles não seguiram as mesmas pessoas durante um longo
tempo, a pesquisa pode ter deixado de lado o efeito de experiências culturais
diferentes, afirma K. Warner Shaie, pesquisador da Universidade Estadual da
Pensilvânia.
Porém, a maioria dos estudos
anteriores não foram tão grandes nem tiveram a mesma abrangência de idades. Os
participantes dos sites estavam entre 10 e 89 anos e fizeram uma grande bateria
de testes que mediam habilidades como memória para símbolos abstratos e
sequências de dígitos, solução de problemas e facilidade para ler emoções nos
olhos de pessoas desconhecidas.
Tão importante quanto a
abrangência foi o fato de os cientistas procurarem o efeito da idade em cada
tipo de teste. Pesquisas anteriores normalmente agrupavam testes similares,
assumindo que eles capturavam um atributo básico comum, da mesma maneira que um
treinador dá nota para a capacidade atlética de alguém baseado na velocidade,
força e habilidade de saltar.
Qual foi o resultado da nova
abordagem? "Encontramos habilidade diferentes amadurecendo em idades
diversas. É uma imagem muito mais rica do tempo de vida do que apenas chamar de
envelhecimento", diz Laura.
A velocidade de processamento
de informações – a rapidez com que cada pessoa manipula números, palavras ou
imagens, como se usasse um bloco de rascunhos mental – geralmente chega ao auge
no final da adolescência, confirmaram Laura e Hartshorne, e a memória para
algumas coisas, como nomes, chega ao pico aos 20 e poucos anos. Mas a
capacidade daquele bloco de rascunho mental, chamado memória de trabalho,
atinge seu melhor momento pelo menos uma década depois e demora para entrar em
declínio. As habilidades para lembrar de rostos e fazer contas de cabeça,
principalmente, chegaram ao auge aos 30 anos, segundo o estudo, "algo
difícil de assimilar usando a dicotomia entre inteligências fluida e
cristalizada".
Os pesquisadores também
analisaram os resultados do teste Lendo a Mente nos Olhos. No exame, as pessoas
precisavam olhar para fotos de olhos de desconhecidos em um computador e determinar
seu estado de espírito de acordo com um menu com opções como
"cauteloso", "inseguro" e "cético".
"Não é um teste fácil, e
a pessoa não sabe depois se foi bem ou não. Achei que tinha falhado, mas na
verdade fui bem", avisa Laura. Ainda assim as pessoas em seus 40 ou 50
anos consistentemente se saíram melhor, segundo o estudo, e a habilidade decaiu
muito devagar em idades mais avançadas.
A imagem que emerge dessas
descobertas é a de um cérebro mais velho que se move mais devagar do que quando
era jovem, mas que se tornou mais preciso em muitas áreas e mais experiente em
ler o humor das outras pessoas – além de ter mais informações. Essa é uma
combinação muito prática, já que várias decisões importantes que a pessoa toma
afetam intimamente os outros.
Ninguém precisa de um
cientista cognitivo para lhe explicar que é melhor pedir um aumento ao chefe
quando ele ou ela estão de bom humor. Mas a mente mais velha pode estar mais
apta a deixar de lado julgamentos interpessoais errados e se sair bem em situações
complicadas.
"Como em 'Essa pessoa
não está feliz com seu pensamento rápido e velocidade de processamento – ele
está quase batendo em você", diz Zach Hambrick, professor de Psicologia da
Universidade Estadual do Michigan.
Os detalhes para essa imagem
mais complexa do envelhecimento cerebral não são muito claros, e exames sociais
como o teste Lendo a Mente nos Olhos ainda não foram extensivamente usados
nesse tipo de pesquisa, afirmam Hambrick e outros especialistas. Além disso,
não se chegou a qualquer conclusão na nova pesquisa se as mudanças que
acontecem na cognição por causa da idade são resultado de uma causa só – como o
declínio da velocidade das transmissões neurais – ou de várias.
Mas, por enquanto, a nova
pesquisa pelo menos dá algum significado ao adjetivo vazio "esperto".
Benedict Carey – jornalista, repórter de ciência
do The New York Times.