Somos atraídos por novidades
O
cérebro registra não o que é ou está, mas o que passa a ser.
Tudo o que é inusitado, inesperado, ou saliente de alguma forma
nos chama a atenção.
E não é por culpa do mundo moderno em que vivemos, cheio
de coisas acontecendo, janelas abertas no computador, imagens pipocando na
televisão: mesmo no mais tranquilo dos campos, um movimento súbito no mato
atrai igualmente o olhar de humanos descansando e quadrúpedes pastando.
Parte da razão —se é que há razão finalística premeditada nas
maquinações do cérebro, o que duvido, mas escrevo "razão" como atalho
para "causa mecanística imediata"— é que o que o cérebro registra não
é o que é ou está, e sim o que passa a ser.
Se nos fosse possível paralisar os
olhos, paralisar de verdade —porque os olhos que pensamos parados ainda se
movem continuamente—, a imagem desapareceria a olhos vistos.
Há sempre imagem
formada pelos olhos porque os olhos sempre se movem.
Da mesma forma, o que subitamente se move independente dos olhos
ganha processamento prioritário pelo cérebro, também chamado de atenção.
O que
já é não contém mais informação do que quando passou a ser, e portanto é
irrelevante face a qualquer novidade. Novidade é o que passa a ser, sobretudo
de maneira inesperada, imprevisível.
O presente escondido pelo embrulho que não
entrega seu conteúdo. A música nova que o Spotify aposta que você vai curtir.
Ah, como gostamos de novidades.
Feita a surpresa, o sistema de recompensa do cérebro registra a
novidade e premia a experiência com um surto de dopamina que põe em marcha os
circuitos que nos fazem sentir prazer, seja lá como eles funcionem: até hoje
não sabemos descrever o que, exatamente, no corpo é essa danada da sensação de
prazer.
Mas o que nos faz antecipar a novidade e agir em busca dela,
ativamente aumentando nossas chances de exposição ao que é novo?
Um estudo publicado no número mais recente da revista Nature
Neuroscience, de um grupo de pesquisadores na Universidade Washington, em Saint
Louis, nos EUA, mostra que a atração por novidades é obra de uma região do cérebro
cujo nome não poderia ser mais adequado: a zona incerta.
Se o nome vem simplesmente da incerteza original sobre a função
desta parte diminuta do cérebro, espremida entre o tálamo e o mesencéfalo,
agora ele se justifica: a atividade de neurônios nesta região, regida por
estímulos visuais, sinaliza a presença imediata ou iminente de novidade —e
esses mesmos neurônios fazem o mesencéfalo, logo ali do lado, organizar
movimento dos olhos em direção à novidade.
Não à toa, esses são os mesmos neurônios no mesencéfalo que
respondem àquele movimento súbito do mato e movem nossos olhos para lá, o que
nos dá uma imagem em alta resolução do que está prestes a acontecer.
Quando o
cérebro prevê sozinho que algo novo deve aparecer ali, mesmo sem nada se mover
(ainda), a zona incerta transforma a expectativa em ação.
Suzana
Herculano-Houzel - Bióloga
e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA)