Inteligência artificial 'lê' cérebro e reconstitui
imagens; sonhos podem ser próximo passo
Pesquisadores
conseguiram transformar ressonância cerebral em ilustrações
A partir de ressonâncias magnéticas da atividade
cerebral, pesquisadores conseguiram reconstituir com inteligência artificial a
imagem de um trem que havia sido mostrada a uma pessoa.
O resultado foi a
silhueta de uma locomotiva cercada de fumaça. As cores estavam trocadas, mas as
formas são próximas às originais.
A tecnologia desenvolvida na Universidade de Osaka,
no Japão, pode ajudar cientistas a mapear o código por trás do funcionamento do
cérebro. Exagerando as possibilidades ao limite, seria possível com essa nova
técnica reproduzir imagens de sonhos ou pensamentos em computadores.
A partir de ressonâncias magnéticas da atividade
cerebral, pesquisadores conseguiram reconstituir com inteligência artificial a
imagem de um trem que havia sido mostrada a uma pessoa.
O resultado foi a
silhueta de uma locomotiva cercada de fumaça. As cores estavam trocadas, mas as
formas são próximas às originais.
A tecnologia desenvolvida na Universidade de Osaka,
no Japão, pode ajudar cientistas a mapear o código por trás do funcionamento do
cérebro.
Exagerando as possibilidades ao limite, seria possível com essa nova
técnica reproduzir imagens de sonhos ou pensamentos em computadores.
Os pesquisadores usam modelos computacionais
conhecidos como Stable Diffusion, similares aos empregados pelo Dall-E —plataforma irmã do ChatGPT que
gera imagens a partir de textos.
O que o estudo da universidade japonesa fez
foi gerá-las a partir de exames de ressonância computadorizada, traduzindo
estímulos cerebrais em imagens compatíveis com as originais, segundo o critério
dos autores.
Para isso, o estudo analisou duas partes do
cérebro: o lóbulo occipital, para captar forma e perspectiva, e o lóbulo
temporal, para agregar sentido à imagem.
O autor do estudo Yu Takagi, professor da Universidade de Osaka, diz à reportagem que o
diferencial foi essa divisão do processo de leitura dos exames de ressonância.
O modelo foi criado com dados de quatro pessoas
—cada uma delas olhou 10.000 retratos enquanto passava por ressonância
magnética.
Pesquisas anteriores tentaram traduzir os estímulos
cerebrais em imagens, sem analisar a parte do cérebro que atribui significado a
objetos e pessoas. Mesmo com maiores quantidades de dados, o resultado era
pior, de acordo com o artigo.
O estudo da Universidade de Osaka, entretanto, tem
validade restrita aos quatro voluntários analisados.
De acordo com o professor Daniel Takahashi, do
Instituto do Cérebro da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), a
forma como o cérebro associa sentido ao que os olhos veem depende de
experiência individual e contexto. "Cada pessoa tem um código
cerebral."
"Muito provavelmente, mesmo que consigam mais
voluntários, o resultado não seria tão bom, por essa característica do
cérebro", acrescenta Takahashi.
Ele também avalia a dificuldade logística de
aumentar o escopo do experimento. Cada voluntário fez de
30 a 40 sessões de ressonância para ver as 10 mil imagens. "Nem todo mundo
está disposto a isso".
Especialista em aplicação de inteligência
artificial em saúde, o professor da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande
do Sul) Luís Lamb diz que antes de ganhar aplicações práticas os resultados do
estudo precisam ser validados estatisticamente, como uma vacina.
PREOCUPAÇÕES ÉTICAS E LIMITES TÉCNICOS
O professor Dráulio Araújo, do Instituto do
Cérebro, se diz preocupado com as possibilidades dessa tecnologia no futuro ser
usada para saber, sem permissão, o que as pessoas pensam ou
sonham.
Essa situação ainda está distante, de acordo com
Araújo. Os modelos feitos para dizer o que as pessoas enxergam acertam mais do
que os feitos para apontar o que as pessoas têm na mente. "Estímulos
visuais geram um padrão mais claro na atividade cerebral."
Hoje, são mais comuns inteligências artificiais
capazes de descrever em texto o que a pessoa vê ou pensa.
A precisão de acerto
para as tecnologias que dizem o que a pessoa enxerga fica por volta de 90%, e
para o que a pessoa imagina ou recorda, em 60%, de acordo com o professor do
Instituto do Cérebro.
Araújo, que estuda sonhos e efeitos de substâncias
psicoativas na mente humana, afirma que já trabalhou rotulando o que as pessoas
viviam durante o sono.
"Pedíamos para uma pessoa dormir dentro da
ressonância magnética, a acordávamos, perguntávamos com o que ela estava sonhando
e anotávamos".
O processo era repetido de 200 a 300 vezes para
gerar dados suficientes para alimentar uma inteligência artificial.
O recurso desenvolvido pelos pesquisadores do Japão
é mais complexo do que esses, pois reconstitui a imagem, com resolução
satisfatória, após associar os estímulos de visão a algum significado.
"Eles inverteram o processo tradicional de pesquisa, que começou há 15
anos", diz Araújo.
Apesar dessa reflexão, Araújo diz que o estudo é
importante ao ajudar a mapear quais partes do cérebro são estimuladas por cada
atividade mental.
"Ainda estamos na ciência de base quando se trata da
compreensão do sistema cognitivo".
Takahashi, também do Instituto do Cérebro, afirma
que a ciência atual não sabe sequer como funciona o cérebro humano. Por isso, é
difícil saber até se a inteligência artificial do estudo japonês entrega
respostas precisas. Os cientistas ainda trabalham com hipóteses nessa área.
"O ChatGPT, por exemplo, se parece com pessoas
ao gerar textos razoáveis.
Mas, como a tecnologia não tem neurônios, também é possível dizer, por essa
análise, que seu funcionamento tem nada a ver com o cérebro humano", diz
Takahashi.
O mesmo vale para a diferença entre o cérebro
humano e o de animais, de acordo com o pesquisador.
"Pode ser que o modelo
japonês funcione bem com humanos e animais e aponte semelhanças ou que não
forneça evidências sobre essa discussão."
PEDRO
S. TEIXEIRA – repórter, escreve em Mercado sobre
tecnologia.