Revolução da longevidade ou catastrofismo demográfico?


Revolução da longevidade ou catastrofismo demográfico?

Desafios e oportunidades do envelhecimento populacional no Brasil.

Na coluna "Os 70 são os novos 50?", contei que estou preparando um curso sobre "A invenção de uma bela velhice" com o demógrafo José Eustáquio Diniz Alves

Destaquei que o foco do nosso curso será a análise dos três bônus demográficos: o primeiro, o bônus da estrutura etária; o segundo, o bônus da produtividade; o terceiro, o bônus da longevidade.

Eustáquio, diferentemente de estudiosos que se concentram nas mazelas do ônus demográfico, daqueles que apresentam uma visão catastrófica sobre o envelhecimento da população brasileira, prefere analisar as oportunidades dos bônus da longevidade.

No início da década de 1980, quando Eustáquio começou a estudar demografia, o debate público girava em torno do elevado crescimento populacional. 

Havia uma grande preocupação com a chamada "bomba populacional" e o suposto ônus de o país ter muitas crianças. Contudo, diz ele, as taxas de fecundidade já vinham caindo desde o início dos anos 1970. 

Essa queda implicava no estreitamento da base da pirâmide etária e no aumento da proporção de pessoas em idade de trabalhar. No final da década de 1990, essa alteração na estrutura etária foi chamada de "bônus demográfico".

No início dos anos 2000, os estudiosos reconheceram que, paralelamente ao crescimento da população economicamente ativa, havia também um ganho de produtividade, impulsionado pela elevação dos níveis de escolaridade, pelo avanço tecnológico e pela expansão da infraestrutura urbano-industrial. 

É o "segundo bônus demográfico".

Enquanto o "primeiro bônus demográfico" decorreu da mudança na estrutura etária, o "segundo bônus demográfico" resultou do aumento da produtividade do trabalho. 

Todos os países que alcançaram elevados Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) passaram por essas duas fases, e, de acordo com Eustáquio, souberam aproveitá-las plenamente.

O "primeiro bônus demográfico" se encerrou com a redução da proporção de crianças e com o aumento da proporção de idosos na população. Pela primeira vez na história, no século 21 há mais pessoas de mais de 60 anos do que crianças de 0 a 5 anos. 

Alguns estudiosos, preocupados com os impactos fiscais da redução da população "ativa" e do crescimento da população considerada "inativa", enxergam o envelhecimento populacional sob a ótica das perdas. Para eles, a longevidade é um "ônus demográfico".

Ao contrário dos estudiosos que interpretam o envelhecimento populacional apenas como um ônus, Eustáquio considera que a longevidade é uma conquista civilizacional. 

Para ele, Japão e União Europeia lideram uma visão que reconhece o potencial da longevidade como um ativo estratégico para transformar a estrutura produtiva. 

Ao invés de um "pânico da longevidade", ele enxerga as oportunidades de um envelhecimento mais autônomo e saudável e, assim, vislumbra o surgimento de um "terceiro bônus demográfico".

Depois de mais de 30 anos pesquisando envelhecimento, autonomia e felicidade, acredito que a revolução da longevidade é paradoxal. 

Não posso negar que existem ônus decorrentes do envelhecimento da população brasileira, mas, como Eustáquio, meu propósito de vida é descobrir quais são os possíveis bônus da longevidade. 

Acredito que, juntos, podemos contribuir para combater a velhofobia e ajudar a construir os caminhos de uma bela velhice para nossos filhos e netos.

MIRIAN GOLDENBERG - antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é autora de "A Invenção de uma Bela Velhice"

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