Nos últimos dias a possível reforma da Previdência Social
brasileira ganhou os holofotes da mídia e do Palácio do Planalto,
principalmente por conta da possibilidade da fixação de uma idade mínima para
concessão da aposentadoria. A equipe econômica do governo interino Michel Temer
insiste em dizer que se faz necessária uma mudança radical no sistema
previdenciário brasileiro para que ele seja superavitário.
Porém, no intuito de ajustar as contas do Governo Federal, a
atual equipe econômica, capitaneada pelo Ministro da Fazenda, Henrique
Meirelles, corre o risco de provocar uma grande injustiça aos trabalhadores que
estão preste a se aposentar, além das mulheres e dos trabalhadores rurais.
Obviamente a reforma da Previdência neste momento trata-se mais
de uma questão política, do que realmente uma questão social. Não é aceitável
se realizar uma reforma drástica no sistema previdenciário sem um estudo mais
aprofundado dos reais números e efeitos. Um dos principais pontos de confronto
encontra-se na estimativa do Tribunal de Contas da União (TCU) de que a
Previdência Social no Brasil deve encerrar o ano com déficit de R$ 124 bilhões,
números estes desmentidos pela Associação Nacional dos Auditores Ficais da
Receita Federal (Anfip).
Vale ressaltar a tese defendida pela nobre economista e
professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Denise Gentil, de
que é falso o discurso que diz que a previdência no Brasil é deficitária. Ela
aponta que a justificativa oficial do governo que temos um aumento da taxa de
mortalidade da população brasileira contra uma baixa taxa de natalidade. E
calcula também um suposto déficit de R$ 85 bilhões em 2015. E o ajuste fiscal, através
de uma reforma, diante desse cenário é a receita. Ela defende que o que está
errado não é o modelo atual da Previdência que, apesar política fiscal caótica
do governo, continua gerando superávit.
Denise Gentil demonstra ao lado da Anfip, que as receitas da
Previdência Social superam os gastos desde 2007. A economista aponta, por
exemplo, que esse superávit foi em 2013 de R$ 67,6 bilhões. Já em 2014, segundo
a professora esses números tiveram uma queda, apesar de ainda positivos, para
R$ 35,5 bilhões. E a estimativa da acadêmica é de que 2015, segundo dados
preliminares, seja de um superávit de R$ 20 bilhões.
Esses dados estão calcados no crescimento econômico registrado
nos últimos dez anos trouxe a redução da informalidade e o aumento do número de
empregos formais, o que alavancou a arrecadação previdenciária.
Atualmente, a Previdência Social não tem problemas. Na verdade,
ela pode ser tida como um grande ponto de soluções. Tanto é que quando o governo
quer injetar renda na economia, basta usar o sistema de proteção social.
O gasto com a seguridade social tornou-se impulsionador da
demanda agregada ao ativar diretamente o consumo das famílias. Por ser uma
renda que atende a uma população com elevada propensão a consumir, o valor
provisionado pelos esquemas de proteção social para pessoas doentes,
desempregadas, acidentadas do trabalho, idosos, aposentados e pessoas de baixa
renda, invariavelmente, será gasta de forma integral.
Essa renda é transformada em aquisição de medicamentos, alimentos, vestuário e
outros bens de primeira necessidade que dinamizam a economia. E reformar e
desestimular esse sistema de forma abrupta pode ser ainda mais perigoso para a
economia no futuro.
Além do gasto com seguridade social, há a necessidade de
ampliação da infraestrutura social, nas áreas de saúde e de assistência social.
O Estado intervém em construção de prédios, compra de equipamento e de insumos
de trabalho e, simultaneamente, na contratação direta de mão de obra para
operar nesses setores. Trata-se, portanto, do gasto social influenciando também
pelo lado da oferta, num mercado onde o principal agente produtor o Estado.
Tudo isso converge para a inclusão produtiva da população.
Assim, a política social pode se tornar um elemento importante para o aumento
da produtividade do trabalho, fator decisivo para a melhoria da renda do
trabalho e para o crescimento econômico.
Nesse processo de ativação da economia, passa também as discussões da reforma
previdenciária. E, nesse sentido, a idade e o valor das aposentadorias estão
longe de ser os únicos determinantes da carga previdenciária, como parece ser o
entendimento das propostas existentes para assegurar a sustentabilidade de
longo prazo do sistema.
Há alternativas que podem ser utilizadas para qualquer dado
nível de aposentadoria média. Quanto maior o crescimento da renda por pessoa,
quanto maior a taxa de emprego e de produtividade, mais leve será a carga das
aposentadorias.
Esta construção é fundamental para desmistificar o falso alarde
feito sobre o possível rombo que a desaposentação causaria. Ao contrário, ela
pode e deve ser a solução imediata para impulsionar a economia.
Esses serão pontos de discussão do programa JC Debate, que
participarei nesta segunda (6) na TV Cultura. Portanto, a reforma da
Previdência conforme vem sendo anunciada não atende às necessidades sociais e
econômicas brasileiras. Pelo contrário, poderá ser um grande golpe nos
trabalhadores e também na sustentabilidade dos sistemas de política social e
previdenciário do país.
Murilo
Aith - advogado de Direito Previdenciário e sócio
do escritório Aith, Badari e Luchin Sociedade de Advogados.