Com avanço da
vacinação, empresas começam a discutir regime híbrido ou home office definitivo.
Para quem pode escolher, a hora de
decidir sobre a volta ao escritório se aproxima. O avanço da vacinação contra a
Covid-19 e a redução no número de casos e de mortes deu mais segurança aos
planos de trabalho presencial.
Grandes empresas já
anunciaram a intenção de manter o trabalho em sistema híbrido.
Além de absorver
parte da mudança trazida pela pandemia –o trabalho no ambiente
doméstico–, a medida já permitiu que muitas firmas entregassem
espaços locados e adotassem outras estratégias de ocupação, como o aluguel de
estações de trabalho em coworkings.
Nem todas as
empresas darão ao funcionário o poder de escolher a melhor opção, mas a
recomendação de advogados e do Ministério Público do Trabalho é a de que os
dois lados mantenham diálogo sobre a transição entre as rotinas e de que forma
os dois lados podem se proteger, tanto em relação à aplicação da legislação
trabalhista quanto em relação aos cuidados para evitar a contaminação por
Covid-19
Segundo dados da
ferramenta Google Trends, o Brasil foi o país que mais buscou informações sobre
as regras de segurança em relação à crise sanitária na semana passada.
O volume
de pesquisas do termo “protocolos de biossegurança” mais que dobrou. A alta foi
de 110% entre os dias 29 de julho e 4 de agosto.
Em nenhum outro
momento nos últimos dez anos o Google registrou tantas buscas por protocolos de
segurança.
Com a volta às aulas, pais, professores e
demais envolvidos também estavam preocupados com os parâmetros do retorno às
instituições de ensino.
O termo “protocolo de segurança volta às aulas"
cresceu 80% entre os dias 29 de julho e 4 de agosto.
As leis vigentes de
enfrentamento à pandemia não definem regras fixas para esses protocolos, seja
para escritórios ou escolas, mas as recomendações de uso de máscaras, o reforço
na ventilação e em medidas de higiene e limpeza continuam de pé.
Reunimos aqui
dúvidas de leitores e também as perguntas mais frequentes feitas no buscador
Google.
Ajudaram a responder os advogados Jorge Matsumoto, do Bichara, Fernanda
Mendes, sócia da área trabalhista do Tocantins & Pacheco, o professor de
direito do trabalho da FMU (Faculdades Metropolitanas Unidas) Ricardo Calcini e
o juiz do trabalho Luiz Antonio Colussi, presidente da Anamatra (Associação
Nacional dos Magistrados do Trabalho).
1) A empresa ainda
vai definir se o retorno ao escritório será total ou parcial. Se eu optar pelo
home office ou pelo regime híbrido, a empresa precisa bancar despesas como
conta de luz ou internet?
No caso do teletrabalho, que é o previsto na CLT, a empresa deve fornecer os
equipamentos para que o trabalho ocorra. Ou seja, dar a estrutura necessária.
Em relação a outros
gastos, a lei não prevê nada sobre despesas com energia elétrica, internet ou
outros que possam ser geradas pelo teletrabalho.
O que normalmente
as empresas fazem é definir um sistema de reembolso ou um valor teto para esses
gastos. Isso pode ser feito de forma individual, por uma política interna ou
por meio de acordo coletivo de trabalho.
2) O que devo
calcular antes de decidir se quero voltar? Gastos extras, trânsito, silêncio,
situação de saúde, política de saúde da empresa etc?
A volta ou não ao trabalho presencial não é uma opção do empregado. Porém, as
empresas podem abrir esse diálogo para adaptar o funcionamento dos escritórios
a um modelo que atenda as necessidades do negócio e abrigue as mudanças trazidas
pela pandemia.
Diversas empresas
já adotaram o modelo híbrido e, nesse caso, o empregado só escolhe os dias da
semana em que usará o escritório para trabalhar.
Se houver a
possibilidade de escolher entre as três opções –manter o home office, ter uma rotina
híbrida ou voltar 100% para o escritório–, o ideal será colocar no papel as
despesas que teve no último ano e avaliar se compensa manter esses gastos, como
um plano mais caro de internet.
Essa decisão deve
considerar também as realidades individuais de cada um, como as condições de
saúde, a segurança dos deslocamentos pela cidade etc.
Benefícios que
tenham sido suspensos com o home-office, como vale-transporte, deverão ser
retomados, mesmo que o modelo seja o híbrido.
Caso o empregado
tenha trabalhado apenas em teletrabalho durante todo o período do contrato e
agora tenha a possibilidade de migrar para o híbrido ou presencial, deve checar
as convenções coletivas e políticas internas adotadas pela empresa para a
atividade no escritório.
A maioria dos benefícios, como vale-refeição, estarão
nos acordos e convenções.
3) O que posso
cobrar da empresa quanto aos protocolos de biossegurança? É obrigatório ter
algum tipo de plano?
O empregador é responsável pela manutenção e garantia de um ambiente de
trabalho saudável e, neste sentido, deve adotar medidas de vigilância
epidemiológica e sanitária com a finalidade de promover a saúde e segurança do
trabalhador.
Não há uma
obrigatoriedade legal de existência de um plano específico, mas sim da
fiscalização do cumprimento de protocolos de biossegurança, em conformidade às
orientações da Organização Mundial de Saúde.
Entre esses
protocolos, estão testagem, disponibilização de máscara, álcool e até mesmo
exigibilidade de vacinação, sempre de forma coerente à atividade econômica
exercida e às peculiaridades da prestação de serviços.
Uma medida
importante, e já apontada pelo Ministério Público do Trabalho, é a análise
técnica de risco biológico e a elaboração de Programa de Saúde Ocupacional,
onde pode constar a necessidade de vacinação como medida essencial à segurança
do trabalho.
4) A empresa pode
exigir que eu volte imediatamente após a vacinação se eu tiver mudado de
cidade?
O empregador pode exigir o retorno às atividades presenciais tal como previsto
em contrato de trabalho ou aditivo contratual firmado entre as partes.
A lei garante prazo
mínimo de 15 dias para essa exigência. Portanto, a necessidade de retorno do
trabalhador deve respeitar esse intervalo, mas, por acordo prévio, ou por
decisão do empregador, um prazo maior pode ser concedido.
5) É necessário um
novo contrato de trabalho para prever o modelo híbrido? Perco ou ganho direitos
nesses casos?
O ideal é que, com a adoção do modelo híbrido, haja o ajuste do contrato de
trabalho, por meio de um aditivo. Lá devem estar as regras para a rotina de
trabalho, a divisão dos dias no escritório ou em casa.
O ganho ou a perda
de direitos, a partir desta modalidade híbrida, vai depender desta nova
adequação contratual. Os sindicatos também podem atuar para estabelecer
parâmetros para esses aditivos, por meio de uma nova norma coletiva de
trabalho.
6) Se o modelo for
híbrido, ainda posso usar o equipamento da empresa? Como fica o fornecimento de
vale-transporte e vale-alimentação ou refeição?
Não há impedimento pelo uso do equipamento da empresa, sobretudo se isso vier a
ser ajustado contratualmente entre as partes, mas a obrigação no fornecimento
dependerá de negociação.
O vale-alimentação
ou refeição continua sendo um direito do trabalho se houver previsão em norma
coletiva de trabalho, e isso não muda se o modelo de trabalho passar a ser
misto, parte em casa, parte na empresa.
Por outro lado, o vale-transporte só é
devido se houver deslocamento do trabalho para casa e vice-versa.
7) A legislação de
enfrentamento à pandemia tem data de validade? O governo pode definir que as
regras que preveem afastamento de pessoas com comorbidades ou acima de 60 anos
não valem mais?
A legislação está atrelada à vigência de medidas provisórias. Nada impede que o
governo federal, ou ainda as autoridades locais, possam estabelecer novas
regras prevendo o afastamento de pessoas com comorbidades ou acima de 60 anos.
O exemplo mais emblemático disso foi a Lei nº 14.151 de 2021, que determinou o
afastamento das grávidas enquanto perdurar o estado de pandemia.
8) Posso ser
demitido por justa causa se eu me recusar a voltar ao trabalho presencial por
não ter duas doses de vacina ainda? Somente questões médicas impedem essa
obrigação?
Para recusar o retorno ao trabalho presencial, o trabalhador precisa apresentar
uma justificativa. Não existe, hoje, qualquer norma prevendo a suspensão do
contrato de trabalho ou o direito ao não-comparecimento enquanto perdurar a
pandemia.
Com o contrato
vigente, é direito do empregador exigir do empregado a prestação de serviços,
inclusive de forma presencial. A princípio, apenas questões médicas
documentadas por meio de atestado médico podem justificar a recusa ao retorno
presencial das atividades pelo empregado.
Portanto, alguém
que tenha uma comorbidade com risco de agravamento em caso de contaminação pela
Covid-19 tem o direito de se manter longe do espaço de trabalho, mas deve
comprovar a necessidade por meio de laudo ou relatório médico.
É uma situação
excepcional, mas que deve ser resolvida com bom senso pelos envolvidos. O risco
de o empregador usar a justa causa não está descartado, mas é bastante
controvertido.
Esse tipo de demissão é possível quando o trabalhador comete
falta grave, como insubordinação. Nesses casos, ele perde o direito à multa de
40% do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviços) e não tem direito a aviso
prévio nem ao seguro-desemprego.
9) Estou grávida,
mas ainda não recebi as duas doses de vacina. Devo voltar ao trabalho?
A lei nº 14.151 de 2021 garante o regime de teletrabalho às gestantes em tempos
de pandemia. Nos casos em que o trabalho à distância não for possível pelo tipo
de atividade, a funcionária grávida deverá ficar afastada. No período longe,
ela continua recebendo o salário.
10) Gestantes podem
trabalhar presencialmente na pandemia? Se eu não voltar, meu empregador tem que
manter pagamentos como vale-transporte e alimentação?
A lei garante o afastamento das trabalhadoras grávidas e diz que elas não podem
sofrer prejuízos na remuneração devido à ausência. Porém, no caso do pagamento
do vale-transporte, esse direito está condicionado à necessidade de
deslocamento. Já o vale-alimentação, por ser uma remuneração indireta, deverá
ser mantido.
Fernanda
Brigatti – jornal FSP