“Aqui
em São Lourenço é assim: quando acontecem fatos dentro da cidade, a gente sabe
por comentários das pessoas na rua, entendeu?”. A realidade vivida pelo
vendedor Denilson Nascimento Vale, 42, não é isolada na Grande São Paulo.
Morador
do bairro Barrinha, em São Lourenço da Serra, Vale (na foto acima) é um dos 400
mil moradores de municípios vizinhos a São Paulo que vivem em regiões sem
veículos de informação, como jornais e portais online.
Os
dados foram levantados pelo Atlas da Notícia,
estudo do Observatório da Imprensa, que mapeou os jornais impressos e online em
todo o Brasil e detectou mais de 4 mil municípios sem um veículo informativo,
no que classificam de “Deserto de Notícia”.
No
entanto, esta realidade não está concentrada apenas pelo interior do país. Ao
lado da capital paulista, cinco cidades não contam com um meio de informação,
segundo o estudo, num total de 382 mil moradores. Estão nesse universo Embu das
Artes, Juquitiba, Pirapora do Bom Jesus, São Lourenço da Serra e Vargem Grande
Paulista.
“A
prefeitura está mudando de lugar. Como é que a gente fica sabendo? Por
comentários, pela boca das pessoas”, completa o vendedor.
Ele
cita que a imprensa poderia ampliar a cobrança por serviços públicos. “De onde
eu trabalho por exemplo tem um esgoto muito feio. Tendo um jornal da cidade,
isso indo para a imprensa, tem como eles irem atrás e fazer [algo para
melhorar], porque não vão querer que isso fique no jornal”.
Sem
veículos, o jeito é descobrir as informações pelas conversas no dia-a-dia. “Eu
trabalho sempre na rua, então fico sabendo assim. Na rua, pelo Whatsapp, quando
algum colega manda, e pelo Face”, completa Vale.
A
cidade de Cajamar tem um veículo online. Outras seis cidades vizinhas da
capital contam com apenas um jornal impresso e outro na internet: Biritiba
Mirim, Embu-Guaçu, Itapecerica da Serra, Rio Grande da Serra e Salesópolis.
RANKING DA IMPRENSA NA GRANDE SÃO PAULO
| | Veículos por 100 mil habitantes |
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SEM
JORNAL E SEM PREFEITO
Em
Pirapora do Bom Jesus, o educador João Mário Machado, 32, conta que por vezes
circulam jornais pela cidade, um favorável ao governo municipal e outro à
oposição. Atualmente, Pirapora não figura com nenhum veículo no levantamento do
Observatório da Imprensa.
Em
meio aos boatos, o município terá uma nova eleição, após oprefeito eleito ter sido considerado inelegível em decisão da Justiça Eleitoraldepois da votação. Ele atribui a situação também a falta de notícias
isentas sobre a região. “É muito difícil buscar informação, porque se publicam
muitas coisas que a gente não sabe de onde tiraram, tanto de um jornal quanto
de outro”, conta.
No
caso de Itapecerica da Serra há um veículo mapeado. “Praticamente não existem.
Não trazem informações principalmente nas partes mais pobres da cidade”,
comenta o designer Icaro Codadtch, 27, morador de Itapecerica. “Os
únicos veículos de comunicação que conheço são ligados a políticos”.
PARCIALIDADE
A
situação apontada por Icaro também está presente em várias cidades, onde os
veículos existentes sobrevivem apenas com o financiamento do poder público, o
que leva a uma abordagem favorável às prefeituras.
Em
Embu Guaçu, com 63 mil moradores, apenas um jornal circula com notícias locais.
Nas últimas semanas, por exemplo, uma busca e apreensão na prefeitura não foi
noticiada. “A imprensa na cidade é amadora, quando eu quero saber de alguma
informação, vou pesquisar no Facebook, ou em outros lugares”, comenta a
advogada Keize Bianca, 23.
“Às
vezes, uma ou outra informação eu encontro na internet, mas é muito difícil
achar. No site da prefeitura, que deveria ter informações, não tem”, avalia o
funcionário público Gregory Gonçalves, 28.
No
Alto Tietê, Itaquaquecetuba tem menos de um veículo para cada 100 mil moradores. “Os
jornais locais soam mais como panfletos para certos candidatos e grupos
políticos, que os controlam. Há também um jornal ligado à Igreja Evangélica,
que traz consigo a sua própria visão religiosa de mundo e de cidade. No geral,
prefiro buscar informações de Itaquaquecetuba na imprensa regional, como em
portais e jornais sediados em Mogi, Suzano ou Poá”, relata o correspondente da
Agência Mural, Lucas Landin.
PERIODICIDADE
A
maior cidade que consta sem veículos de informação é Embu das Artes, onde há
267 mil habitantes. Apesar disso, moradores citam portais que noticiam o
município, em especial os que tratam da região.
Entre
eles está o “Retrato” e “Primeiro Notícias”, que têm registro na cidade, mas
também cobrem outros municípios do Consórcio Intermunicipal da Região Sudoeste
da Grande São Paulo (CONISUD), composto pelos municípios: Embu das Artes,
Taboão da Serra, Itapecerica da Serra, Embu-Guaçu, São Lourenço da Serra,
Juquitiba, Cotia e Vargem Grande Paulista.
“Recebo
em minha residência o jornal ‘Retrato’, mas também acompanho outras notícias
que vejo nas redes sociais do portal ‘O Taboanense’, que informa Embu e
adjacências”, comenta a moradora Cris Brito, 34.
No
entanto, a cidade conta com jornais que circulam durante um tempo, fazem algumas
coberturas de alguns temas, mas não mantém uma periodicidade.
O
Atlas da Notícias aponta que as dificuldades em ter veículos de informação, sem
a cobertura da prefeitura e da Câmara Municipal, “compromete a capacidade
decisória dos cidadãos”.
Paulo
Talarico, Karol Coelho, Gessica Carvalho, Rubens Rodrigues e Silvia Martins - correspondentes de Osasco, São Lourenço da Serra,
Itapecerica da Serra, Embu Guaçu e Embu das Artes
Fonte:
jornal FSP