Presente de grego


Usar com moderação é pouco. Não use antes de conhecer as regras do jogo e saber os possíveis estragos.

Tiago acabou de entrar na universidade e recebeu um presente inesperado do banco, logo depois de abrir uma conta-corrente: um cartão de crédito com limite de R$ 4.000! Aos 18 anos, sem emprego fixo e sem nenhuma fonte de renda, achou o máximo!

O cartão de crédito caiu como uma luva! Ele estava mesmo precisando de dinheiro para dar uma melhorada no visual, um celular novo, comprar livros acadêmicos, acompanhar os amigos nos bares mais frequentados.

Sem nenhuma experiência ou orientação, Tiago não sabe que se trata de um presente de grego, que, em vez de um benefício, trará malefício e grandes problemas financeiros se for usado de forma equivocada.

Tiago fez a primeira compra, um smartphone é claro, no valor de R$ 800, e pagou com o cartão de crédito. O que ele não sabe é que acabou de contrair uma dívida, sem juros, até a data do vencimento da fatura. Após essa data, sobre o valor que não foi pago (saldo devedor), pagará juros de 15% ao mês, parecido com os juros cobrados por agiotas em operações de crédito muito arriscadas. Isso mesmo, pagará em um único mês mais do que o mercado paga em aplicações financeiras de um ano inteiro!

Com que dinheiro ele vai pagar a fatura? Não faz ideia... Quem sabe até lá ele ganha na loteria ou arranja um emprego, ou melhor ainda, o banco diz que era mesmo um presente e que não precisa pagar nada. A informação está lá, na fatura do cartão, mas ele não leu, e, se leu, não tem noção do que significa. Então vou explicar, em alto e bom som!

Cartão de crédito não é dinheiro! Na verdade, é dinheiro, só que dos outros, e não seu! Se você usar esse generoso presente que não pediu e o surpreendeu quando ganhou, vai entrar em um rolo compressor do qual será muito difícil se desvencilhar.

A dívida de Tiago, que parece inocente, afinal é apenas uma pequena parte do limite que alguém teve a coragem e a ousadia de oferecer, vai crescer muito rápido até se transformar em um valor impagável.

Se Tiago não comprar mais nada, o valor da segunda fatura será de R$ 920. A terceira fatura, R$ 1.058; a quarta R$ 1.216. No próximo aniversário, quando completar 19 anos, Tiago terá uma dívida de R$ 4.280. E pensar que tudo começou com uma compra de R$ 800. Um ano depois ele deve mais de cinco vezes o valor financiado!

Se a empolgação fosse maior e Tiago tivesse usado todo o limite de R$ 4.000, um ano depois, teria uma dívida de R$ 21.400!! Impensável para um jovem, ainda estudante, em busca do primeiro emprego, que se deixou levar pela sensação de poder comprar o que bem entendesse.

Parece piada de mau gosto, mas não é. O problema é muito mais sério do que, a princípio, as pessoas imaginam. Muita gente, jovem e adulta, está em situação semelhante à de Tiago.

Silvia, 40 anos, ganha R$ 4.000 e deve R$ 100 mil, dívida contraída para pagar compromissos assumidos com o cartão de crédito. Se a dívida fosse congelada hoje, todo o salário dela dos próximos dois anos seria destinado para pagar essa dívida. Como isso não vai acontecer, a dívida vai continuar crescendo em ritmo acelerado, e Silvia tem um problemão para resolver.

Não caia nessa armadilha. Compre somente o que cabe no seu bolso. Use o velho e bom método de pagar tudo em dinheiro. Mude seus hábitos de consumo. Pense, planeje antes de gastar. Esqueça o limite que te deram e estabeleça o seu limite para gastar. Faça escolhas, priorize, compre só o necessário, o que realmente tem importância. Se endividado, peça ajuda a parentes e amigos. Não me refiro a pedir dinheiro emprestado, mas ajuda para encontrar o caminho certo e mudar o final dessa história. Mantenha esse cavalo de troia bem longe de você!

Marcia Dessen - planejadora financeira pessoal, diretora do IBCPF (Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais Financeiros) e autora do livro "Finanças Pessoais: o que fazer com meu dinheiro" (Trevisan Editora, 2014).

Fonte: coluna semanal jornal FSP

Tel: 11 5044-4774/11 5531-2118 | suporte@suporteconsult.com.br