Como a reforma tributária pode inviabilizar os planos de saúde corporativos


Como a reforma tributária pode inviabilizar os planos de saúde corporativos

Uma provisão na regulamentação da reforma tributária está causando calafrios nas empresas de saúde suplementar – e pode ser um golpe de misericórdia num setor já de joelhos, nos empregadores que oferecem planos de saúde a seus funcionários e nos cerca de 44 milhões de brasileiros cobertos por planos corporativos, que representam 85% dos 52 milhões no sistema
privado de saúde.

 

A norma impede que as empresas deduzam do cálculo do novo IVA os gastos com o plano de saúde corporativo dos funcionários.

 

Como a alíquota provável do IVA é de 27%, se a provisão for mantida, ela vai aumentar o custo dos planos de saúde para as empresas que oferecem este benefício a seus funcionários, na mesma proporção.

 

“Poucas vezes vi tamanho equívoco da área econômica do governo, e não é um equívoco econômico, é ideológico,” disse um empresário do setor. “Se isso for mantido, muitas empresas acabarão com os planos de saúde dos trabalhadores, que não terão condições de arcar sozinhos com plano de saúde e voltarão ao SUS.”

 

E se o funcionário quiser contratar fora, vai doer no bolso. Dadas as distorções históricas na regulação dos planos (leia-se, os reajustes sempre abaixo da inflação médica), o plano individual hoje é oferecido por poucas seguradoras – e é muito mais caro que o plano corporativo.

 

A lógica do Governo ao criar a vedação da dedução é de que a natureza dos planos é ser um benefício ao empregado – e não uma despesa qualquer da empresa, apesar de inúmeros outros benefícios continuarem dedutíveis da base de cálculo.

 

“Mas se for assim, o ticket-refeição, as cadeiras ergonômicas e a tela grande de computador também não escapam – e o governo não está indo atrás disso,” disse um advogado. 

Mesmo com o encarecimento dos planos, algumas empresas podem não ter outra opção que não seja continuar pagando o plano.

Acontece que, na maioria das vezes, a obrigação de pagamento do plano de saúde deriva da convenção coletiva de trabalho — que tem força de lei. “Ou seja, essas empresas não têm para onde correr, ou haverá uma guerra entre empregadores, sindicatos e justiça.”

 

Como quase tudo no Brasil, no entanto, a nova norma já nasce com um grande potencial de judicialização. 

A PEC da reforma tributária determina a dedução no cálculo do IVA de todas as
despesas que uma empresa tiver com outro contribuinte no ciclo do IVA – ou seja, no curso de
suas atividades; a única vedação é para bens de uso e consumo pessoal.

 

 

“No momento em que a regulamentação, que é infraconstitucional, tenta vedar essa dedução dos planos de saúde, ela já está em conflito com a própria Constituição,” disse um advogado tributarista. A vedação à dedução do IVA pode ser o golpe mais recente num setor que vem acumulando bilhões de reais em prejuízo operacional nos últimos anos.

 

 

Desde 2021, os planos de saúde já perderam R$ 20 bilhões – R$ 7 bilhões apenas nos nove primeiros meses do ano passado, segundo dados da Abramge, que representa as operadoras. 

Advogados que se mobilizam contra a vedação notam que o grande mérito da reforma
tributária é instituir uma não-cumulatividade plena nos impostos do Brasil. 

 (Hoje os tributos são ditos não-cumulativos, mas isso nem sempre é verdade, porque as empresas não conseguem se creditar de inúmeras despesas, como as financeiras, propaganda, investimento em P&D – tudo isso porque a jurisprudência apenas autoriza a dedução de despesas tidas por “indispensáveis”, criando uma diferenciação bizantina entre o que é “necessário” e o que é “indispensável”.

 

Com a vedação à dedução, o tributo sobre o plano de saúde deixa de ser não-cumulativo: a empresa pagou pelo plano, e não pode mais se ressarcir. “O governo conseguiu criar mais uma jabuticaba contra a economia, e dessa vez diretamente contra o brasileiro,” disse outro empresário do setor.

 

Mas para o pai da reforma, o secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, os críticos estão criando uma “tempestade em copo d’água.” “[Esse impedimento] não vai quebrar ninguém. … 

Tenho certeza absoluta de que todo mundo vai continuar tendo direito ao plano de saúde,” Appy disse num evento recente. Quando confrontado sobre o assunto, Appy argumentou ainda que vedar o creditamento seria positivo para evitar assimetrias com as empresas do Simples (que estarão, em geral, fora da sistemática não-cumulativa). 

Mas foi a própria reforma que manteve a assimetria geral para as empresas do Simples – logo, o que Appy aponta não é causa, mas consequência.

 

 

O impedimento de dedução do IVA pode até “não quebrar ninguém” – ainda que o estado de saúde das operadoras não recomende esta aposta – mas uma coisa é certa: o imposto de todas as empresas que oferecem planos já aumentou, e mais uma confusão pode estar a caminho.

 

 

Fonte: Brazil Journal

 

 

 

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